O androide da Casa Branca Por Diogo Mainardi O androide é acionado. É uma réplica exata de Abraham Lincoln, o presidente dos Estados Unidos, morto em 1865.

Há uma grande expectativa por parte de seus idealizadores, donos de uma fábrica de instrumentos musicais de Idaho.

Depois de alguns instantes, o androide abre a boca e pronuncia suas primeiras palavras.

Um defeito elétrico permite que ele fale apenas de trás para a frente.

Abraham Lincoln tem de ser consertado.

A passagem anterior é de We Can Build You, de Philip K.

Dick.

Qualquer romance que contenha um androide é um mau romance.

Qualquer romance ambientado no futuro é um mau romance.

Um mau romance – contendo um androide e ambientado no futuro – é o que melhor representa o presente.

O presente é ele: Barack Obama.

A analogia com o romance de Philip K.

Dick é simples.

Desde que foi eleito, Barack Obama apropriou-se da imagem de Abraham Lincoln.

Ele seguiu seus passos, apresentando-se despudoradamente como sua réplica.

O mimetismo intensificou-se nas últimas semanas.

A caminho de Washington, ele reproduziu a viagem de trem de Abraham Lincoln.

Depois discursou no Lincoln Memorial.

Depois usou a Bíblia do antigo presidente em seu juramento.

No dia da posse, em seu primeiro discurso, ao contrário do androide de Philip K.

Dick, Barack Obama evitou falar de trás para a frente (só Aretha Franklin, por causa de um defeito elétrico, cantou num patoá desconhecido), mas pronunciou vacuidades igualmente desprovidas de significado sobre o fim das ideologias, a economia de mercado, a regulamentação financeira, a energia alternativa e o terrorismo árabe.

O paralelo com Abraham Lincoln foi soprado pelos marqueteiros do próprio Barack Obama.

A imprensa diligentemente tratou de espalhá-lo. É assim que trabalha a imprensa nos tempos de Barack Obama: ecoa a propaganda presidencial.

A estratégia de associá-lo a Abraham Lincoln revela o aspecto mais aventureiro e caricaturesco da figura do presidente americano.

Ele está para Abraham Lincoln assim como Hugo Chávez está para Simon Bolívar.

Benito Mussolini sempre era comparado aos imperadores romanos.

Ele compreendeu perfeitamente a utilidade de se agregar a um passado glorioso, organizando festividades como o bimilenário de Virgílio ou de Augusto (este último, depois da conquista da Etiópia).

Num documentário americano de 1933, o narrador Lowell Thomas, embevecido por um de seus discursos, comenta: “O momento é solene: César renasce”.

O androide de Abraham Lincoln oferece bons conselhos ao protagonista do romance de Philip K.

Dick.

Até o dia em que ele manifesta seu lado esquizoide, que o impede de agir, como o Abraham Lincoln original.

Barack Obama não é um Abraham Lincoln.

Ele é apenas seu simulacro com a fiação invertida.