Cerco às pesquisas O SENADO não parece satisfeito com os espetáculos de desmoralização institucional que tem encenado neste ano. É o que evidenciam as votações das normas eleitorais para 2010, cujo texto básico, já eivado de disparates, precisa voltar à Câmara e ser aprovado até 2 de outubro.
Um misto de ignorância, corporativismo e espírito antidemocrático preside os trabalhos, que chegaram ao ápice da desorganização na noite de quarta-feira, quando foi aprovada a proposta do senador Marcelo Crivella (PRB-RJ) para regulamentar as pesquisas de intenção de voto.
Na confusa sessão, o congressista fluminense conseguiu consagrar a espantosa ideia de estabelecer em lei a metodologia a ser adotada pelos diversos institutos.
E o fez do alto de seu desconhecimento a respeito do tema.
Pretende a emenda Crivella que a amostra das pesquisas -ou seja, a reprodução em menor escala do universo maior de eleitores- se baseie em dados relativos a sexo, idade, grau de instrução e nível econômico reunidos exclusivamente pelo IBGE.
Os institutos já utilizam esse acervo estatístico, mas não podem ficar limitados a ele.
O IBGE realiza censos a cada dez anos -e os dados reunidos referem-se ao total da população, não ao eleitorado.
Anualmente, as estatísticas são atualizadas, mas só as de Estados e regiões metropolitanas.
No que se refere a municípios, como São Paulo, Rio ou Belo Horizonte, o que se tem são os dados do censo.
A prevalecer a proposta do Senado, as pesquisas terão de se basear em estatísticas defasadas, relativas ao ano 2000.
Para contornar o problema, os institutos costumam utilizar, entre outras bases de dados, informações coletadas pelo Tribunal Superior Eleitoral.
Elas representam o universo dos eleitores e são mais atualizadas.
Em meados do ano eleitoral, quando as inscrições se encerram, o TSE tem dados precisos sobre os cidadãos aptos a votar.
Entende-se a frustração do senador Crivella ao ser ultrapassado pelo candidato Fernando Gabeira na corrida para o segundo turno da última eleição para governador do Rio -fenômeno antecipado pelo Datafolha.
Mas ela está dirigida para o alvo errado.
Se o Senado pretende evitar o risco de pesquisas “piratas”, baseadas em metodologias impróprias, o melhor a fazer é propor que a atual legislação, que se revelou adequada, passe a vigorar não apenas em anos eleitorais.
Deveria valer para qualquer ocasião a norma de fornecer à Justiça Eleitoral informações sobre quem contratou a pesquisa, a metodologia, o valor e a origem dos recursos, entre outros itens exigidos pela lei.
Esse seria um passo importante para evitar o surgimento de dados “surpreendentes”, em geral de interesse de políticos, a respeito dos quais a sociedade não tem informação nem garantia.
Na mesma linha, mas na esfera da autorregulação, seria interessante que os institutos publicassem a íntegra das sondagens na internet -possibilitando a consulta de bases estatísticas e questionários aplicados.
Ainda há tempo para que o bom senso prevaleça e a inadequada emenda Crivella seja derrubada no Congresso.