Por Roberto Numeriano e Aníbal Valença O título do artigo “As novas viúvas do neoliberalismo”, redigido (queremos crer), pelo deputado federal Fernando Ferro (PT), e publicado na Folha de São Paulo, é um exemplo daquela sentença popular que afirma estar “o sujo falando do mal lavado”.
O artigo pretende criticar o sr.
Roberto Freire, ex-dirigente do PCB que bandeou-se para o lado mais reacionário da classe financeira e industrial do país, tentando até seqüestrar o nome e os símbolos do PCB.
Mas, na verdade, agride, distorce e mente sobre a história do Partido Comunista Brasileiro.
E o faz porque nem o PT é, a rigor, na sua essência ideológica, muito diferente da direita brasileira, nem pode criticar os partidos de direita e centro-direita (a exemplo do PSDB), sobretudo em relação à política econômica aplicada no país.
Em primeiro lugar, o PT não surgiu diante da “incapacidade do PCB de criar uma perspectiva consistente de representação para os trabalhadores do Brasil”.
Como o chamado Partidão poderia criar tal perspectiva vivendo quase sempre sob ilegalidade em décadas de existência, e sobretudo nos anos 70, quando quase dois terços do seu Comitê Central foi assassinado pela ditadura?
O PT nasceu e se fortaleceu porque possuía espaço social, político e ideológico, potencializados pelo sindicalismo militante do ABC, pelas Comunidades Eclesiais de Base da Igreja Católica, e por muitos professores universitários simpatizantes de um novo projeto político-partidário que postulava o socialismo (pelo menos em tese).
Apenas em 1985 conquistamos uma nova legalidade, tendo que lutar durante e depois na frente ideológica, sob a pressão do neoliberalismo.
O deputado, a seguir, afirma que “Na origem, o PT se caracterizou pela adoção de métodos democráticos de organização, em contraposição ao velho e acomodado ‘peleguismo’ e à burocracia sindical da qual o PCB era cliente”.
Percebam que a frase acima parece um ato falho: o PT realmente surgiu assim (embora nem tão democrático, conforme prova a história das práticas da hegemonia do grupo de Lula, Articulação, com seu “democrático” rolo compressor sobre as demais tendências), mas tal origem rapidamente foi desprezada em nome do “pragmatismo” arrivista da luta pelo poder a qualquer custo.
Nunca antes na história desse país um partido manteve um controle tão eficaz e estrito sobre a máquina sindical hegemônica (leia-se, a CUT e seus cutistas), praticando, de modo descarado, um fisiologismo e compadrio que tornou a CUT uma confederação pelega, chapa branca, com seus integrantes gozando de cargos comissionados e benesses milionárias nas comemorações embusteiras a cada dia 1º de maio.
As exceções confirmam a regra.
Em segundo lugar, chega a ser estranho o deputado Ferro considerar que o PPS, criado pelo novo comensal do governo de São Paulo, é o “velho PCB” transformado numa “sigla de aluguel”.
O PPS foi criado em um processo de racha partidário, numa tentativa simultânea de extinguir o PCB (interesse que certamente, em futuro não tão distante, será explicado a partir do momento que a história secreta dessa manobra esteja aberta à pesquisa em arquivos de serviços secretos).
O famigerado PPS não é, portanto, o PCB, tanto quanto o PT atual não é o PT das ilusões de um passado político recente.
Siglas de aluguel, na verdade, são a maioria dos partidos aos quais o PT, emulando as velhas práticas que condenava com sua verborragia supostamente ética e radical, se soma para ganhar tempo no guia eleitoral.
O PT, sim, é hoje, no plano econômico, o protagonista das teses de direita para garantir a governança e estabilidade econômico-financeira.
Faz a festa da banca, enquanto humilha os brasileiros pobres e desempregados com bolsas-famílias, praticando a velha política de pão e circo para as massas.
Não fossem alguns aspectos da política externa petista, poderíamos dizer que o governo do PT pouco difere dos fundamentos do projeto político-ideológico social-democrata do PSDB.
Por fim, podemos afirmar que o PT não está construindo nenhuma democracia ao sul do Equador, senão ajudando a conformar, a cada eleição, um grande consenso fraudado.
Um grande embuste político, sobretudo porque gerado pelo poder do capital de corporações privadas, às quais se aliou e se submete para chegar / permanecer no poder.
Uma democracia de raiz, participativa, radical, esta concepção está sendo aos poucos gestada pela oposição de esquerda e marxista.
Nós do PCB fazemos parte dessa oposição, sem veleidades de protagonismo, individualismo e arrogância (como sempre foram e são as marcas do PT).
E temos ainda uma vantagem, nesse processo: não vamos trair os discursos, até porque não temos o DNA anticomunista com o qual foi gestado o projeto petista de poder.
Uma vez no poder, a carta dessas forças não será aos brasileiros, mas a Carta dos Brasileiros.
Roberto Numeriano e Aníbal Valença são membros do Comitê Central do PCB.