Por Augusto Coutinho Semana passada, o Brasil perdeu mais uma chance de conhecer uma reforma política significativa.
Por pressão direta dos partidos pequenos, que poderiam dificultar a hegemonia que ele tem hoje no Congresso, o presidente Lula recuou – mais uma vez, é importante que se diga – e pôs por terra a votação em lista e o financiamento público de campanha.
O recuo de Lula é significante.
Mostra muito o quanto ele está amarrado ao atual sistema político brasileiro.
Um sistema que ele próprio já criticou, e muito, quando não era governo.
Mas foi só chegar ao poder para deixar-se fazer refém dos piores “hábitos” da política nacional.
Mensalões não faltam para provar isso. É lamentável.
A esmagadora maioria do governo no Congresso e os altos índices de aprovação do presidente dariam todas as condições a Lula de encampar as reformas.
Mas ele não quis e não quer.
Infelizmente.
A proposta que tramitava na Câmara tinha o apoio de 5 dos maiores partidos da Câmara – DEM, PSDB, PMDB, PT e PDT.
Eles fecharam acordo para aprovar uma emenda do deputado Ibsen Pinheiro que criava a lista e o financiamento público.
Mesmo diante deste apoio, o presidente recuou. É mais espantoso ainda.
Seria uma mudança substancial no sistema político brasileiro atual, que, no meu entender, é totalmente deturpado.
Ele cria, a meu ver, em muitas ocasiões, ou na maior parte delas, injustiças graves.
Sobretudo, por desprestigiar os políticos que pautam a atuação em valores éticos, em ideias, princípios, posicionamentos e posturas de verdadeiro espírito público.
Parece que o Lula não quer ver isso. É patente que este sistema falido serve apenas para perpetuar na política aqueles que a usam em interesse pessoal, que não têm compromisso com nada.
A reforma que estava em pauta, não se tratava, no entanto, de uma panacéia miraculosa.
Mas corrigia desvios importantes.
A lista fortaleceria os partidos políticos.
O financiamento público acabaria com a relação espúria do político com o poder econômico.
Os críticos da lista costumam centrar fogo na falsa premissa de que no Brasil não há partidos políticos, stricto sensu.
Isto é verdade em parte.
E o que tem de verdadeiro é justamente pelo fato de o atual sistema político distorcer tudo ao ponto de quase anular a importância das legendas.
Os partidos são fracos no Brasil não porque não tenham tradição, porque não tenham um século de existência – como alguns chegam a dizer.
Tão e somente porque o atual sistema consagrou o voto na pessoa e não no partido.
A lista, também ao contrário do que os críticos afirmam, não privilegiaria os “donos” dos partidos.
Isso, na verdade, é o que acontece hoje.
Sobretudo com as legendas nanicas, nas quais uma pessoa ou um pequeno grupo monta chapa pensando em si próprio, cuidando apenas de construir uma “cauda” robusta que possa elegê-lo.
Nos grandes partidos não há donos.
Ou pelo menos é muito difícil que legendas de peso se deixem reger pelo comando de um só.
Ao contrário, há sempre muitos “caciques”, como uma certa tradição jornalística local costuma chamar os líderes partidários.
Não conheço nenhum caso de um grande partido político brasileiro atual ter um “dono”.
Quando falo das legendas pequenas, não quero generalizar, mas é evidente que elas existem nas brechas do sistema.
Nenhuma democracia moderna no mundo conhece a proliferação de siglas que existe no Brasil.
Mesmo porque não há tantas correntes políticas diferentes, tantas ideologias, tantos programas que justifiquem a fragmentação do atual quadro partidário brasileiro.
O voto na lista obrigaria todos os candidatos a trabalharem pelos princípios partidários, pelos seus programas, pela ideologia que aquele partido defende.
Isso não existe hoje.
O sistema político não deixa.
Ele só faz privilegiar quem promete dar emprego para o indicado da liderança comunitária e, muito pior, quem simplesmente compra votos.
Nada é mais frustrante para um político sério do que o total descrédito que enfrenta hoje em dia nossa política.
Lula deixou passar mais uma grande chance de dar um importante passo para a moralização e o aperfeiçoamento do nosso sistema.
Negou-se a fazê-lo instigado por interesses duvidosos.
O preço a se pagar por isso é alto e ele o conhece muito bem.
Infelizmente, para nós, parece que ele prefere pagar.
PS: Augusto Coutinho (DEM) é deputado estadual e escreve para o Blog semanalmente.