Moacir Assunção - O Estado de S.Paulo O futuro do chamado projeto ficha limpa, em apreciação no Congresso Nacional, foi o principal assunto discutido em debate promovido pelo Estado, na sexta-feira, 16, que reuniu no salão nobre da empresa as sete principais Organizações Não-Governamentais (ONGs) da área de fiscalização da atividade política e o Ministério Público Federal (MPF).

A importância de o projeto ser votado a tempo de valer para as eleições deste ano – em maio, antes das convenções de junho – e de ser mantido o texto original, sem emendas que o descaracterizem, foi o principal consenso do encontro das ONGs.

Durante a discussão, mediada pelo jornalista Roberto Godoy, os participantes foram questionados se consideram que o Congresso vai votar o projeto e o que ocorrerá se isso não acontecer.

As entidades pressionam os deputados para que a proposta, considerada um marco no combate pela transparência e contra a criminalização da política, seja aprovada logo.

Apesar de apoiado por 1,6 milhão de eleitores de todo o País por meio de assinaturas entregues ao Congresso, o projeto não teve aprovado o seu pedido de urgência urgentíssima para tramitação e está em discussão na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) até o fim deste mês, sob o compromisso de que retornará ao plenário em 5 de maio para votação.

Pela internet, as entidades já estão pressionando os parlamentares para evitar emendas que descaracterizem o texto negociado na Casa. “Se vai ser aprovado e a tempo não sabemos, mas o mais importante é que a discussão está posta e é irreversível a mudança na cultura da sociedade.

A população tem acompanhado com muito interesse este debate.

Estamos criando um círculo virtuoso para que as pessoas de bem passem a se interessar por política”, defendeu Jorge Donizeti Sanchéz, da Amarribo.

Luciano Santos, do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), afirmou não ter dúvida de que o ficha limpa será aprovado. “Nossa expectativa não é se vai passar. É que tem que passar.

Não há outra resposta que o Congresso possa dar a essa questão”, avaliou. “O que nos parece é que o presidente da Câmara (Michel Temer – PMDB-SP) está efetivamente interessado na aprovação.

A votação em plenário deveria ter acontecido há duas semanas, mas as manobras regimentais que foram feitas para atrasá-lo demonstraram que há muitos interesses contrários ao projeto.

Há consequências, no entanto, desse pensamento que já chegou à sociedade.

O PV baixou resolução que só admite candidato que tenha ficha limpa.

Isso demonstra que esse debate está surtindo efeito.

O PDT de Brasília também determinou, em meio ao escândalo, que só aceitará postulantes a cargos públicos com passado sem problemas com a Justiça.” Claudio Abramo, da Transparência Brasil, discordou dos colegas no que diz respeito à apreciação rápida do projeto. “Não é totalmente tranquila assim a aprovação ou que seja aplicável a esta eleição.

Surgirão contestações que farão referência à lei eleitoral”, disse. “Fomos olhar a legislação dos países desenvolvidos para ver como é a questão das eleições em relação a pessoas que têm processos e em nenhum deles há proibição.

Seria uma inovação no Brasil.

Aqueles que se oporão, que são muitos, irão ao STF para contestar, com certeza”, continou Abramo. “O princípio da inocência até prova em contrário, que é o trânsito em julgado, vai ser aventado, com certeza, para combater a proposta.” Chico Whitaker, da Articulação Brasileira de Combate à Corrupção e à Impunidade (Abracci), contestou: “Quero colocar em dúvida sua informação (de Abramo).

Recebi dos colegas do MCCE, entre os quais juristas, promotores e juízes, a informação de que há vários outros países com legislação muito mais dura do que o que estamos fazendo aqui.

Mas a indignação do cidadão tem crescido bastante.

Nestes dias, conversei com a deputada federal Luíza Erundina (PSB-SP), condenada em última instância por assunto que não tem a ver com improbidade e ela me disse para ficar despreocupado, que ela pagaria o preço de não poder participar da eleição se fosse o caso.

Achei isso uma enorme demonstração de ética da parte dela.” O procurador eleitoral Pedro Barbosa Neto lembrou que a questão do ficha limpa, embora seja uma discussão nova na sociedade já está prevista na legislação. “É possível que tenha confrontos no STF e isso faz parte.

O que os senhores estão fazendo, na verdade, é corrigir uma mora do Judiciário.

No artigo 14 inciso nono da Constituição já se fala em vida pregressa do candidato.

Este é um preceito constitucional desde 1994.” Barbosa Neto esclareceu, ainda, a preocupação de Abramo, da presunção de inocência, frequentemente usada pelos adversários do ficha limpa para tentar desqualificá-lo. “No Brasil, de vez em quando há a banalização de direitos fundamentais.

A presunção de inocência está ligada ao direito penal e nós estamos falando de legislação eleitoral.

A questão é relacionada à precaução do cidadão”, disse.

Para Maurício Broinizi, do Movimento Nossa São Paulo, o projeto oferece um marco político fundamental à política brasileira. “O ficha limpa constitui um questionamento profundo dessa política que se instalou no Brasil a ponto de precisarmos que o candidato ao poder político demonstre que não tem currículo que o desabone”, defendeu.

No País, a atividade política é identificada pela juventude como tendo relação direta com a corrupção, o que é muito complicado.” Rosângela Giembinsky, do Voto Consciente, disse que os parlamentares precisam lembrar-se bem de suas responsabilidades ao votar a lei. “Nossos parlamentares estão perdendo a oportunidade de escrever a história desse País.

Eles estão defendendo a classe corrupta, que não está no Congresso, que são os vereadores e prefeitos que os elegeram.

A sociedade está madura para esse momento e o está pedindo.

Nossos congressistas estão perdendo a possibilidade de passar para a história desse País.” Gilberto Palma, do Instituto Ágora em defesa do Eleitor e da Democracia, afirmou que espera a aprovação o mais rápido possível do projeto. “O tema da ficha limpa se constitui um marco que tem todas as características do antes e do depois da política brasileira, em termos de sua evolução e da democracia no Brasil.” Se o projeto não passar e, portanto, não valer para as eleições de outubro, Santos, do MCCE, afirmou que as entidades farão listas de candidatos que têm problemas com a Justiça para evitar que os eleitores votem neles. “A própria Abracci já se manifestou nesse sentido”, revelou.