Raquel Landim, do Estadão O presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Robson Braga de Andrade, disse que a defesa comercial do Brasil é “fraca”.

Para o dirigente da principal organização empresarial do País, os instrumentos para coibir a entrada de importação ilegal ou desleal são “lentos e demorados”. “Temos poucas pessoas nessa área e a coordenação é pulverizada.” Ex-presidente da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg), Andrade assumiu o cargo na CNI no fim de outubro em meio às reclamações do empresariado contra a “invasão” de produtos importados.

Ele nega que exista uma desindustrialização no Brasil provocada pelo câmbio, mas diz que alguns setores correm o risco de desaparecer.

A seguir trechos da entrevista ao Estado.

A CNI fez um extenso documento com suas sugestões para o próximo governo.

O senhor poderia apontar três prioridades?

Desonerar a exportação, desonerar o investimento e melhorar a infraestrutura.

A competitividade da indústria brasileira está muito atrelada a esses três pontos.

O Brasil precisa ampliar os investimentos, porque geram emprego e desenvolvimento de tecnologia.

Mas a capacidade de investimento do setor privado diminui muito por causa da carga tributária.

No mundo inteiro, os investimentos são desonerados.

O segundo ponto é as exportações, que estão perdendo competitividade.

Quais são as perspectivas para as exportações?

A taxa cambial penaliza o produto brasileiro e facilita a importação.

A alta tributação e a infraestrutura inadequada tira competitividade dos produtos brasileiros, principalmente manufaturados.

Nas commodities, o Brasil é muito competitivo, por questões intrínsecas ao País.

Como o preço internacional está alto, exportamos muitas commodities.

Nos manufaturados, temos dificuldade.

O mercado internacional é uma guerra.

Não podemos nos dar ao luxo de perder posições.

Analistas esperam superávit forte para 2011 por causa dos altos preços das commodities.

Não é a nossa avaliação.

Nos manufaturados, as importações crescem muito e as exportações caem.

As commodities já estão com um preço elevado no mercado internacional.

No aço, por exemplo, a China comprou um excedente grande, que não consegue vender internamente e está exportando.

Por isso, não acredito um aumento do superávit com as commodities.

O pacote do governo de apoio às exportações não saiu do papel. É preciso retomar isso?

Sim. É hora de repensar a política de comércio internacional.

Temos os mecanismos, mas é preciso que estejam bem orientados.

A Camex (Câmara de Comércio Exterior) agrega técnicos competentes de diversos ministérios, mas precisa de uma melhor coordenação das políticas, inclusive de defesa comercial.

A defesa comercial do Brasil é muito fraca. É lenta, demorada, temos poucas pessoas e coordenação pulverizada.

Por que o senhor considera a defesa comercial fraca?

Temos poucas pessoas.

Nos Estados Unidos, quase 100 pessoas trabalham nessa área.

No Brasil, é muito menos, para um país enorme, com produtos entrando por diversos portos e aeroportos.

São pessoas muito competentes, mas são poucos e estão desarticulados.

Não temos uma orientação que permeie todos os ministérios.

Os empresários reclamam de “invasão” dos importados.

O que o governo poderia fazer?

Temos mecanismos que não ferem os acordos da OMC (Organização Mundial do Comércio).

Mas é preciso que a Camex tenha uma autoridade acima dos ministérios, uma coordenação de ação conjunta.

Precisamos de uma política de barreiras não tarifárias, de barreiras técnicas.

O Inmetro, que está sob coordenação do MDIC, tem que funcionar com essa orientação.

Hoje existem uma série de exigências para o produto nacional, mas não para o importado.

Por exemplo, os fogos de artifício.

Existem polos de produção de fogos em SP e em MG, que estão sob controle rigoroso do Ministério da Defesa.

Mas não fazem as mesmas verificações dos produtos importados da China e da Espanha.

Existe desindustrialização?

Não acho que o termo correto seja desindustrialização.

O que está acontecendo é que alguns setores estão perdendo competitividade.

Esses setores correm o risco de desaparecer.

Posso citar como exemplo componentes, eletrônicos, eletrodomésticos.

Mas não existe uma desindustrialização geral da economia.

As fábricas estão com 82% da capacidade instalada ocupada, o que demonstra que estamos trabalhando.

O real está sobrevalorizado?

O governo deveria intervir?

O real está sobrevalorizado, mas não acho que deveria haver um câmbio artificial.

Temos que criar condições para que o câmbio volte para um patamar adequado.

Hoje entram recursos para aplicação especulativa no Brasil.

Temos que coibir, temos que taxar, seja com mais Imposto de Renda, IOF, ou quarentena. É preciso reduzir o ganho da aplicação especulativa.

No seu discurso de posse, o senhor disse que o investimento estrangeiro deveria ficar restrito a projetos voltados para a exportação.

Pode explicar melhor?

No Brasil, os recursos entram de duas formas: uma especulativa e outra para o investimento.

Quando esse investimento é voltado para a infraestrutura, como saneamento, rodovias, energia, é benéfico porque traz competitividade para a indústria brasileira e para as exportações.

Se o capital estrangeiro chega apenas para explorar o mercado interno, vai competir com a empresa brasileira e tirar mercado.

Os investidores estrangeiros desenvolveram tecnologia fora do País e possuem técnicos e engenheiros bem formados.

Logo, a competição com a indústria brasileira é desigual.

O que eu disse é que os investimentos estrangeiros, excluindo infraestrutura, deveriam ser voltados, pelo menos uma parcela, para a exportação.

Assim ajudariam a balança comercial.

Qual é a sua avaliação sobre o investimento chinês no Brasil?

Vejo com muita preocupação.

Temos que criar uma espécie de reciprocidade.

Não é possível investir na China em mineração sem que o governo concorde e participe.

Não é possível investir na China no setor de serviços, como software.

Por que nós deveríamos permitir?

Qual é o objetivo do chinês quando vem comprar uma empresa de mineração no Brasil?

O objetivo não é só ganhar dinheiro e ajudar o crescimento do País.

O chinês vem para garantir o suprimento de uma matéria prima a preços competitivos.

Daí produz o bem final na China e exporta para nós.

A presidente eleita Dilma Rousseff disse que uma de suas metas é baixar o juros real para 2%. É possível?

Sim.

A única âncora da estabilidade tem sido o aumento de juros, utilizado para combater a inflação.

Não pode seguir assim.

Mas temos que reduzir a Selic de maneira responsável.

A intenção anunciada pelo governo de cortar suas despesas vai no sentido de reduzir a Selic.

A Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) ganhou musculatura, mas recentemente a CNI recuperou espaço.

Existe uma disputa?

Não tem disputa nenhuma.

Quanto mais forte for a Fiesp, mais forte será a CNI, porque a Fiesp faz parte da CNI.

A força da CNI na discussão dos grandes temas também vai facilitar para que a Fiesp discuta sua própria agenda.

Uma coisa complementa a outra.

Agora a CNI vai ser forte no Brasil inteiro, principalmente em São Paulo.

Abrimos um escritório em São Paulo e vamos ficar mais fortes ainda.

QUEM É Mineiro de São João Del Rey, Robson Braga de Andrade, 61 anos, é o 13º presidente da CNI, entidade de 72 anos.

Engenheiro mecânico formado pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Andrade preside a Orteng Equipamentos e Sistemas, sediada em Contagem (MG), que produz equipamentos para os segmentos de energia, petróleo, gás, mineração, siderurgia, saneamento, telecomunicações e transportes.