Por Gustavo Krause Entre o imaginário e o mundo real, a cena ocorre em animado happy-hour sob a bela moldura do entardecer no Planalto Central: céu sem nuvens, salpicado de estrelas, prenunciava a noite de frio seco ao abrigo do aconchegante bar na famosa Academia de Tênis.

Degustando tradicionais acepipes da tábua de frios e o Logan, três personagens retornavam ao batente para mais uma semana de, no máximo, setenta e duas horas, ou seja, começa na terça e se estende ao pôr-do-sol da quinta-feira.

Sem muito esforço de adivinhação, os personagens bem que poderiam ser deputados; com algum esforço de imaginação, dava perfeitamente para perceber que ali estavam três cabeças e uma sentença: combinar a estratégia para sugar as tetas do Tesouro em tenebrosas transações.

Mais antigo no pedaço, o primeiro personagem deita falação: - A bancada governista cresceu.

Tem muito cachorro novo que vai chegar na próxima legislatura com apetite de rato magro, vai querer entrar na mata e botar a boca no capim.

O experiente e rechonchudo nordestino sabia do que estava falando, logo ele um dos signatários da Constituição Cidadã de 1988 e sobrevivente da CPI dos anões do orçamento.

Traduzindo: a concorrência ia aumentar consideravelmente na distribuição do butim.

Antes de qualquer intervenção, advertiu: -Todo cuidado com a bancada do sangue! - Do sangue?!

Espantou-se, o personagem mais jovem, oriundo do centro-oeste. - Sim, o sangue do parentesco.

A bancada da família: a bancada FDP, Família, Deus e Pátria, necessariamente nessa ordem.

E soltou um gargalhada daquelas que balança toda banha do corpo.

O terceiro personagem, bem rodado, representante de um grande estado do sudeste, com modos mais refinados, interveio, demonstrando a segurança de quem teve sólida formação acadêmica, boa experiência burocrática, especializado na gestão de resíduos sólidos, capaz, como ninguém, de transformar lixo em ouro puro: - Não procede a preocupação.

Nós temos know-how e know-who.

Este último é mais importante.

Saber com quem estabelecer conexões e interlocuções.

Nada com o primeiro escalão.

Certo Czar disse, com razão, que quem governava a Rússia não era ele e sim dez mil burocratas.

No Brasil, não é diferente.

A burocracia manda nestes babacas que pensam que mandam, mas passam e ela fica, seja a burocracia estável que se faz de doce para entrar no jogo, seja a burocracia comissionada, desfrutável toda vida porque precisa aproveitar cada segundo do poder.

Outra coisa: nada de holofote.

Jornalista, vade retro, satanás!

Nosso lugar é o baixo clero; nosso cantinho é lá atrás no plenário; nosso voto é do governo, sempre.

Um beicinho aqui, uma ameaça ali, não faz mal.

Até valoriza.

E – em tom de súplica – pelo amor de Deus não usem o celular, esta maldita arma.

O “doutor” em lixo era “o cara”.

O ideólogo que alardeava a máxima: “a chave do sucesso do governante é ser, ao mesmo tempo, concubina dos milionários e gigolô dos miseráveis”.

Terno de Grife.

Ditava regras.

Método seguro, resultado seguro.

E foco, um dos segredos do sucesso.

Não era a toa que os três, especializados em setores rentáveis, tinham a mesma clientela: as prefeituras.

Show de bolas.

O mais experiente especializou-se em saúde, ou seja, transava com a intermediação na aquisição de material e remédios para a rede hospitalar.

Anda felicíssimo com o possível retorno da CPMF, afinal de contas, falta dinheiro para a saúde brasileira…

O representante do centro-oeste cuidava da merenda escolar.

Menino mal nutrido, intermediário obeso, virou seu lema.

O ex-funcionário municipal percebeu que o lixo poderia se transformar em benefício para o meio ambiente, grande negócio para os sabidos e para ele que estaria condenado a receber uma aposentadoria de seis mil reais.

Da província para a capital federal foi um salto.

Acrobático.

Para eles, eleição nunca foi problema.

Entenderam que bolsa de valores e eleição são investimentos.

No mercado de capitais, se investe em papeis; na eleição, em votos.

Um tem retorno incerto; o outro, retorno garantido.

Enquanto as urnas falam; os tribunais silenciam.

Façam o jogo, façam o jogo, as fichas continuam valendo.

De repente, a conversa cessou.

Largos sorrisos de três dadivosas mocréias desmontaram a reunião de negócios.

Novas emoções se oferecem aos nossos personagens.

A noite era uma criança.

Sem a inocência da infância.