Editorial do JC desta segunda-feira O Senado acaba de nos deixar mais uma lição, pouco educativa, é verdade, mas que pode se transformar num símbolo interessante - como já começa a acontecer - no processo de depuração da atividade política, principalmente.

Ao transpor do campo de futebol para a tribuna a punição da transgressão de uma norma através de um cartão vermelho, o senador Eduardo Suplicy, do PT de São Paulo, gerou mais um capítulo de desgaste daquela Casa e criou um tipo, um instrumento capaz de externar a indignação, individual ou coletiva, como aconteceu com os caras-pintadas que foram às ruas para exigir a saída de um presidente da República do poder.

Se o presidente do Senado vai entregar o cargo, ou não vai, deixou de ser o fundamental, mesmo quando desse ato dependerá o funcionamento do Senado.

O que importa é a resposta que deve ser dada por toda classe política a esse gesto até agora limitado aos campos de futebol e que representa, na atividade pública, uma punição bem mais grave.

Como foi visto em mais um bate-boca que terminou com o cartão vermelho sendo atribuído ao presidente Lula e até devolvido a Suplicy, tornando-se, a partir de então, motivo de galhofa, de ridicularização, como se fosse pouco o desgaste a que tem sido submetido o Senado.

Mas ao ser estendido a toda classe política como um símbolo visual de cobrança, o cartão vermelho presta-se à execução de um bom serviço e com certeza chegará ao horário gratuito de propaganda eleitoral, pelo que se exigirá do eleitorado uma atenção mais rigorosa.

Porque não vale apenas mostrá-lo a um ou outro político, valendo-se da força que ele exerce numa partida de futebol, onde se pune a agressão física e só eventualmente a agressão moral quando, por exemplo, o atleta agride o árbitro com palavras.

No campo social, o potencial punitivo do cartão vermelho é bem mais amplo, porque trata dos aspectos ético e moral, com infinitas possibilidades.

Assim, por exemplo, tanto cabe cartão vermelho para o político que violenta o decoro parlamentar ou se apropria de recursos públicos - simplificadamente, que rouba o dinheiro do povo - quanto para o servidor público que exorbita de sua autoridade e prejudica o cidadão ou a cidadã por ação ou omissão.

Pode ser aplicado, desta forma, ao detentor de um mandato que pratica o nepotismo por ter acesso e domínio do aparelho administrativo, como ao agente público que negligência no atendimento a um paciente em um hospital ou deixa penando atrás das grades pessoas inocentes ou que perderam a liberdade por incúria do serviço público.

Raposas que são, alguns políticos vêm levando ao ridículo o gesto teatral e pouco comum do senador Suplicy.

De tão inusitado, sequer bate com o tipo, a personalidade dele, tão tímido e recatado que é, sujeitar-se a um confronto que lhe tirou a serenidade e o fez perder-se num matraquear de palavras sem sentido.

Apenas mais um episódio que diminuiu o Senado como instituição simbólica dos “pais da pátria”, na tradição romana, como sempre lembra um dos senadores, exatamente o que presidia os trabalhos na hora do cartão vermelho, o representante do Piauí, Mão Santa.

Ali ficou evidente a prevalência do cartão punitivo sobre o símbolo da sabedoria dos senadores romanos.

Apesar dessa tentativa, porém, o gesto poderá ser apropriado por um segmento que no passado teve sucesso com outros símbolos.

São os jovens que com frequência tomam as ruas fazendo história, como tem acontecido em quase todo mundo, com data marcada, 1968, quando saíram do casulo e tiraram um herói francês do poder.

Aconteceu também no Brasil e uma velha lição diz que a história se repete, como tragédia ou farsa.