Editorial do Jornal do Commercio desta segunda O resultado da investigação do Ministério Público de Pernambuco sobre o treinamento dos alunos da PM causa impacto e até certo ponto preocupa.
O impacto se dá desde o primeiro momento, porque constata um provável despreparo de três mil novos policiais nas ruas.
Autoridades da área de segurança não teriam considerado a recomendação de adiar o início de atividades desses novos policiais porque, para a Secretaria de Defesa Social, o treinamento atendeu às normas da Secretaria Nacional de Segurança Pública e o pessoal que está chegando às ruas tem o preparo suficiente para oferecer mais segurança aos pernambucanos.
Esse é um tema recorrente ao qual não gostaríamos de estar retornando, mas é inevitável pelo que repercute na vida de todos nós, a todo instante.
Quando o Ministério Público questiona a qualidade do curso que está sendo ministrado para a formação de novos policiais, nos remete a uma questão complexa que diz respeito a muito mais que três mil novos agentes de segurança pública que entram em ação.
Aliás, promessa cumprida pelo governador Eduardo Campos.
Teoricamente, seria um reforço extraordinário, capaz de contribuir substancialmente para o avanço da política pública de segurança.
Na prática, pode até refletir nas estatísticas do Pacto pela Vida com que o governo vem tentando enfrentar um dos mais graves problemas de nosso Estado, como é visto, inclusive, nas estatísticas federais e nas investigações internacionais, como a que foi realizada pelas Nações Unidas no final de 2007 e divulgada em 2008, dando a Pernambuco um destaque indesejável.
Números, diga-se, computados de gestões anteriores.
O relatório da ONU, mostrava um cenário sombrio particularmente no Rio, em São Paulo e Pernambuco, onde o autor da pesquisa, Phillip Alston, entendeu que havia esquadrões da morte formados por policiais.
E mais disse o pesquisador, buscando provar que policiais tinham ligação com a criminalidade, o que não tem nada de surpreendente para quem acompanha o noticiário diário em todo o País e, para quem recorre aos vários instrumentos de acompanhamento disponíveis na internet, inclusive o PEbodycount, que faz a contagem diária da criminalidade no Estado e submete o problema a debate aberto e permanente, clareando caminhos, apontando equívocos e possibilidades de tirar o nosso Estado do lugar que ocupa em violência.
Mas também é importante atentar para algumas outras evidências que não devem ser estranhas nem a instituições como o Ministério Público nem aos pesquisadores nacionais ou internacionais que pretendem encontrar respostas.
Uma dessas evidências está posta no relatório da ONU quando dizia que o Brasil precisava de uma reforma urgente e desesperada do sistema judiciário e policial, além de maiores salários aos policiais para evitar a corrupção.
Outra evidência é a que está sendo colocada pelo Ministério Público de Pernambuco ao questionar o curto tempo de treinamento de policiais, a deficiência nos exercícios práticos e o não cumprimento da investigação social dos alunos.
Nesse ponto, cabe recorrer a um dado lembrado pelas Nações Unidas e frequentemente colocado em todas as abordagens sobre a questão policial no País: como pode um agente público responsável pela segurança da sociedade permanecer na base da pirâmide, entre os mais pobres, mais desinformados e mais mal remunerados?
Não há, aí, uma retumbante contradição?
Pode-se exigir firmeza na defesa da lei da ordem a um agente público que é obrigado a viver, com a família, no mesmo espaço físico dos assaltantes, traficantes, homicidas? É claro que isso não é privilégio de Pernambuco - é uma questão nacional.
Se a essa contradição profunda e incontestável acrescentamos o preparo acelerado, emergencial, e a ausência de embasamento em direitos humanos, fica difícil avançar em uma área que deveria, isso sim, ter um tratamento especial, a partir da natureza diferenciada da atividade de risco e de extrema responsabilidade que é.