A revolta dos nanicos Não bastam as viagens à nossa custa, o empreguismo, o nepotismo, as trambicagens: agora os deputados reclamam que estão sendo perseguidos pela imprensa Diego Escosteguy Fotos Fabio Rodrigo Pozzebom/ABR e Sérgio Lima/Folha Imagem LAMENTAÇÕES Os deputados Ciro Gomes, ACM Neto e Silvio Costa: eles preferem culpar a imprensa e o Ministério Público pelos desvios que podem ter cometido com o uso de passagens aéreas Na quarta-feira da semana passada, um dos deputados acusados na farra das passagens aéreas pediu para falar no plenário da Câmara.
Dedo em riste, rosto contrito, ele tomou o microfone e pôs-se a defender com vigor a honra da família.
Sua mãe fora citada pelo Ministério Público como beneficiária de uma viagem para Nova York: “É uma mentira grosseira, leviana, envolvendo o nome da minha mãe, uma octogenária.
No meu gabinete só quem usa a cota de passagens sou eu”.
Em seguida, acossado por jornalistas que pediam mais explicações, o deputado respondeu: “Não tenho medo de ninguém.
Da imprensa, de deputados.
Pode escrever aí: ‘Ministério Público é o c…’”.
O autor dessas barbaridades, deputado Ciro Gomes, não é um desconhecido, muito menos um neófito na política.
Foi ministro do governo Lula e candidato à Presidência da República em 2002 – eleição na qual perdeu qualquer chance ao chamar um cidadão de “burro”.
E havia mais: instigado a comentar a possibilidade de mudanças nas regras para o uso das passagens, o deputado encerrou sua peroração com a delicadeza de sempre: “Até ontem era tudo lícito.
O que mudou? É um bando de babaca”.
Ciro liderou a reação dos nanicos – e assumiu o tamanho de todos os que pensam como ele.
Muitos se juntaram ao deputado cearense no coro das lamúrias.
Entre eles, destacou-se o corregedor da Câmara, o deputado ACM Neto, do DEM da Bahia, que não deu bobeira e aproveitou a cota para dar um pulinho em Paris, levando a mulher a tiracolo.
ACM Neto também ficou exasperado com as cobranças: “A Casa toda fez.
Estão colocando nomes de pessoas sérias como se fossem bandidos!
Acho que a imprensa quer fechar o Congresso”.
Eis, pasme-se!, quem deveria cobrar ética dos colegas.
Nesse quesito, a maior decepção ficou por conta do deputado Fernando Gabeira, um atento defensor dos bons costumes na Câmara.
Até ele gastou sua cota – de passagens e de asneiras. “Como a Câmara não é um grande anunciante, como o Executivo, toda a pressão se volta contra nós, porque aqui é possível criticar sem que se seja ameaçado de perder seus anúncios”, disse Gabeira.
Coube ao deputado Silvio Costa, do PMN (sim, é um partido) de Pernambuco, verbalizar em público o que seus cada vez mais numerosos colegas de baixo clero conversam às escondidas.
Disse ele, sobre as ameaças de proibir as ilegalidades: “Quando entrei aqui, falaram que a cota era minha.
Não é justo proibir minha mulher e meus filhos de virem a Brasília comigo.
Querem que eu me separe para continuar na política?
Vamos derrubar essa palhaçada no plenário”.
O deputado Domingos Dutra, do PT do Maranhão, resumiu bem o espírito do baixo clero: “Daqui a pouco, vão querer que eu ande de jegue, more em casa de palafita e mande mensagem por pombo-correio”.
Não é preciso.
Basta se comportar como um nobre parlamentar.