Deu no Estadão Para sobreviver no cargo, o senador José Sarney (PMDB-AP) emparedou ontem o PT e tornou o Palácio do Planalto sócio de sua crise.
Diante da sugestão de afastamento do comando da Casa, apresentada pela manhã por senadores petistas, o presidente do Senado ameaçou renunciar ao cargo, fato que desencadearia um processo sucessório fratricida e abalaria a aliança PT-PMDB em 2010.
Especial multimídia: Os atos secretos de um Senado em crise A manobra de Sarney foi a senha para que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva iniciasse uma operação de “enquadramento” do PT para salvar o aliado.
Horas depois de decidir engrossar o coro pelo afastamento de Sarney - alvo de denúncias reveladas pelo Estado -, o PT voltou atrás. Às 22h15 de ontem, ao deixar a casa de Sarney, o senador Renan Calheiros (PMDB-AL) selou o tom da resistência à renúncia: “Foi importante a decisão do PT (o recuo).
O que está em jogo é 2010”.
O líder da legenda no Senado, Aloizio Mercadante (SP), capitaneou a visita, na noite de ontem, da bancada dos “arrependidos” à casa de Sarney. “A renúncia é uma possibilidade que ele pode vir a tomar.
Mas, no nosso ponto de vista, não é a melhor escolha, porque a crise não pode ser atribuída a ele.
Desses 14 anos de atos secretos, ele foi presidente por quatro anos.
Não é justo”, disse Mercadante, ao fim do encontro.
Respaldado pelo PT, Sarney avisou, como novo fôlego, que só decidirá sobre sua permanência ou não no posto depois de uma conversa reservada com Lula.
No início da noite de terça-feira, o presidente já havia escalado a ministra Dilma Rousseff (Casa Civil) para falar com Sarney e pedir explicitamente que ele não tomasse nenhuma decisão sobre afastamento do cargo antes da conversa marcada para hoje - Lula participava do encontro da União Africana, na Líbia.
A primeira conversa com o PT ocorreu logo cedo, quando Sarney recebeu em sua casa Mercadante e a líder do governo no Congresso, senadora Ideli Salvatti (PT-SC).
Diante da proposta para que se afastasse do cargo enquanto durasse a apuração das denúncias, o presidente foi taxativo: “Licença eu não aceito.
Ou me afasto de vez, ou fico no cargo com o apoio de vocês”.
Na véspera, sete petistas dos 12 da bancada haviam defendido com veemência o afastamento de Sarney, em reunião da bancada que se estendera até a meia-noite.
Apesar das articulações políticas que antecederam os encontros marcados para hoje - haverá também uma reunião de Lula com a bancada do PT -, senadores e assessores do Planalto deram ontem como certo que Sarney renunciará ao cargo depois da audiência com Lula. “O que está em negociação é a garantia de que o senador deixa a presidência e o PT põe um ponto final nas retaliações contra ele, aliados políticos e familiares”, disse um ministro ao Estado, supondo que fontes petistas fornecem denúncias à mídia desde que Tião Viana (PT-AC) foi derrotado por Sarney na disputa pelo comando da Casa.
Aliados de Sarney deram outra versão: “Ele quer ficar para mostrar que o DEM é o grande parceiro do ex-diretor-geral Agaciel Maia nos desmandos administrativos do Senado”, afirmou um senador próximo ao peemedebista.
O clima na bancada do PMDB é de revolta com a “traição” do DEM e de vingança.
Além de escalar uma tropa de choque para detratar os adversários que entoaram o “fora Sarney”, o PMDB vai operar para que toda a artilharia contra o partido se volte para o DEM, a primeira-secretaria e o senador Arthur Virgílio (PSDB-AM).
Os peemedebistas entendem que a crise é de natureza administrativa e que quem tem de responder é o partido que comandou a primeira-secretaria na última década: o DEM.
Apostando na “normalidade”, o gabinete da presidência até divulgou a agenda de baixo risco político para hoje: Sarney participa de sessões solenes e recebe o presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Gilmar Mendes, e uma delegação do Comitê Central do Partido Comunista da China.
Agendou também a presença no comando da Mesa na sessão do plenário, a partir das 16h.
Ontem, o grupo de Sarney manifestou alívio pela decisão do primeiro vice-presidente, Marconi Perillo (PSDB-GO), de encerrar a sessão plenária logo após a abertura, em razão da morte do deputado José Pinotti (DEM-SP). “Na minha casa o doutor Pinotti era santo de altar.
Senti grande vazio com seu falecimento.” Quando José Nery (PSOL-PA) ameaçou tratar da crise, o primeiro-secretário, Heráclito Fortes (DEM-PI), reagiu: “A sessão não é para falar da crise.
Fale sobre Pinotti.” A sessão terminou sem ataques.