De O Estado de S.

Paulo Um discurso do presidente Lula na pequena cidade de Imperatriz, no Maranhão, em 2004, se tornou um dos maiores constrangimentos políticos para o presidente e volta à tona agora, em 2009, quando Lula apóia o presidente do Senado José Sarney (PMDB-AP), na mais grave crise do Congresso.

Com mais de 143 mil exibições no You Tube, o vídeo reproduz o contexto político das eleições municipais no Maranhão.

Lula esteve em Imperatriz para participar de um comício do petista Jomar Fernandes.

No palanque, o presidente criticou duramente Roseana Sarney e questionou o resultado de pesquisas eleitorais, relacionando os candidatos com grupos de mídia na região. “Olha, eu vou contar uma coisa pra vocês.

Eu, quando vejo na imprensa de São Paulo as pesquisas dizendo que a Roseana Sarney é uma governadora aceita pelo povo do Maranhão…

Eu conheço o Maranhão, gente.

Eu já andei de carro e de ônibus neste Estado (…).

Aí eu fico imaginando por que é que ela aparece bem nas pesquisas.

Sabe por que?

Por que a Globo é do pai dela, o SBT é do (Edson) Lobão, a Bandeirantes é não sei de quem.

Ou seja, é a televisão falando bem deles o tempo inteiro. É por isso que ela lidera as pesquisas.

Porque passa o tempo inteiro, descaradamente, mentindo na televisão”, diz Lula no palanque.

O vídeo do discurso está na internet e pode ser encontrado em mais de 15 links no You Tube.

O fenômeno é explicado pelo professor da FGV e consultor do IBOPE Marcelo Coutinho.

Para ele, um dos princípios da internet é a transparência. “A internet se tornou uma nuvem de dados, conversações digitais.

E não se prende uma nuvem, porque ninguém é dono da nuvem”, afirma. “O sucesso do vídeo é fruto da consolidação da internet.

As pessoas são editoras de si mesmas.

Elas podem publicar o que quiserem sem passar por nenhum crivo”, afirma o criador do site de humor Kibe Loco, Antonio Tabet.

O vídeo do comício foi publicado no site de Tabet, que tem 100 mil visitantes por dia.

Só este vídeo do Maranhão, no canal do Kibe Loco, tem mais de 114 mil visualizações. “O humor na verdade, quando é bem feito, também é um instrumento de conscientização bem forte.

As pessoas riem de uma situação e depois entendem porque estão rindo dela.

Esse vídeo deixa claro o que é o político”, conta Tabet.

Essa revolução é explicada também por Coutinho. “Hoje, todo consumidor, cidadão, está armado com um celular com câmera.

Ele vê alguma coisa errada, ele saca a arma e tem uma prova contra a pessoa.

A sociedade está cada vez mais transparente”.

Este vídeo especificamente criou um mal-estar na política por causa da diferença entre o apoio do PT e o de Lula no Maranhão, em 2006.

Isso pode ser comprovado em uma rápida navegação na internet.

A rede não deixa a memória se esvair e permite que o eleitor cobre o político de um padrão ético, seja na frente da câmera ou longe dela.

Para Coutinho, essa mudança de comportamento das pessoas, agora munidas de “armas digitais” não muda os padrões éticos, porque “ética é o que você faz quando não estão olhando”. “Se tem alguém filmando, olhando, se você não faz algo errado (ou diz), não é por ética, mas por medo.

Com certeza o fato de estarmos em um mundo vigiado e transparente influencia no comportamento das pessoas”, aponta. “Da mesma forma que o padrão do consumidor mudou, e ficou mais exigente com o produto, e os direitos do consumidor, vejo que as pessoas vão cobrar dos políticos um trabalho mais cuidadoso, mais coerente”.

Essa cobrança já é vista nos títulos curiosos do vídeo em questão: “Recordar é viver… e morrer de raiva” é um deles. “É só olhar para os países que tem mais internautas que cidadãos, onde o voto é facultativo.

No Brasil, 30 % do eleitorado tem acesso a internet.

Essa cobrança vai demorar mais um pouco.

Não terá muita diferença para 2010”, afirma Coutinho.

Quanto à legislação que desenha como será a cobertura online das eleições, Tabet é descrente. “Não adianta fazer uma legislação eleitoral que impeça todo esse processo da democratização da internet. É uma lei bizarra, retrógrada, estranha.

Isso é um retrato do receio que as pessoas, aquelas que não dá para anotar o que escrevem, tem com a internet, que é um veiculo que forma opinião e permite que coisas de muito tempo atrás sejam encontradas.

E é isso que eles querem.

Não serem encontrados”, conclui Tabet.

Nos Estados Unidos, dá para se ter uma ideia do que está para acontecer no Brasil daqui a um tempo.

No episódio conhecido por “You Macaca”, em 2006, o senador republicano George Allen apontou para um jovem que sempre acompanhava a campanha e afirmou: “Este macaca trabalha para meu oponente e filma tudo que eu faço.

Palmas para ele”.

Uma hora depois as imagens do senador estavam no You Tube e os 23 anos de carreira política foram por água abaixo.

Allen era apontado para concorrer à presidência dos Estados Unidos em 2008, e depois disso foi substituído por John McCain.

Enquanto essa relação entre o que está na web e o que é cobrado na vida real não é efetiva no Brasil, Tabet brinca no twitter. “Lula defende Sarney e critica ataques ao Senado- Cuidado, Lula!

Na era do Twitter, quem não RT #forasarney leva #unfollow em 2010”, brinca Tabet com a política na era da internet.

Collor não mudou…

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