Deu no Estadão Nos próximos cinco anos, o Brasil deve reduzir o número de miseráveis pela metade e aumentar em 50% as classes A e B.

A projeção é de Marcelo Neri, diretor do Centro de Políticas Sociais, da Fundação Getúlio Vargas (FGV).

Conforme sua estimativa, no início de 2015, os pobres serão apenas 8% dos brasileiros, caindo para quase um quarto da proporção que vigorava em 1993, de 35%.

Em pouco mais de duas décadas (1993-2005), um contingente de 51,6 milhões de brasileiros muito pobres, numa população de 147 milhões, será reduzido para 16,1 milhões, em 222 milhões - ou seja, uma queda de quase 70% em termos absolutos, mesmo levando-se em conta o aumento populacional.

A linha de pobreza utilizada por Neri corresponde a uma renda per capita familiar de R$ 137 na média do Brasil (a linha varia de acordo com a região).

Nesse conceito, que representa uma linha de pobreza relativamente baixa (alguns consideram que seja uma linha de extrema pobreza), os pobres correspondem exatamente à classe E.

Neri diz que aquele é um cenário “auspicioso”, ou de “otimismo condicionado à manutenção das políticas razoáveis aplicadas entre 2003 e 2008”.

Mas não julga a projeção nem um pouco improvável.

Na verdade, baseia-se na hipótese de que a fase que ele chama de “era de ouro” dos avanços sociais no Brasil, de 2003 a 2008 (ou de 2001 a 2008, quando se toma a desigualdade) prolongue-se por mais cinco anos, depois de um momento de estagnação em 2009, em função da crise global.

Entre 2003 e 2008, 32 milhões de brasileiros ascenderam às classes A, B e C, e 19,3 milhões saíram da pobreza, provocando uma redução de 43% na proporção de pobres.

O consumo popular cresceu e fortaleceu o mercado interno.

De maneira análoga, Neri projeta um crescimento médio anual de 5,26% da renda total familiar per capita (medida pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, Pnad) no quinquênio 2010-2014, repetindo-se o desempenho do indicador entre 2003 e 2008.

Simultaneamente, ele supõe que a queda da desigualdade verificada de 2001 a 2008 prossiga até 2015, levando os índices brasileiros para o nível atual do Espírito Santo.

Com base na Pnad de 2008, o índice de Gini da renda familiar per capita do Brasil em 2008 era de 0,5486, comparado a 0,518 do Espírito Santo.

Em 2003, o Gini brasileiro era de 0,583.

Segundo Neri, a projeção de queda do índice nacional até 2015 para o nível atual do Espírito Santo “é até conservadora, porque seria uma redução um pouco menor do que a ocorrida de 2003 a 2008”.

O Gini é um indicador de desigualdade que varia de zero a 1, e indica piores distribuições à medida que vai aumentando.

As projeções apontam uma profunda mudança no perfil social do Brasil, que caminharia para se tornar um país de classe média.

Se à classe E for acrescentada a classe D, que também está próxima à pobreza, chega-se a uma proporção da população de 40% em 2008, que deve cair para 28% no início de 2015.

Já a classe C, correspondente à classe média popular, cresce de 49% para 56,5%, tornando-a a maioria absoluta do população.

As classes A e B, finalmente, sobem de 10,5% para 15,7%.

Assim, a classe média como um todo, que hoje já corresponde a pouco mais de 60%, incluindo-se a classe C, sobe para 72%.

O otimismo de Neri apoia-se em algumas evidências de que a melhora social brasileira no período 2003-2008 tem fundamentos sólidos.

Ele nota que, nesse período, enquanto a renda média de todas as fontes cresceu em média 5,26%, a renda do trabalho teve uma expansão anual de 5,13%.

Em outras palavras, a ideia de que o aumento real das transferências sociais e previdenciárias é um fator muito mais importante do que os demais na melhora da renda dos pobres não se sustenta, já que, se fosse assim, a renda do trabalho deveria ser inferior ao crescimento da renda total.

O pesquisador nota ainda que, no Nordeste, região cujo avanço social é visto como fruto de políticas assistencialistas, a renda do trabalho subiu uma média anual de 7,3%. “Talvez haja mais sustentabilidade na expansão nordestina do que nas ideias daqueles que imaginam que há na região uma nova economia sem produção”, ironiza.

Em relação à queda da desigualdade, o economista frisa a importância do avanço da educação nas melhoras da distribuição de renda entre 2001 e 2008, e acha que a tendência pode se estender para os próximos anos.

Em 1990, 15% das crianças brasileiras na idade do ensino fundamental estavam fora da escola, número que caiu para menos de 4% em 2001 e para menos de 2,5% recentemente.

Para Neri, o aumento da escolarização teve impacto positivo no crescimento da renda do trabalho dos pobres, explicando em parte por que, entre 2001 e 2008, a renda média dos 10% mais pobres aumentou 72,45% em termos reais, enquanto que a dos 10% mais ricos teve ganho real de apenas 11,37%.

Neri acha que a escolaridade média da força de trabalho continuará aumentando. “Isso permite antecipar melhoras futuras da desigualdade”.

Quanto à qualidade da educação, ele diz que segue um grande problema, mas que está sendo implantado um sistema com avaliações e metas por escola, o que sinaliza que pode haver avanços.