Hoje, acordei e quando saí à rua (Hospício, Boa Vista, centro do Recife), quase urrei de felicidade.

Sim, eu moro no centro do Recife.

Sim, muitas pessoas residem aqui!

Polícia, fiscais da Prefeitura, imprensa e uma movimentação atípica sinalizavam: estava começando o reordenamento do comércio ambulante nesta via, a exemplo do que já ocorrera na rua vizinha, a Sete de Setembro.

Agora, do meu apartamento, ouço um apitaço, provavelmente dos ambulantes, em protesto à ação do poder público.

Confesso que quando me deparei com a imprensa, pela manhã, tive o impulso de pedir que me entrevistassem, para dar minha opinião sobre o assunto.

Mas temi por represálias.

Ao meio-dia, assisti num telejornal local a uma reportagem sobre o caso.

E, mais uma vez, nenhum morador foi ouvido.

Todos os depoimentos eram de cidadãos – que provavelmente aqui não residem, mas apenas passam pelo centro – e ambulantes.

E todos questionavam a atitude da prefeitura e eram favoráveis aos ambulantes, sob a alegação de que eles não têm onde trabalhar e de que a atitude da prefeitura era autoritária, despótica e truculenta.

Claro que me sinto um pouco culpado em dizer isso, mas aplaudo e apoio a ação da prefeitura.

Culpado, porque reconheço a necessidade de construção de uma política pública para oferecer oportunidades de trabalho e renda para os ambulantes.

Porque reconheço que o Brasil é um País injusto e nem todos têm acesso à educação formal, sendo, portanto, jogados na informalidade.

Mas e nós, moradores, que não temos acesso às nossas calçadas – obrigados que somos a nos arriscar, andando junto aos veículos – porque os passeios estão ocupados pelos ambulantes?

E nós, moradores, que somos obrigados a conviver com a sujeira diária – montanhas de lixo ao final do expediente comercial – e com tudo que daí advém – ratos, baratas, mau cheiro, mendigos revolvendo os dejetos?

E nós, moradores, que temos o acesso aos nossos imóveis obstruído pela presença dos ambulantes – impedindo o acesso de veículos, o transporte de qualquer material?

E nós, moradores, que assistimos à depredação diária do patrimônio público – calçamentos, orelhões, depósitos de lixo, fiação elétrica – promovida pelos ambulantes em detrimento de nossa presença?

Há seis anos resido no centro e confesso que sinto um desejo profundo de sair daqui, apesar da viabilidade de estar nessa região da cidade, por conta dos serviços e do transporte.

Sem pudor, afirmo, os ambulantes tratam o centro como uma “terra de ninguém”.

Ao invés de ser tratada como uma área de “nós todos”, especialmente porque daqui eles tiram o sustento, é com descaso, desprezo, desordem que eles tratam o centro.

Os que trabalham com alimentos, jogam todos os dejetos no chão ao final do expediente – óleo de cozinha, frutas, etc; os que trabalham com outros produtos, jogam plásticos, papeis, papelões e tudo o mais também no chão.

A associação dos ambulantes sempre se manifesta quando uma ação dessa natureza acontece, mas não desenvolve nenhuma política de conscientização da categoria, de ordenamento, de acondicionamento do lixo, NADA.

E ao final do dia, os ambulantes voltam para as suas casas – e certamente ficarão muito infelizes se lá chegarem e descobrirem que alguém depositou lixo em frente às suas residências – e nós, moradores do centro, que lidemos com o que eles deixaram para trás.

Gostaria muito que a imprensa tivesse feito um registro fotográfico das montanhas de lixo às quais me referi por volta das 18h ontem e fizesse o mesmo hoje.

Porque o lixo já diminuiu, nessas poucas horas e essa seria a prova cabal de que os dejetos e a depredação do centro são sim “culpa” dos ambulantes.

Não, exclusivamente, claro, porque os moradores do Recife também têm pouco apreço pelo centro, assim como o próprio comércio formal da área tem seu quinhão nesse mar de “culpas”.

Mas, certamente, quando a população encontrar uma Rua do Hospício mais limpa vai se sentir constrangida em jogar os dejetos na via E assim, quem sabe, não se inicia uma “corrente do bem” em favor desse centro, dessa cidade que é NOSSA!

Por algum lugar há de se começar essa NOVA ATITUDE para com o Recife.

Por essa razão, aplaudo a ação da prefeitura e espero que ambulantes, moradores da área e cidadãos do Recife sejam todos beneficiados com esse novo centro.

Atenciosamente RD (Jornalista)