Por Matheus Leitão, Márcio Falcão e Andreza Matias, na Folha.com A Casa Civil, sob o comando da candidata do PT à Presidência, Dilma Rousseff, contratou o filho do acupunturista dela e do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Gu Zhou-Ji ganha R$ 4 mil por mês para atender os servidores da pasta.

A princípio, Zhou-Ji foi nomeado como “assessor técnico” em outubro de 2009.

Em abril de 2010, parou de exercer função burocrática e passou a aplicar suas técnicas terapêuticas, como ele mesmo explicou a Folha, nos “funcionários e seus dependentes”.

Dilma deixou o governo no final de março.

Mas o serviço de Zhou-Ji não se restringe à Casa Civil.

Como assistente do pai, o acupunturista Gu Hanghu, ele ajuda no atendimento à candidata Dilma.

Segundo Zhou-Ji, a candidata recebe atendimento duas vezes por semana na casa dela ou no consultório do pai para combater “o estresse” e para “recuperação do corpo” após o tratamento do câncer linfático que teve no ano passado. “É mais para a manutenção mesmo”, disse ele.

A assessoria de Dilma informou que Zhou-Ji pode ter acompanhado algumas sessões terapêuticas do pai com a candidata.

A seguir a íntegra da entrevista.

Folha - O senhor é acupunturista da Casa Civil e da Presidência?

Gu Zhou-Ji - Sou, mas não existe nada de errado nisso. É horrível o que estão fazendo comigo.

Quando eu entrei não tinha nenhum cliente.

Não fiz divulgação, mas hoje estou com muitos clientes.

O senhor foi nomeado para fazer o quê?

Essa parte você tem de perguntar no Palácio do Planalto.

Eles têm uma resposta direitinha.

Primeiro, era a parte administrativa.

Fui contratado como assistente técnico.

Como apresentei o diploma em acupuntura, passei a atender.

Comecei o atendimento em abril.

Não fizemos propaganda, só boca a boca e hoje eu não tenho horário.

Só atendo com hora marcada e tenho só uma maca.

O senhor faz em todas as pessoas?

Trabalho na coordenação de saúde da Presidência.

Então, todos os servidores podem atender comigo, sem exceção.

O senhor usa uma sala?

Com certeza.

Tem que ser reservado.

As pessoas deitam, tiram a roupa, não pode ser público.

O senhor diz que atende todos dentro do Palácio?

Qualquer um.

Já atendi o dentista, o faxineiro, os diretores, mas não pergunto o cargo das pessoas.

Se chega com dor, vou resolver.

Atendo servidor, dependentes e outros. É um atendimento público –que não cobramos nada– aberto a servidores e seus dependentes.

Qualquer um que aparece, precisando de acupuntura, eu atendo.

Não tenho restrição.

A ex-ministra Erenice Guerra chegou no seu consultório…

Claro que eu vou atender.

Eu estou vendo que a ministra está com dor, ela chega para mim e eu vou dizer que não vou resolver?

Eu atendi o vice-presidente (da República), José Alencar.

Qual o problema?

Ele estava com dor, eu fui lá e o atendi.

Eu sou servidor.

Tenho que trabalhar.

Qual o seu horário?

Trabalho de segunda a sexta-feira, das 8h da manhã às 18h, com duas horas do almoço.

Só que eu tenho filhos para buscar e, às vezes, posso chegar um pouco atrasado do almoço.

Só isso.

O seu pai (acupunturista Gu Hanghu) te apresentou para a candidata Dilma Rousseff?

O meu pai atende o senhor presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, desde 2003.

Se eu precisasse de algum favor, já tinha pedido emprego, não é verdade?

O meu pai trabalha honestamente e eu também.

Eu fui estudar medicina tradicional chinesa na universidade de Xangai em 2004 para pegar o diploma, apesar de eu ter aprendido com o meu pai desde os 12 anos.

Voltei no meio do ano passado.

Não conhecia a ministra Dilma e não sabia quem era a ministra Erenice.

Cheguei com a minha formação na medicina tradicional chinesa… e para achar uma pessoa qualificada não só em Brasília, mas no Brasil inteiro, é difícil.

Meu pai me apresentou para o médico do presidente (Lula).

Como estava dando resultado no presidente, resolveram me convidar.

Se funciona para o presidente da República, por que não vai funcionar para os funcionários?

Todo mundo é gente.

Como o senhor está atendendo Dilma Rousseff no meio da campanha presidencial?

Eu não faço acupuntura na ministra.

Eu sou assistente do meu pai.

Eu acompanho o meu pai toda vez, porque ele não fala português direito –precisa passar orientações e eu traduzo para ele.

Sem contar que, durante os atendimentos, eu sou a pessoa mais indicada para fazer a assistência dele.

Conheci a ministra no consultório do meu pai.

Onde vocês atendem Dilma?

Temos dois locais.

Ou no consultório do meu pai, onde atendo com ele aos sábados, ou meu pai vai até a casa dela.

Qual o problema da ministra Dilma?

Nós sabemos os problemas que ela teve, não é?

E, segundo a OMS (Organização Mundial de Saúde), é muito indicado o tratamento da medicina tradicional chinesa, acupuntura, plantas ou ervas no pós-operatório do paciente, para a prevenção e o tratamento do câncer.

Mas isso já acabou e, no caso dela, é para recuperação do corpo. É mais para a manutenção e o estresse, do que para o tratamento.

O senhor ganha quanto no Palácio?

Eu ganho R$ 4 mil bruto.

O senhor acha muito ou pouco?

Amigo, vamos fazer um cálculo.

Eu sou bom no que faço.

Cobro R$ 150 por atendimento particular.

Vamos dizer que eu tenho um consultório particular e atenda muito mal –cinco pacientes por dia.

Dá R$ 600… então, numa semana eu ganharia R$ 3 mil.

Lá, ganho R$ 4 mil bruto.

Você acha que eu ganho bem?

O senhor está dizendo que ganha mal?

Eu ganho mal.

O senhor já teve que atender o presidente Lula numa emergência?

Não.

E a ministra Erenice…

Olha, ela teve problema de coluna.

Estava frequentando não só a minha sala… estava com problema e estava tendo outros atendimentos médicos lá.

O senhor não vê conflito de interesse no fato do seu pai ser o acupunturista do presidente Lula e o senhor trabalhar no Planalto?

A pessoa vendo isso acha que é um problema.

Mas se você for pensar direito, eu estou fazendo um bom trabalho.

Já resolvi o problema de várias pessoas que precisam do meu serviço.

Uma coisa não tem nada a ver com a outra.

Como o meu pai gosta de dizer: nós somos médicos.

Trabalho com saúde, não com política.

Eu aceitei o convite para entrar lá no Palácio do Planalto não por causa do dinheiro, mas porque acho o presidente Lula excelente.

O Brasil realmente cresceu com ele.

Estive fora cinco anos e quando voltei tomei um susto.

As pessoas estão com dinheiro no bolso.

Fiquei surpreso com o crescimento gigantesco que o Brasil teve nesses oito anos do Lula. É uma honra para mim poder trabalhar lá dentro e resolver os problemas de quem está trabalhando para o bem do país.

Uma coisa é a pessoa fazer tráfico de influencia e ganhar R$ 100 mil por mês.

Eu ganho R$ 4 mil –mal consigo pagar o colégio de dois dos meus três filhos.

Tenho conta, condomínio para pagar.

Quem me ajuda é a minha família, não a Presidência.

O senhor pensa em sair de lá?

Olha, sinceramente não vejo nada que eu tenha feito de errado.

Ganho o meu salário, mas meu trabalho vale mais.

Entrevistem os meu clientes para ver se o meu trabalho é bom ou não.

Tenho hoje 100 pacientes, com ficha.

Alguém fazia o serviço de acupuntura no Palácio do Planalto antes do senhor?

A coordenação de saúde do Palácio já tinha plano de abrir acupuntura.

Tem odontologia, fisioterapia. É bem completo.

A acupuntura cresceu muito no Brasil e como eu voltei com aquela formação toda… eles me convidaram.

Fizeram um bom convite.