Editorial do Jornal do Commercio desta quarta Quando o Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral, composto por 43 entidades públicas e privadas, entregou ao presidente da Câmara, Michel Temer, no final de setembro do ano passado, o projeto de lei que institui a necessidade da ficha limpa para os candidatos a cargos eletivos, esperava-se que a pressão popular, respaldada pelos meios de comunicação, fosse suficiente para conseguir a sua aprovação no curto prazo.
Afinal, mais de 1,3 milhão de assinaturas foram colhidas, com o apoio da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), com o objetivo de proibir a candidatura de indivíduos condenados em primeira instância, ou denunciados por crimes de improbidade, homicídio, racismo, desvio de dinheiro público, uso de mão de obra escrava, tráfico de drogas ou estupro.
Infelizmente, essa expectativa não se cumpriu.
Segundo o primeiro entendimento, para que a nova regra valesse para as eleições deste ano, teria que ter sido aprovada até outubro.
Há quem defenda que não se trata de modificação da lei eleitoral, mas apenas diz respeito à fiscalização sobre as candidaturas, o que tornaria possível a sua aplicação imediata, depois de aprovada.
O deputado Paulo Rubem Santiago, integrante da Frente Parlamentar de Combate à Corrupção, quer colocar o projeto em votação logo na volta do recesso parlamentar, em fevereiro, abrindo a possibilidade de uma pressão maior por parte da opinião pública.
A inelegibilidade de políticos com ficha suja atende ao clamor da sociedade por uma política limpa, que seja exercida por mulheres e homens cuja vida pregressa, pelo menos, não aponte qualquer indício de envolvimento criminoso ou em casos de corrupção.
A resistência dos deputados em colocar o projeto em pauta diz muito sobre a composição atual do Congresso, manchado por denúncias em cascata que fizeram, somente na última década, com que os brasileiros associassem o Parlamento a uma casa de muitos vícios e poucas virtudes – e não sem fundamento: 152 congressistas respondem a processos no Supremo Tribunal Federal (STF).
No centro da polêmica sobre os fichas sujas está ainda a alegação do “julgamento antecipado” pela presunção do crime denunciado.
Ao discursar contra o projeto que o afetaria – devido ao caso do mensalão do governo Lula – o deputado José Genoíno disse que “o princípio universal consagra: o cidadão só pode ser condenado com sentença transitada em julgado”, ou seja, sentença definitiva.
O problema é que a lentidão dos processos no País perpetua os maus políticos no serviço público, mesmo com dezenas de pendências com a Justiça.
Antes de poder ser considerado antecipação de pena, a proposta representa medida preventiva em favor da coletividade. “Com o Ficha Limpa, o indivíduo não é privado da liberdade.
Ele é privado do direito de exercer representação política”, esclarece Paulo Rubem. É verdade que o mesmo eleitor que mantém os corruptos e criminosos na ativa, contribui para lançar a credibilidade dos políticos no fundo do poço.
Assim, a existência de lei em favor dos fichas limpas teria um caráter igualmente educativo: poderia fazer com que o eleitor fosse mais rigoroso na escolha de seus representantes.
O rigor pode começar na apresentação dos nomes ao Tribunal Superior Eleitoral: a Associação de Magistrados do Brasil (AMB) irá propor a obrigatoriedade da declaração, pelos candidatos, no registro das candidaturas, dos processos a que respondem, a exemplo do que ocorre em relação à declaração de bens. “Nós não podemos falar em democracia e em Estado Democrático de Direito sem a informação.
A sociedade tem o direito de ter informação sobre os homens públicos”, declarou em entrevista ao JC o presidente da AMB, Mozart Valadares.
Acreditamos que a luta contra a corrupção e a impunidade passa pela vigência de um ambiente democrático arejado pela transparência, onde o cidadão disponha de todos os dados acerca dos postulantes à vida pública – bem como daqueles que já estão dentro dela.
Somente deste modo teremos esperança nas boas intenções de políticos de nome limpo, e compromisso real com o bem comum.