Por Túlio Velho Barreto, na seção Opinião do Jornal do Commercio Os resultados das eleições de 2010 são consequências do que chamaria de a nova geografia do voto e do poder no Brasil.

Com origem na primeira eleição de Lula da Silva, tal fenômeno se consolida agora com a eleição de Dilma Rousseff.

E representa um novo ciclo na política nacional na atual quadra democrática.

Não compreender isso significa simplesmente dar às costas, ou melhor, fazer ouvido de mercador aos claros recados emitidos pelas urnas em todo o País, e não apenas em uma ou outra região ou Estado.

Mas é isso o que parece ocorrer com a oposição, sobretudo com os “cardeais” do PSDB paulista.

De fato, a segunda derrota de José Serra à Presidência da República representou a terceira sucessiva de um candidato do PSDB paulista ao cargo (Serra, em 2002, Geraldo Alckmin, 2006, e Serra, 2010).

E o ex-candidato e a cúpula do partido não parecem dispostos a analisá-la à luz dos inúmeros erros cometidos, agora e no passado.

Assim, tentam identificar em fatores exógenos ao partido e à coligação, em especial com o DEM, as razões para a derrota.

Age, então, como o personagem sartreano Garcin, de peça de título emblemático (Quatro paredes), que, em crise existencial, insiste em acreditar que “o inferno são os outros”.

Criado a partir de uma dissidência do PMDB, ainda no processo Constituinte (1987-88), por rejeitar a aliança fisiológica entre peemedebistas e o então PFL, que ficou conhecida como Centrão, o PSDB governou o País entre 1995-2002 com o mesmo PFL (Fernando Henrique Cardoso/Marco Maciel).

E tem governado o Estado de São Paulo, sua principal vitrine, desde então (1995), com Mário Covas/Alckmin, Alckmin/Cláudio Lembo (PFL) e Serra/Alberto Goldman.

Mas, antes, Franco Montoro já governara o Estado (1983-86).

Nacionalmente também controlado pelo PSDB paulista, o partido ainda não percebeu a dimensão das mudanças em curso na geografia do voto e, consequentemente, do poder.

Daí, a dificuldade do PSDB em aceitar os erros de seu candidato, que retardou até o limite o anúncio de sua pretensão em disputar a Presidência, sobretudo para inibir as iniciativas do então governador mineiro Aécio Neves, e a falta de sintonia do partido e de seu projeto com a nova realidade nacional.

Perdeu, então, a oportunidade de responder às mudanças no sentido da nova disposição dos votos e descentralização do poder.

Com Aécio Neves, o partido teria tido muito mais chances de dialogar com o País, como um todo, e a sociedade, em particular.

E as chances de sucesso teriam sido maiores.

Agora, a oposição precisa reiventar-se.

Usei tal expressão ao analisar a histórica vitória do governador Eduardo Campos em Pernambuco.

Ou seja, defendi a ideia de que os partidos oposicionistas terão que mergulhar fundo na análise crítica de suas últimas derrotas, no Recife e em Pernambuco, estabelecer novo paradigma de atuação e de relação entre os aliados, e destes com a sociedade, antes de definir projetos alternativos de governo, que possam ser contrapostos aos atuais, hegemônicos, para só então projetar novas disputas eleitorais, a médio e longo prazos.

Penso que o mesmo serve para a oposição nacional.

E tal reinvenção passa pelo deslocamento de poder no PSDB de São Paulo para Minas Gerais (leia-se: Aécio Neves) sob pena do partido prender-se à máxima “o inferno são os outros” (os nordestinos, a popularidade do presidente, o Bolsa Família…).

E de correr o risco de perder sua única liderança emergente importante.

Para tanto, deve se debruçar sobre dados do TSE.

E ver que a petista ganharia ainda que fossem excluídos os votos do Nordeste e mesmo do Norte e Nordeste, já que Serra também perdeu em fortes colégios eleitorais do Sudeste (Minas e Rio).

E mais: a diferença pró-Serra em São Paulo, Estado governado pelo tucano até março, foi menor do que a diferença pró-Dilma em Pernambuco, a despeito de este ser um colégio eleitoral 4,8 vezes menor do que o paulista.

Ou seja, também em São Paulo o projeto serrista parece não ter ganho dimensão nacional.

Outros dados corroboram tal análise: embora vá governar pouco mais de 50% do eleitorado brasileiro, a oposição (PSDB/DEM) obteve 44% na eleição presidencial e será minoria absoluta no Congresso Nacional.

Isso mostra o descompasso entre a centralização do poder no PSDB paulista e a força do partido nos Estados, em especial em Minas e no Sul.

E que a oposição, sobretudo tucana, precisa urgentemente desmontar o palanque, analisar as razões da derrota de seu projeto nacional e esforçar-se para entender o recado das urnas, isto é, a nova geografia do voto e do poder em curso no País.

Que só não vê quem insistir que “o inferno são os outros”.

PS: Túlio Velho Barreto é cientista político e pesquisador da Fundação Joaquim Nabuco