Fotos e texto Chico Ludermir Os meses de inverno do Recife trazem junto com a chuva o medo de novas cheias e desabamentos.
Reflexo de uma cidade que se urbanizou desordenadamente.
Em Linha do Tiro e Dois Unidos as águas já fizeram vítimas fatais.
No Ibura, Zona Sul da Cidade, há exato um ano, a queda de uma barreira deixou órfãos seis filhos e uma viúva.
Pouco mudou.
Em meio a situação desumana, num cantinho no Ibura, Cauã, de 5 anos, achou no balde de lixo tampado com uma bacia e uma lona preta, a continuidade para suas brincadeiras vespertinas.
Sem poder sair de casa, mergulhava um boneco verde na água limpinha acumulada, enquanto construía suas histórias fantásticas.
O irmão Kevin, de 6 anos, também chegou junto para confabular.
A casa dos dois fica em cima de uma barreira ainda sem muro de arrimo.
Foto Chico Ludermir Descendo a barreira, o que se via não era de diferente.
Cada um dava seu jeito.
Saulo Silva, 23 anos, ajudante de pedreiro tirava com pá a areia de dentro do canal que a prefeitura prometeu ajeitar.
Já tinha tirado dois metros.
Suely Lins fazia o mesmo.
Foi a casa dela que caiu no ano passado, matando seu pai e destruindo também a sua barraca de vender miudezas, seu ganha-pão.
Além de ajudar a desafogar o canal, com trabalho de formiguinha, Saulo, Suely e tantos outros também vendem a areia .
Vez por outra passa um caminhão para recolher todo o trabalho deles.
Um caminhão cheio vale R$ 140.
A resistência sutil presente nos velhos e moços lembra a máxima docemente revolucionária de Gilberto Gil “Na Terra a gente tem de arranjar um jeitinho pra viver”.
O Ibura é a prova.