Por Edilson Silva Há mais um fenômeno rodeado de profunda hipocrisia se instalando na sociedade brasileira.

As paradas da diversidade espalham-se pelo país como micaretas nas principais cidades.

A cada ano reúnem mais e mais participantes.

Transmissões via rádio, TV e internet ao vivo, promoções em redes de hotéis, pacotes turísticos, etc.

Recife está nesta dinâmica.

Em meio a milhões de gays, lésbicas, bissexuais, transexuais, transgêneros e travestis foliões em todo o país, políticos transitam acenando e apoiando a diversidade.

A sensação é de liberdade, de tolerância, de respeito aos direitos civis da população não-heterossexual.

Nada mais epidérmico e falso.

Enquanto as paradas da diversidade se espalham pelo país, gerando lucros para a indústria do turismo e empilhando votos para políticos e partidos oportunistas, a homofobia também se espalha nos espaços institucionais e se amplia na consciência popular.

Em meio a muito axé-music e techno, os organizadores da parada da diversidade do Recife realizada no último domingo exigiam a criminalização da homofobia.

Nada mais justo.

O problema é que estes ativistas, acredito eu, ainda não deram uma olhada na pauta que está sendo aprovada no Congresso Nacional.

O PT, por exemplo, que apóia a Parada aqui em Recife e em todo lugar, não vacilou em selar acordo com o Vaticano, aprovado na Câmara dos Deputados há poucos dias, reinserindo o ensino religioso nas redes oficiais de ensino e criando benefícios para entidades religiosas atuarem na esfera da educação.

Quem fez oposição de peso a este projeto foi a bancada dos evangélicos.

Queriam a defesa de um estado laico¿ Claro que não.

Queriam era o direito de também ensinar seus pontos de vista e seu ideário.

Conseguiram.

Detalhe relevante: para muitos destes vitoriosos a homossexualidade é uma doença ou manifestação demoníaca.

Não se viu no dia da aprovação deste projeto a manifestação sequer de pequena parcela organizada da militância LGBTT.

O único partido que protestou e reprovou o retrocesso foi o PSOL, na posição firme expressa pelo deputado fluminense Chico Alencar.

Mas a homofobia não desfila lépida e fagueira apenas no plenário da Câmara Federal.

Na última parada da diversidade em São Paulo, um jovem homossexual foi espancado até a morte.

Um cinegrafista amador registrou as cenas revoltantes.

Enquanto ele estava sendo linchado, cerca de 2 milhões de foliões suavam seus corpos deliciosamente embalados por muita música.

Dias depois, no protesto contra o crime homofóbico cometido na própria parada, pouco mais de 20 pessoas. É isso mesmo: 20 pessoas!

Em Recife, além da violência que agride fisicamente e psicologicamente a população LGBTT, recentemente um tradicional ponto de concentração desta comunidade foi violentamente reprimido e fechado.

A lanchonete, localizada nos fundos do Shopping Boa Vista, foi lacrada por supostamente vender bebidas alcoólicas a menores de 18 anos.

Na verdade, aqueles que lucram com o shopping não queriam aquela população ali, homossexuais, em sua maioria pobres, “desqualificando” o seu ponto.

Alguma mobilização de peso contra esta agressão¿ Não vi.

Estes episódios e esta conjuntura podem estar consolidando as paradas da diversidade como guetos organizados, momentos excepcionais em que a sociedade tolera a existência da população não-heterossexual. É como um carnaval, como as Virgens de Olinda ou do Bairro Novo, uma fantasia, que dura um dia e depois fica guardada no armário o resto do ano.

As entidades que contribuem na organização e mobilização da população LGBTT devem estar mais atentas a estes paradoxos.

A comunidade LGBTT não pode ser vista apenas como bons consumidores, portadores de apetitosos cartões de crédito, capazes de lotar hotéis e mesas de restaurantes, ou vista apenas como um curral eleitoral.

As paradas são importantes sim, mas os plenos Direitos Civis e Humanos desta comunidade vão mais além.

Muito mais.

PS: Edilson é presidente do PSOL-PE e escreve para o Blog semanalmente.