Julia Duailibi - O Estado de S.Paulo Um dos principais colaboradores de José Serra, pré-candidato do PSDB à Presidência da República, o ex-secretário da Casa Civil Aloysio Nunes Ferreira diz que ética não é uma “plataforma eleitoral”.
O tucano discorda que o discurso de despedida do ex-governador, no qual mencionou “roubalheira”, tenha sido pautado pelo tema e que esse seria um dos motes da campanha do PSDB deste ano. “Não há nenhuma obsessão.
Acredito que a ética é uma forma de vida, uma maneira de ser, não é uma plataforma eleitoral.
Até desconfio do discurso moralista.
Quem o faz está tentando esconder alguma torpeza”, disse Aloysio ao Estado.
Ex-ministro da Justiça de FHC, Aloysio avalia que o eleitor procurará “mudanças incrementais e não de ruptura”.
Com um discurso público alinhado ao de Serra, procura não criticar incisivamente o governo Lula.
Mas diz: “Não somos lobos com pele de cordeiro, somos lobo com pele de lobo.” Aloysio evita traçar cenários sobre a campanha, mas diz acreditar que Aécio Neves (MG) não será o vice.
Questionado sobre as “investidas” da pré-candidata do PT, Dilma Rousseff, em direção ao PSDB mineiro, diz: “Aécio Neves é muito mais esperto do que todos podem imaginar.
Apesar que todos sabem que ele é muito esperto.” E crava: “Aécio está do nosso lado.
Claro que com o estilo dele.” Ex-militante de esquerda, assim como Dilma, Aloysio diz que a pré-candidata do PT é uma mulher “valorosa”. “Será uma candidata forte.
A disputa vai ser dura.” Avalia, no entanto, que tanto ele quanto a petista se equivocaram ao pegar em armas contra a ditadura. “Foi um equívoco”, diz. “Tanto ela quanto eu e outros agimos como nossa consciência ditava na época.” Abaixo a entrevista feita ontem em seu apartamento, em Higienópolis.
O governo Serra em São Paulo foi um ‘‘balão de ensaio’’ para a Presidência da República?
Acho que sim.
As realizações dele como governador, aliadas à lembrança do que pôde fazer como ministro de FHC, sem dúvida nenhuma serão uma credencial para o convencimento do eleitorado, que vai ter nele alguém capaz de realizar coisas que importam para a vida das pessoas e para o País.
Serra saiu do governo dizendo que fez uma gestão ‘‘popular’’.
Isso não é retórica eleitoral?
Popular não quer dizer populista.
Popular significa atender às necessidades do povo.
Conseguiu ser popular, que se reflete na aprovação do governo e na sua intenção de voto.
Ao mesmo tempo, suas ações tiveram impacto na vida das pessoas.
A gestão Lula é ’’ populista’’?
Lula teve a sabedoria de renegar o programa com que o PT vinha se apresentando ao eleitorado ao fazer a Carta aos Brasileiros.
Foi um governo que continuou na esteira reformista do FHC.
Cometeu alguns erros na forma de se organizar e relacionar com o mundo político.
O principal defeito foi o aparelhamento do Estado.
O PMDB, do qual o sr. fez parte, é apontado como a cara do fisiologismo do governo Lula.
Mas PSDB e PT o cortejam por causa do tempo de TV.
Não é só tempo de TV. É um partido de centro, que tem muita capilaridade.
Partido sem o qual dificilmente se governa.
Fisiologia é algo muito disseminado na política brasileira, não é um pecado exclusivo do PMDB.
O PSDB em São Paulo teve que ceder secretarias para aliados.
Governamos com base numa aliança política que surgiu com as eleições.
A única exceção de partido que foi incorporado à gestão foi o PV.
Mas não tivemos em nenhum momento fragmentação da administração em partidos, feudos e capitanias.
Ainda é possível fechar aliança nacional com o PMDB ou os acordos serão regionais, no varejo?
Não sei.
Nós temos em alguns Estados relação clara de incompatibilidade do PT com o PMDB e, em outros, de aliança e proximidade em razão de fatores da política local, que na política brasileira são muito fortes.
Quais as diferenças da eleição de 2010 em relação a 2002 e 2006, quando o PSDB perdeu?
A questão econômica não é mais objeto de disputas fundamentais no terreno da política.
Outra é que Lula não é mais candidato.
O brasileiro comum vê as melhoras como resultado de um processo cumulativo de muito tempo e quer alguém que dê continuidade e agregue coisas novas.
Mudanças incrementais e não de ruptura.
O PSDB melhorou em relação a 2002.
Lá Serra estava muito isolado politicamente.
O PMDB o apoiou com a vice, mas estava em grande parte embarcado na campanha do Lula.
O PFL não apoiou o Serra.
E foi combatido por setores do PSDB.
Num momento, o senador Tasso Jereissati passou a apoiar o candidato Ciro Gomes.
Tivemos problemas internos muito fortes.
Serra trabalhou, desta vez, para diminuir as resistências.
O partido está unido.
Temos uma aliança bastante ampla com o DEM, PPS e PMDB.
Serra tem uma grande plataforma de realizações.
Ele fora de campanha, acossado por aliados e amigos para se declarar candidato e se recusando, está solidamente em primeiro lugar, contra uma candidata que está em campanha aberta há mais de dois anos.
Faz campanha até em túmulo.
O fim da picada.
Dilma corteja o PSDB em Minas para ganhar apoio no Estado, lembrando a união de 2008.
Impossível.
Em 2008 a aliança custou ao PT a Prefeitura de Belo Horizonte.
O governador Aécio Neves é muito mais esperto do que todos podem imaginar.
Apesar que todos sabem que ele é muito esperto.
Isso vale para os dois lados.
Não tenho por que duvidar da lealdade dele.
Ele está absolutamente envolvido até a raiz dos cabelos na campanha do Anastasia, com grande sucesso.
E, na medida que o faz, está plantado do nosso lado, contra o de lá.
Está envolvido até a raiz dos cabelos com a campanha Serra?
Também.
Até por consequência.
Hoje há uma disputa política em Minas evidente.
Aécio está do nosso lado.
Claro que com o estilo dele.
Não é um homem agressivo, é um homem de alianças.
Mas não tenho dúvida nenhuma quanto ao apoio dele à candidatura Serra.
Acha que ele pode ser vice?Acho difícil.
Ele tem dito que se dedicará à política mineira.
O sr. acha, como ele, que o vice tem de ser de outro partido?
Não saberia dizer.
Acho que quanto maior for a chapa, numa eleição majoritária, num País grande como o Brasil, sobretudo numa eleição que o presidente vai ter enfrentar problemas políticos para construir a maioria no Congresso, melhor.
O que o senhor acha de Dilma?
A conheceu quando militou em organizações de esquerda?
A conheci agora na Casa Civil.
Tenho uma boa impressão, mas um contato superficial.
Acho uma mulher valorosa, íntegra.
Será uma candidata forte.
A disputa vai ser dura.
O que acha dos adversários a chamarem de “terrorista”?
Ela lutou contra a ditadura.
Com as armas que tinha, com a concepção que tinha, com as limitações que tinha, e eu também.
A análise política daquele momento nos levou, tanto ela quanto a mim, a uma posição de ultraesquerda.
Equivocada?
Acho que sim.
Foi uma ilusão achar que o povo brasileiro estava pronto para pegar em armas contra a ditadura.
Vendo isso retrospectivamente foi um profundo equívoco, uma análise falsa e subjetivista que nos levou a um grande desastre.
Muita gente morreu.
Tanto ela quanto eu e outros agimos como nossa consciência ditava na época.
Lutar contra a ditadura da forma mais radical possível era uma exigência ética e moral.
Dilma criticou “lobos em pele de cordeiro”, num recado à oposição feita por Serra e pelo PSDB.
Nossa posição é inequivocamente de oposição.
Não somos lobos com pele de cordeiro, somos lobo com pele de lobo.
Queremos ganhar para corrigir o que está errado e dar continuidade ao que pode dar certo.
Isso não confunde o eleitor?
Não, o povo quer isso.
Quer governos que trabalhem.
O partido faz oposição.
Serra fez um discurso de despedida sobre ética.
Esse vai ser um dos motes da campanha?
Serra estruturou o discurso em torno de 25 pontos que são princípios da vida política que pretende seguir.
A ética foi um dos pontos.
Então não há nenhuma obsessão.
A ética é uma forma de vida, uma maneira de ser, não é uma plataforma eleitoral.
Até desconfio do discurso moralista.
Quem o faz está tentando esconder alguma torpeza.
O sr. é candidato ao Senado?
Gostaria de ser.
Agora temos outros postulantes no partido: Mendes Thame, José Aníbal.
Vamos resolver com conversas e buscar um entendimento.
QUEM É É formado pela Faculdade de Direito do Largo de São Francisco da Universidade de São Paulo.
Foi deputado estadual de 1983 a 1991 pelo PMDB, vice-governador de São Paulo (1991 a 1994), no governo de Luiz Antônio Fleury Filho, e deputado federal de 1995 a 2007, pelo PSDB.
Também foi titular do Ministério da Justiça, entre 2001 e 2002, na gestão do tucano Fernando Henrique Cardoso.