Por Augusto Coutinho O senado colombiano aprovou, semana passada, a proposta de referendo que poderá dar um terceiro mandato ao presidente Álvaro Uribe.

O projeto ainda será apreciado pela Câmara dos Representantes e, em seguida, pela Corte Constitucional.

Uribe tem quase 70% de índice de aprovação nas pesquisas e é muito provável que consiga ganhar mais quatro anos à frente do executivo daquele país.

A oposição fala em golpe na constituição.

Mas não tem força para barrar o projeto em nenhuma das instâncias a que será submetido. É muito provável, inclusive, que Uribe vença o referendo, como aconteceu em 2006, e, em seguida, a eleição presidencial.

O referendo de Uribe é mais uma aberração antidemocrática que, infelizmente, se alastra pela América Latina.

E que tem inúmeros adeptos aqui no Brasil: uma ainda pequena - mas afoita - turma de deputados, a maioria do baixo clero, doida para bajular o presidente, foi não foi ameaça propor a PEC do terceiro mandato.

Felizmente, pelo menos até agora, parece que Lula não quer bancar Hugo Chávez e tem dito que não defende a tese.

Até agora, repita-se.

Um dos princípios mais básicos da democracia é a alternância no poder.

Alternância que, se entenda bem, tanto é de nomes como de partidos.

Mas é normal nas democracias mais sólidas que um mesmo partido, ou grupo político, se mantenha no poder durante vários mandatos.

Um partido, nunca uma pessoa.

O caso mais emblemático, para o qual sempre se olha, e se deve olhar, são os Estados Unidos.

Foi lá, o berço do presidencialismo, onde também nasceu a reeleição dos presidentes. É de lá também o exemplo mais gritante de que reeleição é justa, perpetuação no poder, não.

Até Franklin Delano Roosevelt, um presidente americano poderia concorrer indefinidamente à reeleição.

Foi o que aconteceu com ele.

Eleito durante a grande depressão da década de 30, Roosevelt, que conseguiu revertê-la, elegeu-se presidente por quatro mandatos consecutivos – 1933 a 1945.

Morreu no cargo.

Foi e é até hoje um dos maiores ícones americanos, um dos mais respeitados presidentes daquele país.

Venceu a crise econômica e a segunda guerra mundial, ao lado de Inglaterra, França, URSS e os demais países aliados.

Foi um dos maiores responsáveis por fazer dos Estados unidos a grande potência que é até hoje.

Conseguir também ser o primeiro presidente a exercer mais de dois mandatos.

Será para sempre o único.

Apesar das grandes conquistas de Roosevelt, da sua importância, os americanos entenderam que não faz bem à democracia a perpetuação de uma única pessoa no poder.

Logo após a morte de Roosevelt, foi aprovada a 22ª emenda, que só permite ao presidente uma reeleição.

Sou favorável a isso.

Uma reeleição é justa.

Quatro anos é pouco para a implementação de um projeto para um país.

Oito anos é um bom período de tempo para uma pessoa capitanear a implantação deste projeto.

Por melhor que seja, no entanto, a sua manutenção no poder é prejudicial.

Vicia o cargo, o sistema e, sobretudo, quem exerce o poder.

O que querem Chávez, Uribe, e tantos outros por aqui, não é uma questão apenas de golpe constitucional.

Há maneiras legítimas de se mudar uma constituição.

E isso deve ser feito sempre que ela não responder mais à realidade política, social e econômica de um país.

O terceiro mandato é, na verdade, como já disse, um golpe na democracia.

Na Venezuela, ela, a democracia, já quase não existe mais.

Na Colômbia, não é bem o caso.

Mas a aprovação do projeto de Uribe é um perigoso passo para uma solução venezuelana naquele país.

Tentações de perpetuação no poder existem e sempre existirão.

Algumas são mais explícitas, como nas ditaduras.

Outras, mais sutis, que tentam se justificar como democráticas, são também as mais perigosas.

A doença chaveana que se alastra na América do Sul precisa ser combatida.

Além de qualquer jogo legal, que legitime juridicamente projetos pessoais, está a democracia.

Os seus princípios, as suas bases são as grandes bandeiras que se deve defender.

As constituições devem seguir estes princípios para serem de fato democráticas.

Toda ditadura teve uma constituição, por exemplo.

Alegar ser legítima uma mudança constitucional que justifique um atentado aos princípios da democracia é golpismo.

Chávez e Uribe já deram o passo perigoso.

Que Lula tente ou deixe que tentem fazer o mesmo é o que não podermos permitir.

Deputado Augusto Coutinho (DEM), líder da oposição na Assembleia Legislativa de Pernambuco