Por Carol Carvalho e Felipe Lima Antônio Cláudio Cysneiros Cavalcanti Júnior está à frente da Brastex, ex-Algodoeira Paulista, há um ano e quatro meses.
Nesse tempo, foi responsável por reativar e aprimorar um programa de responsabilidade social baseado na inserção de ex-presidiários no mercado de trabalho único no Estado.
Ele deixa bem claro, no entanto, que não foi o autor da ideia.
A ação teve iníco em 2000, quando a coordenadora de Recursos Humanos da empresa, Roseneide Carvalho, sugeriu ao antigo dono, Sílvio Chaves, abrir as portas da empresa para reeducandos - presos que mostraram bom comportamento na cadeia e foram selecionados pela Chefia de Apoio a Egressos e Liberados (CAEL) e que, por isso, ganharam a oportunidade de trabalhar para reduzir a pena. “Conheci por acaso o gerente da Chefia de Apoio a Egressos e Liberados (CAEL), Carlos Albuquerque.
Ele era o responsável pela ressocialização dos detentos naquele momento e me disse que gostaria de levar os reeducandos para as empresas privadas.
Apresentei a proposta para o então diretor, que aprovou”, explica Roseneide.
O novo dono da Brastex viu no programa a chance de colocar em prática ações que viu serem cobradas na empresa onde trabalhava. “De seis em seis meses, a empresa de embalagens onde eu era funcionário recebia uma auditoria externa.
Por ser fornecedora de uma grande rede varejista, éramos auditados desde a qualidade da matéria-prima utilizada em nossos processos, até as ações sociais implementadas pela empresa.
Foi ai que percebi a importância da responsabilidade social para o desenvolvimento empresarial de um negócio”, conta. “Quando as pessoas encaminhadas pela CAEL chegam na Brastex procuro me reunir com eles.
Formo grupos de quatro ou cinco pessoas, no máximo, e sento para conversar.
Falo que espero que eles trabalhem, se comprometam com a fábrica.
Só permanecem os que estão de fato comprometidos.
Exijo deles um comportamento igual com os outros funcionários para que eles sejam respeitados.
E, acima de tudo, digo que faltas são inadmissíveis”, explica o empresário.
Como os reeducandos não são beneficiados com os direitos previstos pela Consolidação das Leis do trabalho (CLT) - tais como o recolhimento do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) ou do Instituto Nacional da Seguridade Social (INSS) - Cavalcanti Júnior paga a alimentação e dá uma cesta básica a todos eles. “Não procuro saber qual foi o crime que eles cometeram.
Quero saber se eles estão dispostos a abraçar a oportunidade”, resume.
Cavalcanti Júnior abriu uma exceção apenas.
Um dos reeducandos foi conversar com ele pessoalmente para que ele falasse com o juiz para que ele cumprisse o resto da pena em liberdade e não em regime semi-aberto. “Argumentei que não poderia fazer isso.
Mas escrevi uma declaração em nome da empresa atestando que ele era um funcionário exemplar.
Por fim, ele conseguiu.
A verdade é que eu acredito nesse pessoal.
Acredito que com a chance de ter um salário para sustentar a esposa e os filhos, ele vai largar o mundo do crime”.
Na avaliação do empresário, os reeducandos são normalmente bastante atenciosos.
Confiante na regeneração, Cavalcanti Júnior não aposta em recaídas, nem cogitou reforçar a segurança da empresa e até hoje não sofreu nenhum tipo de assalto, ou levantou suspeita entre os reeducandos da Brastex. “Me interessa se são trabalhadores, pessoas que estão querendo ser reenquadradas.
Afasto qualquer um que eu saiba que não está querendo aquela oportunidade que estou querendo dar, que é uma coisa rara”, enfatiza.
Isso não significa que não tenham havido decepções.
Certa vez, recebeu um telefonema da gerente da CAEL, Zuleide Lima de Oliveira, pedindo atenção para um caso especial - ela narrou que um dos reeducandos atendidos pela CAEL perdeu a esposa tragicamente em acidente com ônibus, e estava penando para criar dois filhos pequenos. “Esse rapaz, por conta disso, cometeu alguns delitos.
Eu disse, olha, manda ele pra cá que vou atender o seu pedido.
Não estou precisando, não tenho vaga, mas vou ajudar já que os meninos estão morrendo de fome.
Ele chegou na empresa, disse que estava faminto, adiantamos R$ 10 para que comprasse pão e leite para os filhos.Depois ele partiu e não voltou mais.
O primeiro que aconteceu isso, com o emprego na mão, foi embora e não deu satisfação”, conta Cavalcanti Junior.
Em outro caso, Cavalcanti Júnior minimiza a frustração.
Uma das reeducandas que trabalha na parte de limpeza da fábrica, seis meses e um dia após ter sido contratada com carteira assinada, pediu para ser demitida.
Queria apenas ter cumprido o tempo previsto por lei para pleitear um seguro-desemprego. “Ela me disse que iria usar o dinheiro para abrir um bar.
Atendi o seu pedido e providenciei o seu desligamento.
Não queria estragar a oportunidade dela se tornar uma empreendedora”, conta. “Muitos acham a ideia de contratar ex-presidiários ou receber pessoas que ainda cumprem pena surpreendente.
Uns acham revolucionária.
Outros dizem que nunca teriam coragem.
Muitos dizem nunca terem ouvido falar de algo assim.
Mas a maioria fala que não o fariam.
Na semana retrasada, por exemplo, consegui fechar um contrato com uma rede atacadista que atua em todo o Norte/Nordeste falando do programa da Brastex.
E olhe que já havia trê smeses que eu tentava conquistar esse cliente”, diz satisfeito.
OUTRAS AÇÕES Além da considerável economia com os encargos trabalhistas, o empreendedor encontrou outras formas de cortar gastos que denotam ainda preocupação com o meio ambiente.
Os panos de limpeza confeccionados, por exemplo, são de material reciclado.
Cavalcanti Junior compra trapos - pedaços de tecidos que, de tão pequenos, não têm utilidade para fábricas de confecção - direto de trabalhadores que vão até a porta da Brastex. “Esse material é doado aos que fazem a limpeza das confecções.
São produtos ecologicamente corretos porque têm origem de reciclados, e também não fazemos nenhum tipo de tingimento.
Na linha de algodão, idem, os fios são aproveitados de empresas que trabalham com fiação e descartam aquele produto menor, utilizados por nós para fazer o algodão hidrófilo”, explica.
A matéria-prima faz diferença também na conta de energia.
Segundo Luiz Martinho Maia de Sousa, sócio de Cavalcanti Júnior, a empresa gasta 60 kw/h na confecção de mil panos, enquanto que, se utilizasse tecidos, o consumo subiria para 550 kw/h.
Isto porque os panos de limpeza produzidos na Brastex têm 90% de algodão, sendo as máquinas de tecelagem as principais responsáveis pela economia.
Já na unidade localizada em Rio Tinto, Paraíba, a maior parte da mão de obra é indígena.
São 26 funcionários oriundos de uma aldeia local.
Nessa fábrica é feito o processamento das da pequenas fibras de tecido que a empresa adquire de para se transformar em panos de limpeza dentro da unidade localizada em Paulista, no Grande Recife.
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