Na Veja Faltam apenas dois meses para o fim do governo Lula, mas pouco se sabe sobre o futuro do presidente.

Em segredo, o chefe de estado planeja a sua vida e a continuidade de sua carreira pública, ainda que fora do Palácio do Planalto.

Apesar da empolgação - muitas vezes além da conta para um ocupante do cargo - com a qual se envolveu na campanha de Dilma Rousseff (PT), Lula parece desconfortável com a perspectiva de deixar o cargo ocupado desde 2003.

Em uma brincadeira recente, o presidente afirmou que não largaria a faixa oficial no dia 31 de dezembro, quando terminará, enfim, seu segundo mandato.

Entre as especulações sobre o futuro de Lula, fala-se muito na criação de uma fundação com o seu nome.

A assessoria de imprensa da Presidência da República, porém, não confirma qualquer plano concreto dele. “Existe a intenção de criar uma instituição que contenha tudo referente a este governo, mas o presidente tem evitado falar disso até com pessoas próximas.

Ele quer aproveitar ao máximo o fim do mandato, sua popularidade e suas conquistas”, afirmou um dos seus assessores ao site de VEJA.

Que o presidente está mesmo aproveitando sua popularidade não resta nenhuma dúvida.

Ao longo da campanha de Dilma Rousseff, Lula não hesitou em utilizar sua influência para apoiar fervorosamente a possível sucessora.

Deixando de lado a liturgia do cargo, em inúmeros momentos transformou-se em cabo eleitoral, deixando a Presidência em segundo plano.

A oposição não se conformou.

A Justiça Eleitoral investigou sua conduta.

Mas Lula não se deteve: seguiu rodando o país, comandando comícios e liderando carreatas - e, em numerosas ocasiões, deixando de lado a agenda presidencial.

Segundo a leitura do cientista político da Universidade de Brasília Antonio Flavio Testa, ao se dedicar veemente à campanha de Dilma, Lula quer, além de eleger sua candidata, exibir o poder e a aprovação que adquiriu na condição de presidente.

Ele lembra que Lula chegou a ser punido por sua campanha feroz em favor de Dilma.

Antes da data em que a propaganda eleitoral passou a ser oficialmente permitida, no dia 6 de julho, o presidente recebeu diversas multas por campanha antecipada.

Os valores somados ultrapassaram 40.000 reais.

Testa lamenta o fato de Lula ter se transformado num militante partidário nessa reta final. “De fato, Lula tem participado de maneira exagerada", concorda o professor em ciência política da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP), José Paulo Martins Junior. “Entendo que seja normal que um chefe de estado se posicione, mas a postura dele tem sido exacerbada.” Em algumas de suas viagens oficiais, Lula aproveitou para pedir votos para Dilma.

Isso ocorreu, por exemplo, em sua passagem por Maringá, no Paraná, em setembro.

Além disso, também se reuniu com aliados para discutir a campanha dentro do Palácio do Planalto e gravou o horário político eleitoral durante seu expediente. “Pelo menos ele não buscou um terceiro mandato, apesar de gostar muito de prestígio e de ser presidente”, diz Martins Junior, em referência às mobilizações dos petistas no sentido de mudar a lei e permitir uma nova reeleição.

O especialista acha que o Brasil não sabe qual postura esperar de um político nessa situação: “Outros governantes que tivemos depois de 1945 não tinham candidatos ou popularidade.” Ele acredita que, como a república brasileira ainda é jovem, tudo que Lula está fazendo não é necessariamente um perigo - pode ser também uma oportunidade para ficar atento e defender que a legislação lide com isso de maneira mais clara e com penalidades mais duras.

Em pelo menos duas ocasiões, o tom usado por Lula para ajudar Dilma repercutiu negativamente em quase todos os setores da sociedade.

Primeiro, o presidente condenou a imprensa por destacar o escândalo envolvendo a ex-ministra-chefe da Casa Civil, Erenice Guerra, revelado por VEJA.

Depois, fez piada sobre a agressão sofrida pelo candidato da oposição, José Serra (PMDB), numa caminhada no Rio de Janeiro - comparou o adversário ao goleiro chileno Rojas, que fingiu ser atingido por um sinalizador no Maracanã, em 1990.

Serra, de fato, foi agredido na ocasião ironizada pelo presidente.

Para Testa, a imensa popularidade de Lula é o que permite declarações desse tipo. “O presidente pensa que isso dá a ele o direito de usurpar papeis”, critica, “usando, para isso, a máquina pública.”