(Foto: Roosewelt Pinheiro/ABr) Sérgio Montenegro Filho Na Roma Antiga, a população era representada nas decisões governamentais por um grupo de notáveis da elite da época, a quem cabia elaborar leis, fiscalizar as autoridades executivas e controlar a Justiça, as finanças públicas, a religião e a política externa.

A essa assembléia deu-se o nome de Senado, cujos membros eram respeitados como autoridades máximas.

Traduzido para os dias atuais no Brasil, o conceito se dilui.

Nos últimos anos, o Senado Federal tem sido protagonista de tantos desmandos e escândalos que a palavra senador virou sinônimo de indignidade, conforme definiu um dos seus próprios integrantes.

O Senado de hoje parece ter perdido a ligação com a sua função essencial, de representar a federação.

Voltou-se para o próprio umbigo, ocupado em tentar sair - ou afundar ainda mais - da lama que não pára de jorrar das torneiras.

O mais recente escândalo – dos cerca de 700 atos secretos nomeando apadrinhados, criando cargos e aumentando salários – envolveu o presidente da Casa, e reiterou a avaliação de que por mais que alguns ainda se esforcem em tentar respeitar a função delegada pelo eleitor, a maioria gasta todo o seu tempo tentando justificar o injustificável.

Os senadores por Pernambuco, ao que se sabe, não estão envolvidos em escândalos.

Dois deles foram eleitos em 2002 e encerram seus mandatos no próximo ano: Marco Maciel (DEM) e Sérgio Guerra (PSDB).

Somente Jarbas Vasconcelos (PMDB), eleito em 2006, ainda terá mais quatro anos pela frente.

E tudo indica que será um período de muita briga.

Afinal, é de Jarbas que têm partido as críticas mais contundentes à instituição.

Adversário do atual presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), e do líder do PMDB, Renan Calheiros (AL) – sob os quais têm recaído as maiores críticas pelos desmandos na Casa – o senador pernambucano é afiado nos comentários.

Para Jarbas, dois fatores levaram o Senado à atual situação: a absoluta falta de transparência e uma inexplicável resistência à modernização. “Se na última década, o Senado tivesse adotado critérios mais transparentes, a maior parte dos escândalos não teria acontecido.

Mas transformaram isso aqui numa caixa-preta”, reclama, acrescentando que o Senado ficou obsoleto, arcaico. “Toda empresa ou instituição pública procurou se adaptar aos novos tempos, menos esta Casa.

E com isso, perdeu o rumo”, sentencia.

A receita, diz, é intensificar a pressão sobre os dirigentes para acelerar as reformas. “Como não acredito na renúncia de Sarney, é preciso que pressionemos para que ele diga que tipo de mudanças pretende fazer e faça logo”, adverte.

As críticas do tucano Sérgio Guerra vem no mesmo tom.

Presidente nacional do PSDB, ele foi um dos primeiros senadores a se juntar ao grupo que, na semana passada, entregou a Sarney uma lista de sugestões de mudanças na estrutura da Casa, que inclui o enxugamento do quadro funcional – inflado por cerca de dez mil servidores – e a redução de despesas e mordomias, além de reformas no funcionamento de comissões técnicas e do plenário. “O Senado é um monstro, ultrapassado, anacrônico e improdutivo.

São funcionários demais, comissões demais, operando verbas demais, mas trabalhando pouco”, analisa.

Na opinião de Sérgio Guerra, as reformas precisam ser radicais, reduzindo a estrutura pela metade, sob o risco de a Casa não sobreviver. “Os senadores não podem mais nem andar na rua sem ser motivo de piadas.

Alguns tiraram até as placas do Senado dos seus carros.

Daqui a pouco a eleição chega e ninguém se reelege”, prevê.

Embora admita que o modelo permissivo do Senado facilita a corrupção, o senador de oposição diz que as irregularidades são mínimas, se comparadas ao cenário do Poder Executivo. “Não somos o centro da corrupção no Brasil.

O que acontece aqui é menor perto, por exemplo, das negociações de um contrato assinado lá por fora pelo governo”, alfineta.

Mais moderado dos três pernambucanos, Marco Maciel (DEM) não se envolveu diretamente no confronto com Sarney.

Mas não se furta de criticar a situação da Casa.

Prefere, no entanto, uma abordagem mais filosófica da crise, realçando a necessidade ética do homem público. “Meus compromissos não são apenas de natureza política, partidária e doutrinária.

São também de inspiração ética.

Minha conduta e atuação são decorrência das idéias em que acredito e dos valores que cultivo, inspirados nos princípios da religião que professo e nos ideais que sempre defendi”, afirma, listando uma série de princípios.

Entre eles, o fortalecimento do sistema federativo para evitar superposições entre as esferas de poder, o aperfeiçoamento das práticas sociais e, sobretudo, uma volta aos preceitos básicos de justiça: “Viver honestamente, não lesar o próximo e dar a cada um o que é seu”.

PRESSÃO POPULAR Embora os senadores apostem na pressão sobre os dirigentes da Casa para recuperar a imagem, entidades da sociedade civil avaliam que todos os 81 parlamentares são responsáveis no processo.

De acordo com o coordenador da ONG Transparência Brasil, Cláudio Weber Abramo, o presidente do Senado, José Sarney, acertou ao declarar que os escândalos não eram responsabilidade exclusiva da sua gestão, mas de toda a Casa. “Alguns dos escândalos mais recentes parecem até ter sido estimulados a vir a público pela oposição interna a Sarney.

Então, imaginemos o que mais pode ainda estar escondido?”, especula.

Para Abramo, é impossível convencer a sociedade de que os senadores não sabiam de nada do que acontecia.

Até porque – justifica – não só o Senado, mas todas as instituições parlamentares brasileiras passam por processo semelhante e perderam credibilidade e legitimidade. “O Legislativo, hoje, é um poder comprado pelo Executivo, que legisla sem ser fiscalizado.

Isso faz com que se corrompa e seja atraente para os picaretas”, analisa. “Na Inglaterra, um escândalo semelhante resultou em demissões de ministros e quase derruba o gabinete, porque houve pressão da sociedade.

Afinal, político só se move diante da expectativa de se reeleger”, conclui.