Por Vandson Holanda O lançamento na quarta-feira de Cinzas pela CNBB da Campanha da Fraternidade 2009 com a temática da Segurança Pública nos leva à reflexão sobre como a nossa sociedade chegou ao nível atual de desenvolvimento com indicadores de violência e de mortalidade típicos de comunidades medievais.
A cidade do Recife, por exemplo, pode ser considerada o retrato fiel e paradoxal da vida urbana em cidades violentas onde encontramos o moderno e luxuoso ao lado da tolerância e indiferença com a morte quando ocorrida em circunstâncias “previsíveis”.
Esta previsibilidade circunstancial nada mais é do que o paradigma pós-moderno enraizado culturalmente em nossa sociedade na qual, entre outros fatores, a pobreza é a principal culpada pela violência.
Nesse contexto lamentável se cria os motivos não-maslowianos na qual se aceita a existência de pessoas “matáveis”: pobres, negros, prostitutas, homossexuais, etc.
Estes “matáveis” são frutos também do paradigma social de viés marxista que joga a culpa de todas as debilidades humanas nas diferenças sociais.
Concomitantemente a sociedade nos apresenta outro modelo: quem não está inserido no establishment pode ser mais facilmente descartável (ou matável).
São discursos que, como todas as ideologias, não resolvem a chaga da violência nem solucionam as injustiças das desigualdades sociais.
Será que algum dos milhares de homicídios ocorridos em Pernambuco nos últimos doze meses teve algum vínculo com as necessidades primárias dos autores de cada assassinato?
Será que no mesmo período algum roubo, assalto ou outro tipo de violência teve ligação com as necessidades ligadas à sobrevivência humana como a fome?
Não precisa ser discípulo do psicólogo americano Abraham Maslow (1908-1970), célebre em motivação humana, para afirmar que a violência em Pernambuco e no Brasil não está ligada a esses problemas básicos.
Vincular pobreza à violência é desconhecer a realidade social e cultural das nossas periferias e cometer uma grande injustiça com a esmagadora maioria da população dessas localidades pobres que poderiam ser até exemplo para muitos ilustres que moram em castelos ou prédios luxuosos.
Num contra-senso incrível se criam novos paradigmas a partir de ideologias ultrapassadas para se reafirmar estigmas sócio-excludentes dos segmentos mais vulneráveis da sociedade.
Nesse contexto interesses político-eleitorais e econômicos deturpam o conceito de bem-comum tendo como eixo referencial o rico, como se o acumulo de bens fosse critério de ética e de justiça.
Como se vê é um equívoco se combater a pobreza para se diminuir a violência, mas sim, reduzir a pobreza para termos uma sociedade mais JUSTA, que é o alicerce da PAZ.
Pode qualquer governo fazer mega-investimentos na área social (o que é importante) que se não vier atrelado ao fortalecimento e independência das estruturas de Estado (o que inclui o Poder Judiciário e o Ministério Público) terá resultados pouco sustentáveis ou inexpressivos.
Não é à toa que os artífices da paz sempre foram, antes de tudo, promotores da justiça, em todos os sentidos, e que o lema da Campanha da Fraternidade 2009 é “a paz é fruto da justiça”.
Vandson Holanda é Coordenador da Pastoral da Saúde da Arquidiocese de Olinda e Recife e Secretário do Instituto Nacional de Biomedicina.
E-mail: vandsonholanda@uol.com.br