Por Rosângela Bittar O ministro José Gomes Temporão (PMDB-RJ), da Saúde, já havia se rebelado publicamente contra a desfaçatez com que seu partido pratica a gestão dos recursos públicos e foi mal sucedido ao tentar trocar a direção da Funasa (Fundação Nacional de Saúde, bunker pemedebista de cargos e verbas).
Anos atrás, o atual governador Roberto Requião (PMDB-PR) inventou, contra um colega de partido, o “disque Quércia”, expressão autoexplicativa.
O próprio presidente Lula já insultou o senador José Sarney (PMDB-AP), não houve processo e hoje são amigos e aliados.
O PMDB do Rio, que domina comissões no Parlamento como instrumento de pressão sobre o governo, atravessa períodos de intensas críticas e suspeitas sobre suas relações com Furnas, por exemplo, sem reagir ou se sentir impelido a torná-las transparentes.
Ninguém ignora, nem o eleitorado, as concepções e métodos do PMDB e o partido sabe disso: há cerca de 10 anos encomendou uma pesquisa, divulgada em convenção que realizou no Hotel Nacional, em Brasília, em que um dado deixou a platéia boquiaberta.
Os entrevistados declararam ser o PMDB o partido mais corrupto da política brasileira.
A informação foi transmitida à imprensa, numa entrevista coletiva, sem o menor sinal de constrangimento ou preocupação.
Afirmou-se, na ocasião, que a direção tudo faria para superar esta imagem impregnada, por alguma razão, no imaginário do eleitorado.
A entrevista do senador Jarbas Vasconcelos (PMDB) à revista “Veja” é mais um desses momentos em que seu partido, e o governo Lula, a quem o senador se opõe politicamente em dissidência , se veem diante de um perfil desprezível, traçado por uma voz contundente, uma fala substantiva, um discurso político, como há muito se cobrava à oposição.
Jarbas não observou conveniências e tudo no seu discurso fez sentido.
Não há novidade no que disse o senador e nem em sua atitude, sempre coerente.
Já no discurso inaugural de início de mandato, em 2007, Jarbas Vasconcelos apresentou um olhar em perspectiva não só sobre o seu partido como sobre a política em geral.
De volta ao Congresso, depois de 21 anos de mandatos no Executivo, explicitou um manual de atitudes sobre a prática da democracia e o exercício da oposição.
Não condenou as alianças, mas alertou que em paises com grande fragilidade do quadro partidário, embora as alianças sejam necessárias para governar, é preciso ter como base o respeito ao pluralismo partidário e expressar um programa de governo com objetivos definidos.
Não vendo no PT esta condição, o senador defendeu que o PMDB ficasse como “principal escoadouro das esperanças em construir um Brasil melhor e mais justo”.
Não convenceu o PMDB, postou-se na dissidência minoritária de oposição e a defendeu como direito.
O senador não destoa agora de seu pronunciamento mas deve constatar que tanto antes como hoje prega ao vento.
Os pemedebistas insultados (eles devem saber com quem Jarbas Vasconcelos está falando) fingem-se de desentendidos.
Provavelmente pelo temor de reagir.
Talvez deduzam que, mesmo sendo um discurso político, pode haver provas e, se as há, qualquer movimento em falso faz o caso virar um incontrolável “mensalão”.
O senador Renan Calheiros, de volta ao cargo de líder do partido depois de graves acusações que sofreu no campo da moral e da ética, faz-se de mouco.
O senador José Sarney, presidente do Senado, não repudia a constatação de que sua eleição é retrocesso e continua, como esteve durante a campanha, sem dizer qual projeto tem à frente da Casa.
Seus mais próximos preferem apegar-se à idéia de que é possível explorar uma ambiguidade, de resto inexistente, no conceito de que o presidente vai transformar o Senado em um “grande Maranhão”.
Resolveram achar poético, romântico, como a censura certamente achou quando liberou Chico Buarque na ironia à ditadura, ao prever que “esta terra ainda vai tornar-se um imenso Portugal”.
Renan e Sarney apadrinham a maior parte dos cargos que o PMDB quer, na avaliação do senador Jarbas Vasconcelos, para fazer negócios e ganhar comissões.
A maioria do partido se especializou, reforça o senador, “nessas coisas pelas quais os governos são denunciados: manipulação de licitações, contratações dirigidas, corrupção em geral”.
Os jornais mostraram ontem que a metade dos senadores do PMDB responde a inquéritos ou ações penais no Supremo Tribunal Federal.
Segundo levantamento do jornal O Globo, 40% da bancada pemedebista do Senado são investigados por crimes de corrupção, formação de quadrilha, falsidade ideológica, compra de votos.
Jarbas Vasconcelos não foi, como se vê, leviano nem injusto.
Fez uma manifestação política, e é pena que os políticos recusem mais esta oportunidade de recomeçar do zero.