Por Edilson Silva Caros Flávio Brayner e João Simão, recebi, a partir de vários contatos na grande rede, documentos escritos por vocês sobre os problemas que vêm acontecendo na secretaria de Educação da PCR.
Os documentos são endereçados originalmente aos educadores do Recife e ao prefeito João da Costa, respectivamente, mas foram postados de forma ampla, razão pela qual deve ter chegado até mim.
Tamanha a importância daquilo que escreveram, tomo a liberdade de dialogar publicamente com o honesto sentimento expresso por vocês.
Há, segundo o que vocês escreveram, um processo de involução na gestão da área educacional da PCR.
O prefeito João da Costa teria colocado um profissional da área de saúde à frente da secretaria de Educação e, mais grave, um secretário com fortes traços autoritários e burocráticos, traços que contaminaram o ambiente político da secretaria e o próprio projeto político-pedagógico em sua dimensão maior.
Convênios da secretaria com a Fundação Roberto Marinho e Instituto Ayrton Senna, assim como a suspensão do processo de escolha direta de diretores de escolas estão entre os sintomas destacados. É realmente lamentável que isto esteja acontecendo, sobretudo quando sabemos do esforço intelectual e militante feito por décadas por militantes petistas, do meio acadêmico e também popular, que atuam na área de educação, no sentido de acumular conhecimentos teóricos, programáticos e práticos.
Mas, ao mesmo tempo em que lamento, permitam-me dizer que não me surpreendo.
Como “ensina” o próprio presidente Lula, em uma de suas muitas analogias: “transatlântico não dá cavalo-de-pau e nem faz curva fechada”.
As mudanças de direção em algo tão grande só se dão lentamente.
Ou seja, o secretário autoritário e burocrático não é um ponto fora do quadrante político onde sempre se desenvolveram as ações estratégicas da gestão petista à frente da PCR.
O estranhamento da tripulação da secretaria, da qual vocês faziam parte, talvez tenha se dado por conta do aumento abrupto da velocidade imposto pelo novo comandante, mas o rumo está estruturalmente inalterado.
Que reação relevante está havendo nas comunidades escolares contra esta suposta troca de projeto?
Que reação contra a não realização de eleição direta para diretores?
Que reação no sindicato dos professores ou dos servidores?
Que reação de parlamentares na Câmara contra tudo isto?
A reação, ao que tudo indica, infelizmente, é de vocês e mais alguns.
Uma reação absolutamente importante e valorosa, mas que revela que em mais de oito anos de gestão petista na PCR não se construiu minimamente uma cultura de participação popular, mas uma cultura de submissão e politicagem.
Como aceitar que em oito anos de gestão petista não tenha se tornado Lei Municipal que a própria gestão da Secretaria de Educação, esta especificamente por ter acúmulo histórico de participação popular, fosse fruto da intervenção direta dos servidores de carreira e da comunidade escolar, articulados em conferências e plenárias regulares?
Isto é inaceitável num governo que se proponha radicalmente democrático e realmente popular.
A grande obra de um governo popular deve ir muito além de cuidar das pessoas, mas conseguir tirar-lhes as amarras que as impedem de serem protagonistas de seus próprios destinos.
Não é exagero afirmar que houve desacumulação nos aspectos de controle social popular na cidade do Recife na última década.
Há dez anos, fosse o prefeito Roberto Magalhães abortar um processo de eleição direta nas escolas municipais e o tema viraria pauta política na cidade.
Hoje, não mais.
Esta proeza foi alcançada com mecanismos perversos embutidos dentro da excelente idéia do Orçamento Participativo, que se transformou em Recife num balcão de troca de favores entre cabos eleitorais e vereadores, em que obras de fato votadas pela população simplesmente não foram executadas.
Foi alcançada com a soberba do prefeito anterior passando por cima da cidade ao impor um parque de dezenas de milhões de Reais, inaugurado ainda inacabado e que até hoje se encontra inconcluso, o seu Taj Mahal.
Foi alcançado transformando diretores de escolas também em cabos eleitorais e dirigentes sindicais em aliados domesticados.
Os exemplos são quase infinitos.
A pouca democracia participativa existente em Recife foi pisoteada, lideranças genuínas foram desmoralizadas, sonhos coletivos foram despedaçados.
Portanto, o atual secretário de Educação da cidade do Recife, assim como tudo o que faz e representa, é um subproduto previsível dentro do modus operandi das gestões petistas até aqui. É uma das opções gerenciais possíveis dentro da lógica produtivista e fria das planilhas, que trata alunos, na essência, como números e estatísticas somente, “por cabeça”.
O rompimento de vocês com o atual secretário é um sinal muito positivo, de que é possível e preciso reorganizar as forças de esquerda, populares e democráticas, em torno de um projeto global alternativo de gestão da sociedade e do Estado.
Que a experiência nos sirva, a todos, de ensinamento para avançarmos nesta direção.
PS: Edilson (www.twitter.com/EdilsonPSOL) é presidente do PSOL-PE e pré-candidato ao governo de Pernambuco.
Flávio Brayner é ex-secretário adjunto de Educação da PCR e João Simão é educador e militante do PT.