Por Gustavo Krause A manchete dos jornais, intitulada “Mural do Planalto”, edição de 14 de janeiro do corrente ano, me chamou atenção.
No átimo que separou a leitura da manchete e a correspondente matéria, muita coisa me passou pela cabeça para saciar a curiosidade sobre o que seria o Mural.
Beleza, pensei.
A partir de agora, Palácio do Planalto vai oferecer ao povo brasileiro exemplares da arte pictórica que, na sua origem remota, retratou a expressão social de antigas civilizações, ou, imaginei, um surto de afrescos, a exemplo das maravilhas renascentistas, tendo como autores artistas engajados na nobre causa dos governos petistas.
Fui tomado, também, por outra cogitação perfeitamente justificável: o renascimento do muralismo revolucionário, calcado na experiência mexicana onde pontificaram Diego Rivera, Davi Siqueiros e Clemente Orozco.
Foram eles porta-vozes da arte pública, coletiva, prenhe da realidade campesina e proletária dos mexicanos, como contraponto à arte burguesa e individualista do “cavalete”.
O muralismo foi incorporado às políticas públicas dos governos revolucionários em cuja origem estava a heróica liderança de Emiliano Zapata e Pancho Villa (que deu na hegemonia do partido único, o PRI).
Ainda bem que a arte patrocinada pelo ministro da educação (José Vasconcelos, homônimo do nosso grande humorista) e exposta nas paredes do ministério não passou despercebida pela lucidez crítica de Octavio Paz: “Essas obras que se dizem revolucionárias e que, nos casos de Rivera e Siqueiros, expressam simples marxismo maniqueísta, eram encomendas patrocinadas e pagas por um governo que jamais foi marxista e havia deixado de ser revolucionário”.
Pois bem, minha cogitação não era despropositada, afinal, o PT sempre pregou o socialismo e a revolução; tem nos seus quadros revolucionários e guerrilheiros e, ainda que amansados pelos encantos da burguesia, não surpreenderia se destinasse um espaço nobre para a arte que fala das massas e para as massas.
Já sei, conversei com os meus botões, trata-se de mais uma inovação midiática, quem sabe, uma adaptação dos dazibaos ou daozibaos, jornal mural chinês que tanto serviu à nefasta revolução cultural maoísta como poderia se prestar aos suspiros da liberdade de expressão para a esperança democrática do povo chinês.
Imediatamente, abandonei a hipótese.
Os daozibaos não teriam a menor importância.
Aqui cabe o “nunca antes”.
De fato, os números revelam marcas e meios insuperáveis no uso intensivo da mídia: o governo Lula utilizou, em 2003, 499 veículos de comunicação e 8.094 em 2010; no mesmo período, de uma cobertura de 182 cidades, passou para 2733; com publicidade foram gastos 9,3 bilhões de reais (1,2 bilhões mês) e, considerando patrocínio, produção etc…, estes valores quase duplicam (2,3 bilhões mensais nos últimos oito anos, adicionados no ano eleitoral 1047 veículos de comunicação – desde os convencionais a portais de internet, blogs, comerciais em cinema, carros de som, outdoor, painéis).
Neste ponto parei com elucubrações e fui ao texto da notícia.
O Mural do Planalto foi uma idéia de jerico.
A Coordenação de Relações Públicas da Presidência montou o Mural para apresentar o primeiro escalão aos servidores com perfis biográficos.
Inútil.
Nenhum governo funciona com trinta e sete ministérios; nenhum cidadão, por mais informado que seja, vai guardar na retina ou na memória tantos ministros ilustres.
A sociedade está se lixando para as autoridades de plantão.
O apelo é que para que trabalhem e não transformem em questão de conhecimentos gerais do próximo ENEM os nomes e respectivos cargos de Suas Excelências.
E mais: as modernas tecnologias da fotografia não vão alisar rugas; as famosas tintas capilares não esconderão, sob o horroroso acaju, a prata das ralas cabeleiras; nenhum registro biográfico que poupou os petistas e constrangeu aliados vai apagar a folha corrida, o prontuário judiciário e, muito menos, o débito político daqueles que, trelosos, obtiveram, na melhor hipótese, o beneplácito de generosas sentenças absolutórias ou, a proteção imoral do manto da impunidade.
A cândida resposta dos autores da babaquice: foi um equívoco.
Que mico!
Ao mesmo tempo do equívoco do mural, a Presidente, na primeira reunião ministerial, acertava em cheio ao tratar da moral, exigindo o que é simples dever dos homens públicos: comportamentos éticos e austeridade nos gastos que é a primeira obrigação do gestor público.
Desta forma, ratifica o que tudo mundo sabe: as duas heranças malditas do governo em que ela foi a gerentona, a candidata escolhida e a Presidente eleita.
Como na saudosa escolhinha do prof.
Raimundo, a turma que vai governar recebeu um manual de conduta.
A que ponto chegamos.
Tá tudo na lei, nos instrumentos de controle e nas consciências capazes de sentir vergonha.
O difícil é conter o apetite voraz de quem vai manejar a grana do governo, das estatais, das transações bilionárias. É muita gente.
Um imenso cardume esfomeado 22 mil funcionários comissionados prontos para dizer: caixinha, obrigado!