Por Sheila Borges, de Política / JC Os sucessivos escândalos do Senado mostram como os ordenadores de despesas, que não demonstram ter zelo com o erário, se protejem sob o manto da impunidade e da falta de transparência para se apropriar do patrimônio público.
Esses episódios terminam delegando ainda mais responsabilidade às instituições que fiscalizam os gastos públicos, como os tribunais de contas.
Mas um recurso extraordinário, que será julgado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), no próximo mês, pode esvaziar esses órgãos que auxiliam o Poder Legislativo.
Se esse recurso do Ministério Público Eleitoral não for acatado pelo STF, os tribunais de contas irão sofrer um duro golpe.
Isso porque conselheiros e técnicos dessas instituições perdem o poder de punir os maus gestores, comprometendo uma das principais atribuições da entidade: o controle externo.
Eles ficarão impedidos de cobrar dos prefeitos, que acumulam a função de ordenadores de despesas com as de chefe do Executivo, a devolução do que foi gasto indevidamente, assim como imputar-lhes multas por irregularidades consideradas, tecnicamente, insanáveis.
Com isso, os julgamentos políticos das Câmaras de Vereadores irão prevalecer e as punições arbitradas pelos Tribunais de Contas dos Estados (TCEs) poderão ser perdoadas.
Atualmente, os julgamentos dos plenos dos TCEs relativos às prestações de contas do prefeito, que também é ordenador de despesa, têm efeito duplo.
Quando o prefeito envia a sua contabilidade, o tribunal gera um processo.
Esse mesmo documento é submetido, automaticamente, a duas decisões.
Os técnicos dos TCEs fazem uma distinção entre as análises das chamadas contas de governo (quando o prefeito assume o papel de chefe do Executivo) e de gestão (quando o prefeito é, concomitantemente, ordenador de despesa).
No primeiro caso, o tribunal de contas emite um parecer para subsidiar o julgamento político das Câmaras de Vereadores.
Os técnicos apontam se as contas foram aprovadas, aprovadas com ressalva ou rejeitadas.
Elas refletem se o orçamento foi cumprido, indicando os níveis de endividamente e revelando se os limites de gastos e os repasses de verbas para a saúde e a educação estão corretos.
No segundo caso, as contas de gestão dos recursos públicos são julgadas tecnicamente pelos conselheiros e auditores dos tribunais de contas.
São consideradas as receitas e as despesas, como o pagamento de pessoal, a realização de licitações e a assinatura de empenhos e contratos.
Se for verificada a ocorrência de alguma irregularidade, os tribunais determinam o ressarcimento ao erário e imputam multas.
Em Pernambuco, só o prefeito do Recife não é ordenador de despesa porque descentralizou a gerência dos recursos públicos.
Os prefeitos de todos os demais municípios acumulam a função de chefe do Executivo com a de ordenador.
Para os técnicos do TCE-PE, se o Supremo mantiver o entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) – que são favoráveis ao esvaziamento das atribuições do órgão –, haverá um retrocesso nos mecanismos de fiscalização dos gastos públicos, o que favorecerá a corrupção.
Em função dessa polêmica, o procurador-chefe da Procuradoria Consultiva do TCE do Estado, Hilton Albuquerque, redigiu um parecer para subsidiar as opiniões de conselheiros, juristas e políticos sobre o assunto. “Se o Supremo mudar, o julgamento (das prestações de contas) será exclusivamente das câmaras.
O TCE vai imputar o débito (aos prefeitos ordenadores de despesas) e não será pago.
O prefeito negocia com os vereadores (a aprovação das prestações de contas) e o TCE ficará refém.
Pode derrubar tudo o que a gente faz.
Hoje, mesmo que a câmara rejeite, o gestor tem que pagar a multa.
Alguns prefeitos não entendem, acham que a cobrança das multas são indevidas porque a câmara aprovou.
Os prefeitos não fazem a distinção entre os dois julgamentos (de governo e de gestão)”, ressalta Albuquerque.