No Jornal do Commercio Na primeira semana de trabalho a presidente Dilma Rousseff renovou o propósito de cumprir sua principal promessa de campanha: a erradicação da pobreza extrema.
Para isso, pretende criar portas de saída para o Bolsa Família, gerando oportunidades de trabalho, ampliando a rede de serviços públicos e aprofundando a transferência de renda.
Já chamado de “PAC contra a pobreza”, o projeto tenta corrigir um dos pontos mais criticados do Bolsa Família: não abrir oportunidades de trabalho para os beneficiados, de modo a gradativamente retirá-los do programa.
Há 10 anos, o Banco Mundial tornou pública uma pesquisa com mais de 60 mil homens e mulheres que viviam na pobreza em 60 países.
Essa pesquisa virou um documento largamente difundido e analisado pelos estudiosos do assunto em todo mundo, com o nome de Relatório sobre o Desenvolvimento Mundial 2000/2001: O ataque à pobreza.
Seu objetivo era ampliar a compreensão da pobreza e das suas causas e estabelecer as medidas para criar um mundo livre da miséria.
Esse trabalho expôs em profundidade o problema que recebe em nosso País – tomando por base a determinação da presidenta –, um tratamento mais cuidadoso, um passo à frente do que o governo Lula apresentava como a maior política de redistribuição de renda em todo o mundo.
O avanço baseia-se em que a pobreza não pode ser aferida apenas pela baixa renda e baixo consumo.
Ela tem que ser vista, em nosso caso, na perspectiva da Constituição de 1988, quando trata de questões como o salário mínimo: “Art. 7º – São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: IV – salário mínimo, fixado em lei, nacionalmente unificado, capaz de atender a suas necessidades vitais básicas e às de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo, sendo vedada sua vinculação para qualquer fim, (…)” O problema passa a ser: tem o Estado brasileiro condições de assegurar a todos esse atendimento vital?
A resposta está evidenciada na discussão que se faz hoje em torno de um salário mínimo possível, um quarto do estimado para atender àquelas necessidades previstas na Constituição.
E quando se vai para a ponta do lápis se constata que não há nenhuma possibilidade de ir além dos valores preconizados hoje, abaixo de R$ 600.
Esse é o maior atropelo de qualquer governante, como deverá ser para a presidente Dilma Rousseff, porque o combate à pobreza implica numa ordem de fatores que vão além da renda.
O conceito de pobreza, assim, pode ser reproduzido como a ausência do mínimo necessário para atender as necessidades de moradia, alimentação, educação, etc.
A questão assume, então, uma moldura bem mais complexa, como já demonstrava o relatório do Banco Mundial, baseado em que a pobreza não é apenas renda baixa e baixo consumo, mas também falta de educação, de nutrição, de saúde e, até – com base nos depoimentos das pessoas – o sentimento de falta de poder, a incapacidade de se expressar, a vulnerabilidade - por exemplo, a doenças, choques econômicos, más colheitas, desemprego, desastres naturais, violência – e o medo.
Nora Lustig, diretora de pesquisas do Relatório do Banco Mundial, dava um exemplo de como essas prioridades poderiam permitir que os pobres tivessem maior independência e segurança na vida diária: “O fortalecimento das mulheres e de outras pessoas em situação de desvantagem social amplia o escopo das suas oportunidades econômicas.
Além disso, o fortalecimento das organizações dos pobres e a sua participação nos processos de tomada de decisão permitem que eles pressionem no sentido de melhores serviços e de alternativas de políticas que atendam as suas necessidades”.
Como se vê, um tema complexo que deverá exigir da nossa presidente uma abordagem que vai muito além da conta de somar orçamentária.