Jailton de Carvalho, Demétrio Weber e Roberto Maltchik, em O Globo A Câmara dos Deputados apoia a união estável entre homossexuais, mas está dividida em relação ao direito desses casais de adotar crianças.

Levantamento feito pelo GLOBO na última semana mostra ainda que associar a palavra “casamento” à união entre gays é um tabu, mas os deputados reconhecem que a homofobia deve ser considerada um crime.

Entre segunda e sexta-feira, o GLOBO ouviu 320 dos 513 deputados.

Desses, 228 cravaram voto a favor da união estável, 86 foram contra, 30 não se manifestaram.

Os votos foram registrados em cédula, por telefone e e-mail.

Integrantes de todos os partidos foram consultados.

A ampla maioria que aprova a união estável, direito reconhecido em última instância pelo Supremo Tribunal Federal há uma semana, não se repetiu quando o assunto é adoção.

Indagados se casais gays devem ter direito a adotar crianças, 145 disseram “não”.

Outros 154 apoiam a ideia.

Hoje, os homossexuais conseguem na Justiça autorização para adotar crianças, mas o nome de apenas um dos parceiros pode aparecer na certidão da criança.

Boa parte dos entrevistados referendou a proposta de criminalizar a homofobia.

Projeto sobre o tema já foi aprovado na Câmara dos Deputados e agora depende de votação no Senado.

O texto sofreu alterações e, se aprovado, retornará para novo aval dos deputados.

Na enquete feita pelo GLOBO, 217 são a favor de tornar crime as manifestações de preconceito contra homossexuais.

Surpresa com o resultado Para 175 dos entrevistados, não deve ser permitido o casamento entre homossexuais.

Já 115 não veem problema nisso.

Na legislação atual, casamento e união estável geram os mesmos benefícios, mas os religiosos insistem em que o primeiro é apenas para celebrar a união entre um homem e uma mulher.

O resultado da enquete surpreendeu até parlamentares que acompanham a questão desde o aparecimento do primeiro projeto sobre o assunto na Câmara, há quase duas décadas.

O deputado João Campos (PSDB-GO), um dos líderes da bancada evangélica, rechaçou a tendência indicada no levantamento. - O resultado da pesquisa não retrata o Congresso, retrata apenas um momento.

Se não tivéssemos a decisão do Supremo, certamente o resultado seria outro - disse Campos.

A senadora Marta Suplicy (PT-SP), autora do primeiro projeto sobre união civil entre pessoas do mesmo sexo, quando era deputada, considerou alvissareiro o resultado da votação.

Segundo ela, a pesquisa confirma com números a percepção de que, de fato, os parlamentares estariam mais abertos para tratar da temática gay.

Ela sustenta que, mesmo assim, o Congresso Nacional estaria atrás do Executivo e até mesmo do Judiciário, que tem emitido sentenças favoráveis aos homossexuais há alguns anos. - Você não têm ideia de como essa pesquisa é importante.

Ela mostra com números o que eu já vinha dizendo de forma intuitiva - disse a senadora petista.

Para ela, o resultado do levantamento pode ajudar deputados a perder o medo de se manifestar a favor de antigas reivindicações do movimento LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgêneros).

Só assim seria possível aprovar projetos como a criminalização da homofobia, em tramitação no Senado.

Na quinta-feira, o projeto teve que ser retirado da pauta por pressão de religiosos e do deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ), o novo líder do movimento antigay.

O deputado Jean Wyllys (PSOL-RJ), que se elegeu com a bandeira LGBT, também comemorou o resultado da pesquisa. - Surpreendeu-me positivamente, considerando a omissão do Congresso em relação ao tema.

De 1995 para cá, o Congresso não legislou em relação à população LGBT - disse Wyllys.

Em sua estreia como parlamentar, ele quer incluir na Constituição o direito à união estável entre pessoas do mesmo sexo.

Hoje, o texto constitucional só fala em união entre homem e mulher.

Mas Jean Wyllys não conseguiu o número mínimo de assinaturas (171, um terço do total) para apresentar proposta de emenda constitucional.

O líder do governo na Câmara, Cândido Vaccarezza (PT-SP), não vê contradição no voto de parlamentares que se manifestaram contra o casamento e a favor da união civil.

Para ele, a decisão sobre casamento é exclusiva da religião. - A união estável resolve o problema civil.

O termo “casamento”, para a parte civil, acaba sendo redundante - sintetiza o deputado.

Boa parte dos parlamentares que votou pela tipificação da homofobia como crime fez ressalvas à ideia.

Alguns consideram importante que o combate à discriminação de natureza sexual não resulte em restrições à liberdade de expressão e nem crie amarras ao convívio social.

Entre os parlamentares atentos às nuances da questão estava Alfredo Sirkis (PV-RJ).

Ele só concordou em votar - a favor da criminalização -, depois de fazer algumas ponderações. - O discurso preconceituoso, piadas de mau gosto ou manifestações genéricas de cunho religioso não devem ser criminalizados - disse Sirkis.

Deputado teme futuro só de gays Os deputados se mostraram divididos sobre a adoção.

Até parlamentares que defendem o casamento gay são mais cautelosos para se declarar contra ou a favor da adoção de crianças por casais homossexuais.

O deputado Edinho Bez (PMDB-SC) sugeriu que a criação de filhos por pais gays poderia criar no futuro uma geração só de homossexuais. - Os filhos vão achar que é natural e vão repetir o comportamento dos pais - disse. - A orientação sexual dos pais não afeta nem determina a orientação dos filhos.

Sou filho de heterossexuais e sou homossexual.

Meus irmãos são heterossexuais - rebateu Wyllys.

Entre terça e sexta-feira, parlamentares de PT, PMDB, PSDB, DEM, PDT, PC do B e PTB, entre outros 15 partidos, foram apresentados a uma cédula com quatro questões em que poderiam se manifestar contra ou a favor do casamento e da união estável entre homossexuais.

Poderiam aprovar ou rejeitar a adoção de filhos por casais formados por pessoas do mesmo sexo e também a criminalização da homofobia.

Os deputados, se quisessem, podiam registrar voto sem se identificar.