(Fotos: Alexandre Severo / JC Imagem) Por Ana Lúcia Andrade e Ciro Carlos Rocha, de Política / JC Ele foi repórter político nos duros tempos da repressão do regime de 64.
Tempos da censura, da luta armada, da perseguição a quem não concordava com o jogo estipulado por quem estava no Poder.
Em dos Estados de maior efervescência política, da “agitação natural” de um Pernambuco que tinha um Gregório, um Julião, um Arraes…
Atuou na imprensa local e nacional.
Do jornalismo para o marketing político foi um passo.
Agora, após passar longo tempo acompanhado de perto os bastidores dessa arte de forjar líderes e “representantes do povo”, seja nas redações ou em campanhas eleitorais, Ricardo Carvalho lança “É Tudo Verdade – Memórias de um Repórter”.
Com 131 histórias, um importante depoimento aos registros da memória política que – não poderia ser diferente – vem com polêmicas.
A principal, nas palavras do próprio autor, nesta entrevista ao JC, trata do “caso Maria do Socorro”.
Ou, como diz Ricardo, o “Tiro no Pé”.
A IDEIA DO LIVRO “A iniciativa foi de amigos meus.
Fernando Menezes, Garcia, Roberto Menezes, Evaldo Costa, José Tomaz.
Era um grupo que sempre almoçava junto.
Uma vez por mês a gente se reunia.
Eu sempre tive muita história porque participei mais de campanhas eleitorais do que eles.
E sabia de muitas histórias.
Toda a prisão de (Carlos) Garcia, pouca gente sabe o que eu sei.
A conversa que eu tive com Moura (Cavalcanti), com Marco Maciel.
Eu nunca tive essa pretensão.
Sempre fui mais repórter do que um intelectual.
Como já não tenho mais nenhuma participação no processo político-eleitoral, resolvi aprender a mexer no computador.
Durante a última campanha (2008), resolvi jogar alguns textos no computador, daquela maneira crua que sempre foi o meu estilo, sem rodeios, sem florear.
E eu banquei.
Porque dizem que um homem tem que ter um filho, plantar uma árvore e escrever um livro.
Talvez o motivo principal fosse atender ao apelo dos amigos e ajudar o grupo de doentes que eu sempre ajudei, que são os chagados (a renda da venda do livro será doada para uma instituição que cuida dos doentes de Chagas).” AS HISTÓRIAS “Comecei a colocar no papel as histórias que eu contava.
E outras que eu não contava também.
Fiz mais a parte política (no jornalismo).
Em alguns episódios eu estava no local e presenciei (o fato).
Por exemplo: 1978.
Véspera da eleição de Jarbas para o Senado.
Estava na Livro 7 (antiga livraria da Rua 7 de Setembro), lançamento do livro de Paulo Cavalcanti (ex-líder comunista, já falecido).
Dalí, eu e Jarbas saímos sozinhos para Paulista para um encontro com Sérgio Longmann (ex-deputado).
Depois tivemos um encontro com Geraldo Pinho Alves (ex-prefeito e ex-deputado, já falecido), que era cassado.
Na volta, Jarbas coloca a mão no meu ombro e diz: ‘Mago, perdi a eleição.
Amanhã vou ganhar a campanha, mas perder a eleição porque não tenho quem levante minha bandeira em quarenta e tantos municípios’.
E, de fato, ele perdeu a eleição no Estado todo por 38 mil votos.
Mas no Sertão do Araripe por quase 45 mil votos.
Ele me fez uma promessa durante a apuração: ‘Se eu for candidato majoritário mais uma vez no Estado, no dia da eleição estarei no Sertão do Araripe’.
E ele foi candidato majoritário mais quatro vezes e não cumpriu essa promessa.
Então é esse tipo de história que eu vivi.
Há uma parte histórica, naturalmente.
A própria pesquisa, por exemplo, foi uma pesquisa que eu fiz do dia (de cada episódio que testemunhou)…
Eu conto 131 histórias no livro.” A MAIOR POLÊMICA “Acho que é (o caso) Maria do Socorro. É uma história mais recente, teve muitos desdobramentos, tem muito coisa que ficou mal explicada…
Eu digo aquilo que eu ouvi.
Nas conversas que eu tive depois do episódio Maria do Socorro com Mendonça Filho…
O episódio ligado à MCI (a empresa de Antônio Lavareda) consome uns quatro ou cinco capítulos…
Teve o episódio da Casa Militar (a perseguição ao advogado Dominici Mororó), mas esse eu não tive muito conhecimento.
E aqui, sentado nesta cadeira (em sua sala, na RC Produtora), eu adverti a Cadoca para não fazer a campanha de 2004 com a MCI.
Por que?
Ele não era (o candidato-projeto da MCI, que segundo Carvalho seria Raul Henry)…
Eu não tenho dúvida (que o episódio Maria do Socorro foi intencional para prejudicar a campanha de Cadoca).
Não tenho dúvida.
Ou então foi incompetência.
MARIA DO SOCORRO “Resolvi contar (alguns casos que não testemunhou, não esteve como agente), primeiro porque são vários fatos que envolvem problemas de campanha eleitoral…
Eu estava numa sexta-feira no dia que saiu o programa de Maria do Socorro, era o segundo programa (guia eleitoral) da campanha de Cadoca (a prefeito do Recife, em 2004), e naquele final de campanha Cadoca estava com boa vantagem.
E você não parte para o ataque, a não ser que esteja com um porcentual baixo, o que não era o caso…
Era o aniversárioo de Jarbas, que foi antecipado, lá em Pau Amarelo, eu fui um dos primeiros a chegar.
Lá para tantas, disseram: ‘houve uma bomba’.
Eu procurei saber.
E vi que o negócio não batia.
Como é você condenar alguém por ter dado à cidade um quilômetro de praia?
Se podia partir para outra coisa.
Mas não jogar com isso.
Alguém podia justificar tal episódio com a desculpa de que a ideia partiu do comitê…
Eu comandei campanha – para dirigir mesmo – as de Marcus Cunha (a prefeito do Recife, em 1988) e de Fernando Bezerra Coelho (a prefeito de Petrolina, em 92).
Você tem que checar as coisas.
As coisas só saem se eu quiser.
Se eu fui contratado para aquilo, pode vir 500 denúncias.
Não é assim que se faz campanha.
Então, tem que se ter o cuidado.
Quantas denúncias nós recebemos?
Nas (campanhas) de Marcus Cunha, Miguel Arraes (a governador, em 1986)… chove denúncia. agora, você tem de ter a inteligência política de saber o que é certo e errado.
Aquilo (o caso Maria do Socorro) foi um tiro no pé”.
FESTA NO PT “Houve festa no comitê de PT (quando o guia de Cadoca com a denúncia de Maria do Socorro foi ao ar).
Eu achei a estratégia errada.
Telefonei para dizer que estava errado, que aquilo era um absurdo, que tinham jogado a campanha de Cadoca fora.
Não tinha conversado com Jarbas.
Eu apenas conversei com Roberto Menezes (marqueteiro que trabalhou com Ricardo).
E ele concordou que realmente tinham acabado com a campanha de Cadoca.
Eu sempre tive coragem.
De enfrentar.
Os militares, a política, eu nunca tive medo.
Porque eu sabia que o que eu estava escrevendo (quando repórter) era verdadeiro.
Era aquilo o que eu via.
Não o que me diziam.
Nunca tive uma matéria desmentida.
Eu conto uma história que é a história de Nivaldo Machado (ex-deputado e ex-presidente da Arena em Pernambuco), então que Xinxa (o ex-deputado Apolinário de Siqueira) me agrediu na Assembleia e eu acho que ele tinha razão de ter me agredido.
Porque eu dei uma informação, que Nivaldo Machado me deu e nunca teve a coragem de dizer que tinha sido ele que tinha me dado.
Estou revelando isso agora.
A verdade é essa…
Nivaldo me disse que os militares tinham vetado três deputados para a convenção da Arena.
Publiquei isso na primeira página.
Quando cheguei na Assembleia, deu-se a confusão.
E ele estava certo.
Nivaldo Machado é que não teve a coragem de assumir que deu a informação.
DERROTA DE 2006 “Quem era o adversário?
O mais forte?
Era Humberto Costa.
Mas era o mais vulnerável.
Eu não participei da campanha.
Fui só observador.
Mas quem está de fora observa muito melhor do que quem está dentro.
Como é que se vai em cima de Humberto e deixa Eduardo (Campos) correr solto na buraqueira?
Você acha que aqueles que votaram em Eduardo no primeiro turno iriam votar fechado com Humberto no segundo turno?
Houve um equívoco.
Nenhuma campanha produzida na MCI divide comando.
O comando é de Lavareda…
Nem com O candidato ele dividia o comando da campanha?…
Acho sim (que houve equívoco na contratação da MCI para a campanha de Mendonça Filho, DEM, em 2006).
E eu disse a Mendonça para não contratar…
Os políticos, de uma maneira geral, acreditam numa coisa chamada pesquisa.
São bobos.
São bobos, bobos.
Se você fizer um levantamento em Pernambuco, nos últimos vinte anos, 80%, 90% (das pesquisas) foram falhas.
Prefeita de Salgueiro em 92 (Cleuza Pereira, PSB), diziam que ela perdia por 18 pontos…
Petrolina (a eleição de Bezerra Coelho, também em 92).
Diziam que a gente perdia.
Nós ganhamos.
Porque as pessoas querem essa coisa de colocar no jornal.
Pesquisa só foi feita com seriedade no Brasil em 1978 pela Galup, que teve praticamente 90% dos seus levantamentos corretos.
Acertados.
JORNALISMO E PODER “Minha relação com o poder veio muito depois de eu ser jornalista.
Fui jornalista político no (jornal) O Estado de S.
Paulo, Jornal da República, Diario de Pernambuco, e havia um programa na Rádio Clube – “O Assunto é Política” – que fui eu que montei.
Eu fui repórter político e dei sorte para trabalhar na sucursal de um grande Jornal, que é o Estado de S.
Paulo.
Que era o melhor, era um grande jornal de oposição, jornal de análise, que era censurado (na ditadura).
Eu sempre respeitei o político de qualquer tendência, desde que ele fizesse aquilo por convicção e com honestidade.
Havia um vereador (no Recife) chamado Wandekok Wanderley, eu sempre tive com ele a melhor relação possível.
Por quê?
Porque ele era fonte.
Havia outro – Carlos Veras –, que era um cara de direita.
Que sempre foi uma pessoa que me dava informação, e informação para mim era mais importante do que ter a notícia.
Porque você conta a história diferente da dos outros, no dia que você puder contar.
Então, sempre tive muitos bons relacionamentos.
Com Paulo Guerra, Nilo Coelho…. (ambos ex-governadores, já falecidos).
Com Eraldo (Gueiros, também ex-governador, já falecido), nem tanto porque com ele tinha uns assessores que não gostavam muito de mim.
Ele até me convidou para trabalhar na assessoria dele, mas eu não aceitei.
Moura Cavalcanti (ex-governador, já falecido)…
Se existiu um governador que foi bom para a imprensa foi ele.
Em tudo.
Nunca se negou a falar sobre nada.
E ele era um homem do sistema.
Representava o sistema, a repressão brasileira e atendia você a qualquer hora.
Morreu sem me responder apenas um assunto: a Guerrilha do Araguaia.
A participação do Incra na guerrilha.
Ele (Moura Cavalcanti, que também foi presidente do Incra e ministro da Agricultura) sempre se negou a falar sobre isso”.
PREOCUPAÇÃO ZERO “Eu não tenho nenhuma preocupação com nenhuma das histórias que eu conto.
Todas elas são verdadeiras dentro do princípio jornalístico.
Na minha vivência como chefe de reportagem sempre busquei a verdade.” ERROS DE MENDONÇA “Eu acho que Mendonça teve erros.
Eu não gostaria de falar sobre eles.
Mas eu digo no livro.
Errou em escolher (a MCI).
Foi o que eu disse a ele dois anos antes (da eleição de 2006): ‘seja mais agressivo sem criar arestas com Jarbas’.
Porque eu disse a ele, naquele momento, dois anos antes da eleição, que ele seria o candidato ao governo do Estado.
Mendonça foi acanhado como vice e como governador, ficou muito (na sombra de Jarbas)…
Não é que ele deveria ser mais agressivo, não é isso.
Mas é ter o prumo.
Aquela coisa de ‘eu tenho o comando’.
O erro começou (em 2006) no programa feito no primeiro semestre do DEM.
Um que foi feito num auditório, uma coisa falsa. É aquela coisa: alguém acredita, como leitor, naquela coluna do Lula? (O Presidente Responde, publicada em jornais de todo o País).
Entendeu? É falso.
O povo tem suas sabedorias…
Então, Mendonça perdeu seu timing.
Porque a campanha dele para prefeito…. É triste.
Nunca vi nada igual.
Campanha confusa, ‘vou fazer isso, aquilo’, criticando o outro…
E ainda teve teve aquele embate jurídico!
Ora, perdeu, perdeu.
Perdeu, perdeu.
Sempre o derrotado aparece com uma desculpa. É porque você com uma prefeitura (no poder), é difícil perder.” » Serviço: Lançamento do livro “É Tudo Verdade- Memórias de um Repórter”, de Ricardo Carvalho Nesta segunda (27), 18h30 Anna Gois Recepções - Av.
Rio Branco, 104, Recife Antigo