Do IG O ex-ministro da Fazenda Antonio Delfim Netto acredita que o governo da presidenta eleita Dilma Rousseff terá de criar uma regra para que as despesas públicas sejam inferiores ao crescimento do Produto Interno Bruto (PIB).

Dessa forma, sobrarão mais recursos para investimento na infraestrutura do Brasil, diz o economista. iG: Como o senhor vê o cenário da política econômica no governo da presidenta eleita Dilma Rousseff?

Delfim Netto: Não vejo nenhuma razão para que se mude a política econômica.

Está funcionando razoavelmente bem.

Acredito que vamos continuar, em princípio, com o mesmo tipo de política baseada em equilíbrio fiscal, um Banco Central autônomo, metas de inflação e câmbio flutuante.

Certamente haverá alguns aperfeiçoamentos e é natural que isso aconteça. iG: Quais ajustes podem ser feitos?

Delfim Netto: É preciso um compromisso mais firme com o equilíbrio fiscal para dar um pouco mais de coragem ao Banco Central para tentar fazer o que precisa ser feito que é reduzir a taxa de juros e os juros reais no Brasil. É preciso estabelecer uma regra para que as despesas do governo cresçam em patamares inferiores ao PIB.

Isso vai abrir espaço para mais investimentos.

Está se incorporando novos segmentos na economia e isso pode fazer o País crescer sem aumentar a carga tributária.

O que vai ser preciso para complementar é uma política de estímulo à poupança interna. iG: O senhor acha que é necessário uma redução em despesas de custeio do governo federal?

Delfim Netto: Essa ideia de que é necessário um choque fiscal não é precisa.

Nossa situação é melhor que a de muitos países.

O que deve haver é um reconhecimento de que precisa daqui pra frente fazer as despesas que não são essenciais crescerem menos que o desempenho da economia. iG: O senhor acredita na viabilidade das reformas fiscal e tributária no novo governo?

Delfim Netto: As reformas principalmente a tributária viraram uma espécie de desculpa.

Não se faz mudança nenhuma porque vai fazer a reforma tributária.

Acho que algumas medidas podem ser tomadas como colocar a cobrança do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) no destino, como forma, inclusive, de desonerar exportações e inibir a guerra fiscal entre os Estados.

Seria um avanço enorme.

Choques e reformas não vão nos levar a lugar nenhum. iG: Qual a avaliação do senhor sobre a volta da CPMF?

Delfim Netto: O Brasil fez mais sem a CPMF.

Essa história de imposto destinado para a saúde não funciona.

O caixa da União é único e o orçamento é que vai determinar a utilização dos recursos.

A informalidade no País diminuiu, mas ainda é alta.

Isso mostra que tem potencialmente para ampliar a arrecadação sem ampliar a carga tributária. À medida que o País crescer e ir incorporando novos setores na economia é necessário fazer crescer o investimento do governo.

Quando o Brasil crescia 10% ao ano, a carga tributária estava em 24% do PIB e o investimento do governo era de 4% do PIB.

Hoje a carga tributária é de 36% e o investimento é de 1,5%. iG: E os investimentos em programas sociais?

Delfim Netto: O programa Bolsa Família está quase no limite.

Não existe mais um contingente grande de famílias que precisam ser incorporadas.

O programa Luz para Todos também.

Os programas de transferência de renda estão caminhando para um equilíbrio. iG: O PIB pode crescer a taxas mais robustas sobre essa base forte que pode chegar a até 8% este ano?

Delfim Netto: Na minha opinião, o Brasil vai crescer entre 5% e 6% nos próximos 10 ou 15 anos e tem condições para isso, sem ter nenhum problema maior com inflação e déficit em conta corrente. iG: A explosão de crédito ao consumidor no País é um fator que demanda cautela?

Delfim Netto: É uma situação ótima para o País.

Não tem perigo nenhum.

O crédito total no Brasil está em cerca de 40% do PIB e no passado já foi 80%.

Houve um aumento de renda que criou novas classes de consumo e o crédito teve um papel importante nesse processo.

O maior risco é importar uma bolha do exterior no setor financeiro.

O crédito acompanha o crescimento, é causa do crescimento e produto do crescimento.

Então não tem muita razão pra se imaginar que o crédito possa produzir algum efeito dramático com um endividamento gigantesco das famílias brasileiras que deixarão de consumir. iG: O senhor crê que possa sair alguma solução prática sobre o câmbio na reunião do G-20?

Delfim Netto: Eu não acredito nessa possibilidade.

O problema dos Estados Unidos com a China é uma questão curiosa.

As pessoas imaginam que o presidente Barack Obama não age contra a China.

E não age porque as maiores empresas americanas estão instaladas na China.

São irmãos siameses.

Tanto que o yuan está atrelado ao dólar.

A China financia o enorme déficit americano.

E países emergentes como o Brasil sofrem com os efeitos dessa relação.

O governo tem consciência de que nenhum mecanismo de curto prazo é eficiente para reverter por completo a valorização do real, mas o ministério da Fazenda opera em legítima defesa.