Carlos Império Hamburguer, em artigo no site Rema Em 2011, o Parque Indígena do Xingu está fazendo 50 anos.
Algo profundo mudou na minha percepção de mundo enquanto conhecia o parque e sua história durante a produção do filme “Xingu”.
Sem dúvida, é um dos maiores patrimônios do Brasil - e nós, brasileiros, não temos a menor ideia do que ele representa e do que está protegido ali.
Criado em 1961, é a primeira reserva de grandes proporções no Brasil.
Abriga povos de cultura riquíssima e filosofia milenar, que vivem em equilíbrio, preservando seu modo de vida, sua dignidade, sua cultura e vasta sabedoria, assimilando só o que vale a pena do “mundo de fora”, sempre em sintonia com a natureza exuberante.
Um verdadeiro santuário social, ambiental e histórico no coração do Brasil.
Mas não estamos falando só de preservação do passado e da natureza.
O que está sendo protegido ali é o futuro.
Não o futuro visto com os óculos velhos, sujos e antiquados que enxergam o progresso da mesma maneira como enxergavam nossos bisavós na Revolução Industrial, mas o futuro do século 21.
Esse talvez seja o maior patrimônio do Brasil hoje.
Mais valioso que todo o petróleo, soja, carne, ferro que tiramos do nosso solo, ou todo automóvel, motocicleta, geladeira que fabricamos.
O que está protegido ali é um novo paradigma de como o ser humano pode e deve viver.
Não estou dizendo que precisamos morar em ocas, dormir em redes, tomar banho no rio e andar nus.
Falo de algo mais profundo.
Algo novo para nós, ditos civilizados, que nascemos e fomos criados como os donos do planeta.
Arrogantes e prepotentes, nos transformamos no maior agente destruidor do nosso próprio habitat.
Um exército furioso de destruição.
Um vírus que se multiplica e ataca, transformando e destruindo tudo o que encontra em seu caminho na presunção de que estamos construindo um mundo melhor, mais seguro, mais confortável, mais rentável.
No Xingu, progresso tem outro significado.
No Xingu, homens e mulheres não vivem como donos do mundo, não foram criados com essa arrogância.
Vivem como parte da cadeia de vida do planeta, e essa cadeia é interligada e interdependente.
O “progresso” e o bem-estar dos homens estão ligados ao equilíbrio dessa cadeia.
Para os índios, homem e natureza evoluem juntos.
Golpe baixo Mas a megausina de Belo Monte quer represar o rio Xingu.
O rio que é a alma e a base da vida das comunidades indígenas da região.
Um golpe baixo, em nome do progresso.
Progresso com os velhos parâmetros dos séculos 19 e 20, que tem levado o mundo ao colapso social e ambiental. É isso que queremos?
Se nossos dirigentes e a sociedade como um todo se interessassem em entender a filosofia, a cultura e a inteligência dos povos indígenas, abortariam qualquer projeto que os ameaçasse.
E poderíamos inaugurar novo paradigma de progresso.
O progresso do equilíbrio.
Seríamos a vanguarda mundial do século 21.
Essa é a demanda.
Essa é nossa chance.
Sejamos corajosos, ousados, visionários.
Como foram os que lutaram pela criação do Parque do Xingu há 50 anos.
PS: Carlos Império Hamburguer, 48, é diretor de cinema e televisão.
Atualmente finaliza o filme “Xingu”, sobre a criação do Parque Indígena do Xingu.