Ferreira Gullar, na Folha de São Paulo Dilma está eleita e, a partir de 1º de janeiro de 2011, será a presidente do Brasil.
Nunca imaginou que isso pudesse acontecer, nunca sonhou com isso, nunca o desejou e, não obstante, terá em breve, nas mãos, o mais alto posto político do país.
Um milagre?
Um passe de mágica?
Se pensamos assim, o mago é o presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Inicialmente, apesar de sua indiscutível popularidade, dava a impressão que superestimara seu prestígio, não iria elegê-la.
De fato, como acreditar que uma mulher que nunca se candidatara a nada, destituída de carisma e até mesmo de simpatia, fosse capaz de derrotar um candidato como José Serra, dono de uma folha de serviços invejável, tanto como parlamentar quanto como ministro de Estado, prefeito e governador?
Não obstante, aconteceu.
Para espanto meu e de muita gente mais, 56% dos eleitores preferiram votar em alguém que eles mal conhecem do que eleger um político conhecido de todos, contra o qual não pesa qualquer suspeita ou acusação desabonadora.
E por que o fizeram?
Porque o presidente Lula mandou.
E não foi só o pessoal mal informado que recebe Bolsa Família, não.
Empresários, banqueiros e intelectuais famosos também apoiaram sua candidatura, porque Lula mandou.
Mas não estou aqui para chorar sobre o leite derramado e, sim, para tentar ver o que pode acontecer em consequência disso.
Advirto o leitor de que não parto do princípio de que vai dar tudo errado, que o governo de Dilma Rousseff está condenado ao fracasso.
Nada disso.
Como muita gente, diante desse fato inusitado, nunca visto na história brasileira, pergunto: e agora?
Sempre se faz tal pergunta quando um presidente da República, seja ele quem for, assume o mandato.
Ocorre que, pela primeira vez, pouco se sabe da pessoa eleita e, mais que isso, eleita porque alguém mandou.
A pergunta que está na cabeça de todos -dos que votaram contra e dos que votaram a favor- é: quem vai governar, ela ou Lula? É uma questão razoável, não só porque ela nunca governou nem mesmo um município, como porque Lula, sabendo disso, deve temer pelo que venha a fazer.
E temerá, com razão, já que o fracasso dela, como governante, será debitado inevitavelmente na conta dele, responsável pela mágica que a pôs na Presidência da República.
Estará, assim, criada uma situação também inédita na história do poder central do Brasil: como Dilma não é responsável por ter sido eleita -e ocupar o lugar que só não é do Lula porque a lei não permite uma segunda reeleição-, talvez não possa fazer no governo senão o que for aprovado por ele.
Isso lembra, até certo ponto, a situação vivida por Cristina Kirchner, eleita presidente da Argentina graças à popularidade do marido, Néstor Kirchner, recentemente falecido.
Enquanto vivo, era ele quem governava, sem maiores vexames para ela, uma vez que, casados, podiam até na cama discutir e acertar as medidas governamentais que ela tomaria no dia seguinte.
Já o caso de Lula e Dilma será mais complicado, pois ninguém imagina que ele deixe dona Marisa dormindo em São Bernardo para instalar-se na alcova da presidente Dilma, no palácio da Alvorada.
Nem se acredita, tampouco, que optem por um relacionamento clandestino para, em encontros secretos, disfarçados -ele de peruca loura e ela vestida de homem, bigode e barbas-, discutirem a volta da CPMF ou o que fazer com o MST.
Fora daí, o jeito seria divorciar-se e casar com Dilma, mas tendo o cuidado de deixar claro que se tratou de uma paixão repentina, fulminante, e não de um romance secreto que só então veio à tona.
Tal solução tem o perigo de manchar a reputação dos dois, por oferecer aos maldosos a chance de sussurrar que a candidatura de Dilma teria origens sexuais. É risco demais, não dá.
A alternativa, então, talvez seja Dilma nomeá-lo chefe da Casa Civil, lugar antes ocupado por ela.
Minha dúvida é se Lula, que se acredita o maior estadista brasileiro de todos os tempos, aceitaria função tão subalterna, especialmente depois dos escândalos que envolveram Erenice Guerra, a substituta de Dilma no cargo. É problema dele.
Apenas constato que, se é fácil, com truques mágicos, fazer acontecer o impossível, difícil é resolver os problemas reais.