Editorial do Jornal do Commercio desta segunda A ideia de saneamento e saúde tem a mesma raiz.
Por isso se afirma, com dados estatísticos, que para cada R$ 1 investido em saneamento são economizados R$ 4 em saúde.
Uma relação simples que não deveria deixar dúvida sobre a definição de prioridades em políticas públicas.
E, no entanto, a relação não é assim tão simples.
Metade da população brasileira não tem acesso a esgotamento sanitário e apenas um terço dos esgotos recebe o tratamento adequado.
O resto, a maior parte, é despejada a céu aberto – formando cloacas urbanas –, nos rios e nas praias.
O que isso representa pode ser testemunhado a qualquer hora do dia nas áreas mais carentes do Recife, nas praias ou no baixíssimo nível de oxigênio dos nossos rios, resultado dos despejos domésticos e industriais.
Essa questão é fundamental para nos situar no cenário internacional, hoje tão recorrido em face do bom desempenho do País quando o mundo inteiro se viu envolvido na tremenda crise da economia.
Sim, é verdade, fizemos uma boa figura, mas quando nos voltamos para o essencial, o nível de atendimento básico do nosso povo, o resultado é o rubor da vergonha: estamos, em matéria de saneamento básico, ao lado das nações mais atrasadas do mundo, como Bangladesh.
Não dá para nos afirmar como nação emergente e diferenciada enquanto não sairmos desse posto no ranking mundial.
E essa, já se sabe, é uma tarefa extraordinariamente complexa.
Basta ver, conforme dados divulgados recentemente, que metade dos brasileiros não dispõe de serviços de esgotos sanitários e levaremos mais de 60 anos para universalizar esses serviços, como preconiza a Constituição Federal.
De 2007 até hoje o governo só aplicou 11% dos R$ 12,6 bilhões reservados no Orçamento da União para programas de saneamento.
Dos R$ 8 bilhões do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), destinados a esse fim desde 2003, apenas 35% foram usados.
Foi essa constatação que levou o presidente Lula a dizer, em evento recente realizado no Maranhão, que vai lutar para tirar o povo brasileiro de uma situação que ele resumiu em uma só e chula palavra.
Se a relação entre saneamento e saúde é tão evidente, tantos e notáveis resultados decorrem desses serviços públicos – como a queda na mortalidade infantil e a melhoria de todos os índices de saúde – a que se atribuir essa resistência, ou incapacidade, de se aplicar políticas públicas de forma a dotar as populações do que foi alardeado com tanta ênfase na 8ª Feira Internacional de Tecnologia de Saneamento realizada no Recife em setembro do ano passado?
Mais: por que não escandaliza o percentual de 21% dos pernambucanos servidos de esgotos sanitários?
Parte das respostas para essas questões é mais simples que a complexidade do problema.
Pode-se associar o descompasso e a carência de saneamento, entre outros desvios, à atenção que nossa elite dirigente dá, por exemplo, a gastos com obras suntuosas ou em festas, como está sendo amplamente divulgado nas últimas semanas aqui mesmo no Recife, quase sempre envolvendo pouca transparência na aplicação de recursos públicos.
Por que, assim, nossa elite dirigente não chama atenção como um grande escândalo histórico o fato de apenas 30% dos 220 quilômetros quadrados do Recife terem rede pública de esgotos?
O resultado é evidenciado num simples lance de olhos para qualquer área da cidade onde não exista um sistema de esgotos.
Os despejos vão para fossas individuais, para ligações diretas com o sistema de drenagem ou, simplesmente, jogados nas ruas, nos rios, nos canais, criando as condições ideais de insalubridade, de proliferação de insetos e ratos, com as consequências evidentes que geram doenças, enchem os hospitais e reduzem a expectativa de vida de nossa população.
Daí a conclusão da organização Trata Brasil, que resume e acende a luz vermelha para um problema de tamanha gravidade: “A agenda do saneamento básico no Brasil é vergonhosa”.