Artigo do engenheiro FELÍCIO LIMEIRA DE FRANÇA, no site Ilumina A perturbação no sistema elétrico nacional ocorrida no dia 4 de fevereiro deste ano, originada na subestação de Luiz Gonzaga de propriedade da Chesf, e que redundou no desligamento total de 7 dos estados nordestinos, provocou, como sempre acontece, no calor do acontecimentos, uma enxurrada de declarações, cobranças de explicações e a tradicional catilinária dos especialistas de ocasião.

Passado o frenesi inicial, a coisa entrou em banho-maria, e agora, com a aproximação da emissão do relatório do Operador Nacional do Sistema – ONS sobre aquela ocorrência, reportagens baseadas em informações off-the-records iniciaram uma verdadeira caçada aos culpados.

A CHESF, por ser a proprietária das instalações onde a perturbação teve início encabeçou a lista dos suspeitos.

Uma guinada dos rumores em direção ao ONS ensejou a que o seu Diretor Geral, o Sr.

Hermes Chipp viesse a fazer, entre outras, a seguinte declaração registrada pela Agência Estado: “Erro do operador?

De jeito nenhum.

O Operador é uma organização que não é dona de ativos.

Isso é responsabilidade do agente.

Se o agente me libera um equipamento para fechar, eu tenho que fechar o mais rápido possível.

Não tenho restrição” Para um razoável entendedor, com um razoável conhecimento da ocorrência em questão, a “mensagem” é bastante clara: a CHESF (o agente) é a culpada pela ocorrência por ter liberado um equipamento sem condições de ser reernegizado.

A palavra do Sr.

Hermes Chipp, pela sua responsabilidade e sua competência, tem um peso inegável, mas a forma simplificada com que ele resumiu a questão não bate com as informações contidas no relatório que o próprio ONS emitiu sobre a ocorrência (ONS RE 3/0032/2011).

Resumindo, sem simplificar, pode-se dizer com toda certeza que: a causa do colapso do fornecimento de energia elétrica a sete estados nordestinos, no dia 4 de fevereiro, foi a tentativa de religamento de uma das linhas de 500 Kv entre Sobradinho e a SE Luiz Gonzaga sem que essa SE tivesse sido restaurada à sua condição de maior confiabilidade, qual seja; com suas duas barras de 500 Kv em operação.

E mais, essa manobra foi feita com pleno entendimento entre CHESF e ONS, ao nível de seus centros de operação e com a explícita autorização do centro do ONS.

A ênfase na questão da disponibilização de um equipamento (LT de 500 kV) sem condições de reernegização, pela CHESF, esconde o fato de que esse “erro” não teria nenhuma conseqüência se a manobra de religamento da linha tivesse sido feita com a SE de Luiz Gonzaga com as suas duas barras de 500 kV em operação. É estranho que uma providencia tão evidente e crucial, a restauração prioritária do arranjo de barras antes de quaisquer manobras de restauração, não seja objeto de norma bem definida, e fique ao sabor de decisões tomadas no epicentro da ocorrência.

Por outro lado, o “erro” na disponibilização indevida da LT de 500 kV, precisa ser posto na devida perspectiva das circunstâncias que prevaleciam logo após o primeiro desligamento automático da LT em questão.

O ONS e a CHESF tinham em mãos então: uma das LTs de 550 kV, entre Itaparica e Sobradinho desligada pela atuação da proteção de falha de disjuntor no terminal daquela LT na SE Luiz Gonzaga e a barra de 500 kV dessa subestação, adjacente ao disjuntor “defeituoso”, isolada pela atuação da mesma proteção.

A LT estava desligada nas duas extremidades e o disjuntor suspeito de mau funcionamento havia sido isolado.

Numa primeira decisão acertada testou-se a reenergização da LT, em vazio, a partir de Sobradinho.

A linha passou no teste.

Dos equipamentos sob suspeição, o disjuntor estava isolado e a LT não apresentava defeito.

Havia toda racionalidade em tentar colocar a LT em carga, fechando o seu terminal na SE de Luiz Gonzaga.

Se esse tipo de abordagem for inibido daqui para frente, a cada ocorrência mais séria, será convocado um batalhão de especialistas para em tempo real assessorar o restabelecimento do sistema.

O que não podia nem devia ser feito era realizar essa manobra sem restaurar a segunda barra da SE Luiz Gonzaga.

Restaurada a segunda barra, a reenergização da linha teria provocado o seu segundo desligamento por conta do defeito oculto (cartela defeituosa) na cadeia de proteção de linha, mas o sistema permaneceria funcionando em condições satisfatórias sem entrar em colapso.

O fato de que o defeito oculto em uma das cartelas da cadeia de proteção de linha, só tenha sido detectado horas depois das manobras realizadas, e tenha sido reconhecido como a causa que deu início ao desligamento, não invalida as observações acima.

Esse tipo de acontecimento deve ser usado, não para uma caça às bruxas, mas para aprimorar os procedimentos de operação da rede elétrica.

Como a ocorrência causou prejuízos a terceiros é justo que se definam responsabilidades, mas isso deve ser feito com o equilíbrio e respeito mútuo.