Por Jorge Cavalcanti, no Jornal do Commercio “Serei fiel ao governo que ajudei a eleger e, agora, terei a oportunidade de mostrar minha lealdade”.

A frase é do presidente da Assembleia Legislativa, Guilherme Uchoa (PDT).

Embora soe atual para os que acompanham as articulações para a eleição da mesa diretora da Casa, foi proferida no dia 30 de janeiro de 2007, quando Uchoa foi oficializado como candidato único ao cargo pela primeira vez.

Hoje, graças à lealdade incondicional que prestou ao governador Eduardo Campos (PSB), já é visto como carta marcada para mais um mandato.

O reinado de Uchoa somado aos três biênios anteriores do ex-presidente Romário Dias, hoje conselheiro do Tribunal de Contas do Estado (TCE), mostra que apenas dois homens terão o privilégio de ter ocupado a cadeira situada no plenário da Casa, logo abaixo do busto de Joaquim Nabuco, em 12 anos.

A única alternância no comando da Assembleia em mais de uma década joga à luz uma discussão cada vez mais atual: a influência do Executivo sobre o Legislativo.

A crítica de que a Assembleia é o “quintal” do Palácio do Campo das Princesas, tão comum para quem está na oposição, já foi, inclusive, utilizada por Uchoa. “A Casa será um apêndice do Palácio”, disparou o pedetista, quando disputou – e perdeu – a presidência contra Romário, em 2001. À época, Uchoa reclamou da “interferência” do então governador Jarbas Vasconcelos (PMDB), de quem era opositor, na eleição na mesa e evocou a “independência” dos Poderes, concebida pelo filósofo francês Charles de Montesquieu em 1748 no livro O Espírito das leis, e prevista na Constituição.

Hoje, quase dez anos depois, a situação para Uchoa é bem diferente.

Vai para o terceiro mandato sem disputar um bate-chapa sequer.

A situação na presidência da Assembleia é semelhante à da primeira-secretaria, responsável por administrar o orçamento do Poder, estimado em R$ 300 milhões para o próximo ano.

Caso o deputado João Fernando Coutinho (PSB) supere a resistência de alguns parlamentares, colocada em público até agora só pelo deputado André Campos (PT), seguirá para o terceiro mandato.

Seu antecessor, o ex-deputado João Negromonte, já falecido, também passou três biênios na função.

O socialista conta com o apoio da bancada eleita do PSB, a maior da Casa, com 13 membros, e do governador, o que lhe dá condições de completar seis anos no cargo.

Para o professor de direito constitucional Antônio Carlos Palhares Moreira Reis, 80 anos, dos quais 57 em sala de aula, há uma diferença entre a independência “formal” da Assembleia enquanto Poder e o posicionamento de cada parlamentar. “A eleição (para a mesa) é secreta.

Se ocorrer de um deputado votar em alguém que não deseja, o problema é de postura.

A independência em si continua inalterada.

Até porque a Assembleia pode reprovar qualquer proposta do Executivo se desejar”, diz.

Palhares Moreira Reis chama atenção para o artigo 2º da Constituição, que diz que os Poderes são “independentes e harmônicos entre si”. “Não é salutar uma disputa entre os Poderes, da mesma forma que também não é construtivo um subserviente ao outro.

O Parlamento é o lugar de negociação, para que o chefe do Executivo tenha que dialogar”, diz ele, lembrando uma derrota do então prefeito do Recife Joaquim Francisco (1989-1990) na Câmara Municipal. “Ele enviou um projeto de reajuste do servidor.

Como não tinha maioria, foi derrotado.

A Casa, para mostrar independência, acabou não concedendo o reajuste”, relembra.

ETTORE, PREFEITO, SEGUE NA ARTICULAÇÃO - Um personagem de fora da Assembleia Legislativa foi quem mais chamou a atenção nas articulações para a indicação dos deputados para as sete cadeiras da mesa diretora, na semana passada.

Ex-parlamentar e prefeito de São Lourenço da Mata (Grande Recife) pela terceira vez, Ettore Labanca (PSB) é visto hoje como a voz do governador Eduardo Campos (PSB) na Casa.

Na prática, a influência dele nas costuras da mesa vem muito antes de Eduardo assumir o governo, em 2007.

Foi Ettore, por exemplo, quem mais trabalhou para viabilizar a reeleição do então deputado Romário Dias, de quem é amigo há décadas, para o segundo e terceiro mandatos como presidente.

No final de 2003, Ettore apresentou uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) para que a recondução aos cargos da mesa fosse permitida. À época, o projeto foi interpretado como uma jogada – em comum acordo com Romário.

Um movimento de resistência então foi ensaiado.

Mas a dupla Romário e Ettore conseguiu aprovar a mudança, por 35 a 14, com a ajuda do Palácio do Campo das Princesas e do poder da cadeira de presidente da Casa.

A proposta original não fixava limite para o número de mandatos, num lance ousado para um terceiro mandato.

O deputado Antônio Moraes (PSDB) tentou, por meio de uma subemenda, limitar a dois a quantidade de biênios.

Mas foi derrotado.

Na eleição que garantiu o terceiro mandato a Romário, Ettore foi eleito 1º vice-presidente da Assembleia.

A dupla, mais uma vez, foi vitoriosa.

Na atual legislatura, descontentes com a permanência de Romário no cargo mais poderoso e político da Assembleia, o segundo na linha de sucessão do governador, deputados quiseram evitar que o novo presidente Guilherme Uchoa (PDT) seguisse o precedente aberto por Romário.

O tucano Pedro Eurico, então, deu entrada numa PEC para acabar com a reeleição.

Uma emenda do deputado Sílvio Costa Filho (PTB), porém, deu aos que estavam na mesa a chance de ficarem por mais um biênio, alegando que se tratava de uma espécie de direito adquirido, já que os colegas foram eleitos com a chance de reeleição em vigor.

Com a não reeleição de Ettore em 2006, o PTB o indicou ao governo.

Para acomodá-lo, Eduardo criou a Secretaria de Articulação Parlamentar, vinculada à Casa Civil.

Foi a partir daí que o ex-deputado ganhou a simpatia e confiança do governador, passando a ser o curinga na manga para eventuais problemas.

Nos bastidores, deputados avaliam que a capacidade de ser “operacional” foi o que fez Ettore crescer no conceito do chefe.

Eduardo é conhecido por gostar de auxiliares que resolvam problemas.

De homem de confiança do ex-governador Carlos Wilson, já falecido, voltou a frequentar o segundo andar do Palácio e, ao que tudo indica, continuará com acesso livre no segundo governo Eduardo.

O JC tentou contato com o prefeito desde a última quarta, diariamente, mas não obteve retorno.