A candidata petista falou “dilmais” Em sua primeira incursão de campanha longe do presidente Lula, Dilma Rousseff comete uma gafe política e constrange os próprios aliados Na Veja O pacote da pré-campanha da ex-ministra Dilma Rousseff é de impressionar.

O PT alugou casas, um comitê, reservou carros, jatinhos, contratou especialistas americanos em internet, jornalistas, institutos de pesquisa, consultores de imagem, fonoaudiólogos e marqueteiros – um aparato de estrela que já está trabalhando, mas que ainda convive com um grande enigma: o desempenho da ex-ministra sem a presença do presidente Lula a seu lado.

Na semana passada, surgiram os primeiros indícios do que está por vir.

Em sua incursão-solo inicial, Dilma escolheu Minas Gerais como cenário para testar seu desempenho.

Seguindo o roteiro convencional dos políticos, a petista colocou crianças no colo, fez promessas a empresários, tomou cafezinho com cidadãos comuns e distribuiu beijos e afagos.

O resultado foi considerado satisfatório.

No palanque e nas entrevistas, territórios em que talvez o eleitor tenha as melhores condições de enxergar seu candidato da maneira como ele realmente é, a ex-ministra causou espanto.

Ao contrário de tudo o que já havia feito, Dilma adotou um discurso agressivo, classificando os opositores como “lobos em pele de cordeiro”, para, logo depois, defender a possibilidade de uma parceria entre ela e o candidato ao governo de Minas Antonio Anastasia, do PSDB – supostamente um dos tais “lobos em pele de cordeiro”.

Longe de ser apenas uma contradição, a declaração da ex-ministra foi uma gafe. “Como houve o Lulécio (comitês de apoio a Lula e Aécio Neves em 2006), é possível que haja a Dilmasia.

Eu acho até melhor a inversão.

Dilmasia é esquisito.

Anastadilma, qualquer coisa assim”, disse a petista, ao ser questionada sobre o fato de alguns aliados já estarem formando fileiras com o PSDB de Minas.

No mundo político, lobos e cordeiros costumam conviver de forma harmoniosa em nome de um interesse comum.

O problema da declaração da ex-ministra é que ela veio no momento em que seu partido é instado a apoiar o ex-ministro Hélio Costa, pré-candidato do PMDB ao governo mineiro e aliado de Dilma.

Costa, é claro, irritou-se e levantou até a hipótese de passar a apoiar José Serra, o presidenciável tucano, criando uma chapa apelidada por ele de “Serrélio”.

Os petistas de Minas, que não querem Hélio Costa nem Anastasia, também se constrangeram com a sugestão da ex-ministra.

Dilma foi reprovada no teste de habilidade.

Também não pegou bem a iniciativa de depositar flores no túmulo de Tancredo Neves, avô do tucano Aécio e cuja candidatura à Presidência da República, em 1985, foi torpedeada pelo PT no antigo Colégio Eleitoral.

O ato foi visto como demagógico e até de mau gosto.

Essa fase da campanha da ex-ministra foi planejada para servir como laboratório.

Quase nada é feito sem um planejamento prévio.

A história do “Anastadilma” ou “Dilmasia” é um exemplo do que pode acontecer quando o roteiro é improvisado. É para evitar armadilhas assim que, antes de a ministra sair às ruas, são testadas situações e pinçados temas que devem estar presentes em seus discursos e declarações.

A linha mestra da campanha, por exemplo, já começou a ganhar contornos definitivos.

Na semana passada, Dilma se reuniu com um cientista político contratado pelo comitê para dar assessoria especial à campanha.

Eles analisaram o resultado de pesquisas qualitativas e quantitativas encomendadas pelo partido sobre o cenário eleitoral.

O diagnóstico numérico mostrou que a petista está próxima de conquistar o terço do eleitorado que historicamente vota no PT.

O tucano José Serra cativou o terço que jamais votou em Lula e não vota em petista.

A disputa propriamente dita, portanto, será travada num universo de aproximadamente 45 milhões de eleitores, que hoje se alinham a outras candidaturas ou, em sua maioria, estão indecisos.

O perfil básico desses brasileiros, segundo a pesquisa, é de gente com pouco acesso à informação, alheia e desinteressada do que se passa no mundo político e que definirá candidato somente após a Copa do Mundo.

Tal contingente de eleitores aprova Lula e o governo.

Teoricamente, seriam eleitores também de Dilma.

As mesmas pesquisas, porém, confirmam que a transferência de voto não é automática.

O desafio é transformar Dilma em uma candidata simpática capaz de atrair esse eleitorado.

Até junho, todos os passos da ex-ministra estarão sendo filmados para, depois, ser analisados por grupos de avaliação.

O tom de voz e as roupas da candidata também passarão pelo crivo de especialistas.

As pesquisas que vão apontar os pontos positivos e negativos da passagem de Dilma por Minas ficarão prontas nesta semana e orientarão as próximas viagens.

O ex-governador José Serra, que anunciou oficialmente sua candidatura à Presidência neste sábado (10), já ajustou o discurso eleitoral.

Ao deixar o governo de São Paulo, até fez menção aos escândalos registrados na seara ética do governo.

Prenúncio de confronto com Lula, como pretendia fazer crer o PT?

Não.

Em público, o tucano elogiou o presidente, a política econômica e os avanços na área social.

Além disso, prometeu dar continuidade às conquistas dos últimos anos e acelerá-las.

Para ministros e líderes do PT, Serra foi habilidoso ao evitar debates sobre diferenças entre as gestões tucana e petista. “O Serra querer ser mais lulista que o Lula é impossível.

Essa tentativa dele de se apresentar como ‘pós-Lula’ é de uma fragilidade imensa”, esbraveja o secretário-geral do PT, o deputado federal José Eduardo Cardozo.

O fato é que a estratégia tucana incomodou os governistas.

E resultou numa reação imediata capitaneada pelo próprio presidente da República.

Logo no início da semana, Lula determinou aos assessores da Esplanada e do Congresso que, sempre que possível, reforcem as diferenças entre os governos do PT e do PSDB – a tal história de que os tucanos são “lobos em pele de cordeiro”.

Para Serra, o bordão é uma “bobagem” sem nenhuma relevância eleitoral. “Se a candidata do PT me atacar dizendo uma verdade, eu aceito.

Se me atacar com uma mentira, vou chamá-la a se explicar.

Agora, esse tipo de coisa, francamente…” Enquanto Dilma fazia seu passeio mineiro, Serra preferiu passar a semana recolhido em sua casa, em São Paulo.

Ele gastou a maior parte desse tempo preparando o lançamento público de sua candidatura.

Serra acredita que, desde seu discurso inaugural, o tom da campanha precisa estar bem colocado.

Por isso, revisou os pontos de sua fala diversas vezes.

Na área econômica, Serra vai defender a necessidade de o país passar por um ajuste fiscal vigoroso, que enxugue os gastos da máquina pública (inclusive desalojando a companheirada petista que foi contratada pelo setor público por indicação meramente política) e possibilite ao governo destinar uma parcela maior do seu orçamento para investimentos diretos em infraestrutura.

No capítulo social, o tucano pretende afirmar que a saúde e a educação estão semiestagnadas, e apresentar propostas pontuais para tirá-las da letargia.

Além disso, o tucano insistirá no tema da segurança pública. “O governo federal não assume sua responsabilidade nessa questão.

A criminalidade brasileira se alimenta do contrabando de armas e drogas que passam livremente pelas fronteiras. É obrigação do governo federal enfrentar essa questão”, diz ele.

Enquanto alinhavava os pontos centrais de seu discurso, o candidato também fazia os últimos ajustes na equipe que o acompanhará nos próximos meses.

Já está definido que o presidente do PSDB, o senador Sérgio Guerra, será o coordenador da campanha.

Outro nome definido é Luiz Gonzalez, jornalista e marqueteiro, responsável pela estratégia de comunicação.

Sobre o assunto mais especulado, seu companheiro de chapa, que será o candidato a vice-presidente, Serra insiste que ainda é prematuro falar sobre nomes. “Essa discussão só vai se encaminhar para uma definição a partir da segunda semana de maio”, diz ele.

Quando o inverno chegar, a temperatura subirá ainda mais.