Por Luciano Siqueira, especial para o Blog de Jamildo Reza a lenda que coube ao poeta e editor Augusto Frederico Schmidt a descoberta do gênio literário Graciliano Ramos a partir da leitura de um relatório de gestão do então prefeito de Palmeira dos Índios, Alagoas. “Este deve ter algo escrito na gaveta”, teria comentado.
E tinha – contos, o romance “Caetés” e outros que se seguiram e marcaram nossa literatura regionalista: “São Bernardo”, “Angústia”, “Vidas Secas”, “Infância”…
Lembrei-me de Graciliano na última segunda-feira, num simples ato de posse do novo secretário de Planejamento da cidade do Paulista, Jorge Carreiro.
Nessas ocasiões, os discursos são quase protocolares e não vão além de obviedades.
Mas o novo secretário foi muito além.
Brindou-nos com citação certeira de José Saramago (“somos a responsabilidade que assumimos… sem responsabilidade talvez nem merecêssemos existir”) e abordou uma questão crucial nos dias que correm: a reforma urbana.
Aí Jorge Carreiro exercita a boa relação entre o particular e o geral, entre o imediato e o longo prazo, sobre a base de uma compreensão acurada da “explosão urbana” ocorrida em nosso país, levando a que em apenas cinco décadas se invertessem os percentuais da população urbana e rural.
Com efeito, se no final dos anos vinte do século passado 80% dos brasileiros residiam no campo e em torno de 20% nas cidades, já nos anos setenta essa equação se mostrava inteiramente oposta.
A “explosão urbana” foi impulsionada, dentre outros fatores, principalmente pela industrialização que tomou corpo sobretudo de 1930 em diante (o lócus da indústria é a cidade) e pela ausência de uma reforma agrária distributiva.
Paulista e a Região Metropolitana do Recife se situam nesse fenômeno.
Ora, o ambiente urbano não foi preparado para isso, daí o volume espantoso de demandas sociais e físicas que se verifica nas cidades.
Problemas estruturais assolam cidades contíguas e circunvizinhas.
Reclamam soluções estruturais.
No dizer do engenheiro Jorge Carreiro, põem na ordem do dia a Reforma Urbana. É um processo lento e cumulativo, o da Reforma Urbana.
Vem desde antes do golpe militar de 1964, numa trajetória de idas e vindas, avanços e recuos, de modo que hoje acumula uma base conceitual e um ideário correspondente às demandas da realidade e conta com um instrumento jurídico-formal que a viabiliza – o Estatuto das Cidades (Lei Federal Nº 257, de 10 de julho de 2001) – posto nas mãos dos gestores públicos municipais para disciplinar o uso e a ocupação do território e promover o que Jorge Carreiro chama de “crescimento sustentável das cidades” que inclua “a agenda de mitigar e tratar urgentemente de encontrar soluções para os graves problemas decorrentes da ocupação do território.” À semelhança da “descoberta” de Graciliano, bem que podemos dizer: “Esse engenheiro tem algo na gaveta” – e tem: uma aguda compreensão de que através da Reforma Urbana poderemos construir cidades mais humanas.