Por Tânia Bacelar de Araujo A crise financeira que eclodiu em Wall Street no segundo semestre de 2008 logo se estendeu: atingiu a esfera produtiva da vida econômica e se espalhou mundo a fora.
Queda no consumo, aumento do desemprego e declínio da renda são os sintomas mais evidentes da tragédia que afeta milhões de pessoas, especialmente nos países mais ricos do mundo.
O Brasil vinha de um período de retomada do crescimento do investimento (predominantemente financiado com recursos domésticos) e de ampliação da produção, da renda, do emprego e do consumo interno.
Ancorava-se no seu próprio mercado, especialmente no potencial que representa o consumo insatisfeito de amplas camadas da sua população, aquela situada na base da pirâmide social.
Os números iniciais dos primeiros meses de 2009, publicados em pesquisas de conjuntura feitas pelo IBGE, mostram que o país resiste a mergulhar na crise, no que ela tem de mais perverso: o desemprego e a queda do consumo.
O Nordeste, por sua vez, surpreende os pessimistas revelando também sua capacidade de resistência à imersão na crise.
Dados da pesquisa mensal do emprego (PME) mostram que a taxa de desemprego – estimada para as seis maiores áreas metropolitanas do país - cresceu, passando de 7,6% em setembro de 2008 para 8,5% em fevereiro de 2009.
Mas, quando se olha para fevereiro de 2008, bem antes do estouro da bolha imobiliária nos Estados Unidos, essa mesma taxa de desemprego era de 8,7% .
Perdeu-se o ganho obtido até antes da crise se tornar agônica no mundo, mas o quadro não se altera significativamente quando comparado com um ano atrás.
A situação em 2009 não é pior que no ano anterior.
O emprego do Brasil metropolitano cresceu puxado pelos postos formais do setor privado e o número de desocupados diminuiu.
Interessante observar que as duas metrópoles nordestinas resistem melhor que São Paulo.
No Recife, a taxa de desemprego cai de 11% em fevereiro de 2008 (163 mil pessoas) para 9,1% no mesmo mês do presente ano (137 mil pessoas).
Em Salvador, a mesma tendência se constata, com a taxa de desemprego caindo de 12,3% ( 222 mil pessoas) para 11% ( 202 mil pessoas) em igual período.
Em contraponto, São Paulo vê crescer o desemprego saindo de uma taxa de 9,3% ( 898 mil pessoas) para 10% ( 981 mil pessoas), entre fevereiro de 2008 e o mesmo mês de 2009.
Sinal dos tempos!
No que se refere à variação da renda, a mesma pesquisa confirma que a situação em 2009 é um pouco melhor que no ano anterior.
O rendimento médio real dos ocupados (medido a preços de janeiro de 2009) nessas seis grandes áreas urbanas do país passa de R$ 1.263,36 em fevereiro de 2008 para R$ 1.321,30 em fevereiro de 2009.
E este valor cresce tanto no setor privado como no setor público.
Como o mercado de trabalho metropolitano resiste ao mergulho abrupto nas profundezas da crise mundial, as vendas internas seguem ancorando a economia, enquanto as exportações desaquecem impactadas pela queda do consumo em outros países.
A pesquisa conjuntural feita pelo IBGE para medir o comportamento do comércio varejista mostra que a retração ocorrida no imediato estouro da bolha se atenua em janeiro de 2009.
O volume de vendas (medido de forma ampliada de maneira a considerar as vendas de veículos e de material de construção) mostra crescimento de 2,8% para o conjunto do país, entre dezembro de 2008 e janeiro de 2009.
Mais uma vez, o Nordeste, especialmente seus estados tidos como mais pobres, apresentam taxas bem superiores à de São Paulo.
Enquanto as vendas paulistas cresceram a 4,1% em janeiro passado, as do Maranhão, Sergipe e Piauí se ampliam em 13,6% , 10,3% e 7,5%, respectivamente.
Os dados acima deixam dois alertas.
Primeiro que não se pode combater a crise atacando nossa âncora principal: o Brasil resiste apoiado no seu invejável mercado interno.
As medidas anti-crise devem, portanto, privilegiar a garantia do emprego, do consumo interno e da renda disponível da maioria dos brasileiros, levando em conta a diversidade do impacto nas diversas regiões do país.
Segundo, como diz Prahalad, professor da University of Michigan Business School, “a riqueza está na base da pirâmide”. É bom não se esquecer disso.
O Nordeste agradece. * Tânia Bacelar é economista, consultora e integra o Conselho Estadual de Desenvolvimento Econômico e Social de Pernambuco (CEDES/PE)