Da Agência Estado O governo do Distrito Federal abasteceu nos últimos três anos, sem licitação, com pelo menos R$ 14,4 milhões, uma produtora que fez programas para o diretório do DEM em Brasília nesse período e cuidou da campanha do governador José Roberto Arruda em 2006.

A forma de pagamento mimetiza o esquema conhecido como “valerioduto”, no qual empresas-mãe com gordos contratos com o governo repassavam dinheiro para integrantes do grupo político mediante subcontratações.

O caminho do dinheiro é mensal, tortuoso e discreto.

Cai primeiro na conta das empresas contratadas oficialmente para cuidar da publicidade do governo.

Depois, é transferido para a AB Produções, do empresário Abdon Bucar.

Esse repasse não aparece nas notas de empenho.

Surge apenas em ordens bancárias que chegam a ultrapassar R$ 200 mil por serviço prestado.

Num encontro em 2006 com Durval Barbosa, ex-secretário de Relações Institucionais do governo de Arruda, Abdon Bucar admite que fez acordo para receber por caixa dois na campanha.

Nessa conversa, gravada em vídeo por Barbosa, o dono da AB Produções reclama de um contrato não honrado de R$ 750 mil “com o PFL” - nome antigo do DEM- e de R$ 1 milhão que teriam caído em sua conta sem qualquer explicação.

Ele chega a falar em “esquentar” nota fiscal, expressão usada para “legalizar” dinheiro não declarado.

Meses depois desse encontro, Arruda já era governador.

No dia 23 de março de 2007, a AB Produções recebeu R$ 417 mil dos cofres do governo.

O dinheiro foi repassado pela RC Comunicação Ltda, uma das três empresas que detinham contrato de publicidade.

Naquele ano, R$ 3,5 milhões foram transferidos para a AB, com a contribuição também da Stylus Comunicação e da Branez, segundo levantamento feito pela assessoria do deputado Chico Leite (PT), a pedido do Estado, no sistema de despesas do governo, acessado apenas por parlamentares.

Em depoimento à Polícia Federal, Durval Barbosa disse que a AB Produções foi quem alugou a chamada “Casa dos Artistas”, o quartel general da campanha de Arruda num bairro nobre de Brasília, onde eram produzidos programas eleitorais.

Segundo Barbosa, que confessou o esquema em troca de delação premiada, R$ 12 milhões foram gastos na casa.

Em 2008, no segundo ano da gestão de Arruda, a publicidade do governo passou para as mãos de outras três empresas: AV Comunicação, Agnelo Pacheco e Dupla Criação.

A prática de “subcontratar” a AB Produções continuou.

Juntas, repassaram R$ 4,5 milhões para a empresa de Abdon Bucar.

Entre 2007 e 2008, a AB prestou serviços para o diretório regional do DEM, presidido pelo vice-governador Paulo Octávio, e que tinha Arruda na presidência de honra.

Algumas gravações realizadas nem foram ao ar, entre elas uma com o senador Adelmir Santana (DEM-DF).

Nas prestações de contas do diretório à Justiça Eleitoral, não há referências a despesas com a AB.

A manobra do governo Arruda de usar a publicidade de maneira suspeita remete à métodos do chamado “valerioduto”, esquema em que os governos federal e de Minas Gerais usaram contratos de propaganda com empresário Marcos Valério para arrecadar recursos de maneira ilícita.

Os números do DF revelam que os repasses à produtora AB Produções dobraram entre 2007 e 2009.

Neste ano, o valor já chega a R$ 6,1 milhões.

Uma nota fiscal de R$ 384 mil foi emitida no dia 10 de junho passado pela AV Comunicação em nome da AB Produções.