Por Ana Lúcia Andrade e Ciro Carlos Rocha, de Política / JC politica@jc.com.br Continuação da entrevista acima JC - O senhor buscou, recentemente, sua reconciliação com o senador Jarbas Vasconcelos.

Tem algum outro político com quem senhor considera que ainda precisa passar algo a limpo?

CARLOS WILSON - Não, acho que não.

Pelo contrário, me dou bem com todo mundo.

Consegui voltar a ter aquele perfil de procurar as pessoas, gosto disso.

Quero que Deus me dê saúde, e muita, para que eu possa usufruir desse temperamento que tenho de conviver com as pessoas.

Tenho 35 anos de vida pública.

Não tenho mais vontade de continuar nisso.

Acho que já dei a minha contribuição.

Acho que André (o irmão André Campos) está aí, foi muito ruim ele ter perdido a eleição de Jaboatão, a gente pensava que ele iria ganhar, mas política é política e tudo pode acontecer.

Ele pode tocar, outros podem tocar.

Eu não acho que política é uma indústria familiar.

Nunca fui favorável a isso.

Cada um encontre seu caminho. É importante que aconteça o processo de renovação em Pernambuco.

Não estou saindo porque estou em tratamento, nada disso.

Eu quero fazer um bom mandato, nesses dois anos e pouco que me restam, e depois vamos ver.

O Congresso hoje, para mim, é muito diferente do de doutor Ulisses, do de doutor Tancredo, do de Magalhães Pinto.

Eu tive a sorte de conviver com essas pessoas.

JC – Ficam muitas frustrações da política?

O que faltou ter conquistado?

CARLOS WILSON - Não é frustração, mas eu gostaria de ter sido prefeito do Recife.

E uma coisa que eu acho errado é não se fazer escola.

O mandato de vereador teria sido importante, para conhecer melhor a cidade.

Mas seria um presente ter sido prefeito do Recife.

JC – O senhor participou de momentos muito marcantes da política.

Tem algum que considera que não ficou esclarecido?

Que não foi bem compreendido e que precisa ser melhor explicado?

CARLOS WILSON - O tempo se encarregou de muita coisa.

Sempre tive muita sorte e capacidade de me recuperar perante às pessoas que não me julgaram correto.

Quando veio 94, antes disso minha relação com Jarbas tinha se agravado…

Já estava em dificuldade em 90, no governo, e em 92 tinha a eleição de prefeito.

Estava certo de que Jarbas ia ser governador de Pernambuco em 90, então o candidato natural a prefeito do Recife, em 92, seria eu.

Jarbas dizia que jamais seria candidato de novo.

Quando faltavam 24 horas do prazo de registro de candidatura, recebi um telegrama de Dorany (presidente do PMDB, Dorany Sampaio) me convidando para o lançamento da candidatura de Jarbas a prefeito.

Aí estourei de novo com o PMDB, rompi com o PMDB, me desfiliei e me incorporei à candidatura de Humberto Costa.

Foi aí que me aproximei desse pessoal, Bruno Maranhão…

Fiz a campanha de Humberto com todas as forças.

Tinha muita briga com Jarbas, bate boca pelos jornais, ficou muito ruim para mim.

Quando foi 94 veio Lula.

Ele foi lá em casa, com Bruno Maranhão e outros, lá em Brasília, e me disse: “Carlos Wilson, você tem que se filar a um partido alternativo para gente ver com quem podemos fazer essas alianças.

JC - E sua trajetória partidária, como entrou no PMDB, nos anos 80?

CARLOS WILSON - Fui para PMDB através de Ulisses, de Jarbas, de Marcos Freire e de Arraes.

Nessa época, Arraes ia muito ao meu gabinete, porque ele sempre foi uma pessoa aliancista e o meu gabinete era o canto mais fácil para ele buscar essas alianças.

Se criou uma aproximação muito forte entre nós.

Mas eu estava num fogo cruzado porque Arraes, Jarbas e Marcos Freire nunca se entenderam.

E se você pendesse para um, o outro ficaria desconfiado de você.

Quando Arraes voltou, em 82, voltou preparado para ser candidato a governador e não aceitava a candidatura de Marcos Freire.

Jarbas sustentava a candidatura de Marcos.

Aí nasceu a briga entre eles.

Veio a eleição, eu já no PMDB.

A gente perdeu a eleição com o voto vinculado.

Roberto Magalhães, que não era um candidato muito forte, mas era o da estrutura partidária, derrotou Marcos.

Mas ficamos juntos em Brasília (como deputados federais) e eu no meio de Jarbas e Arraes.

E o pau quebrando entre os dois.

Jarbas começou a se isolar por aí.

JC – Aí veio a eleição de 85…

CARLOS WILSON – Em 85 a gente teve que se juntar porque Marcos Freire debandou, Sérgio Guerra também, e Sérgio Murilo (foi candidato a prefeito pelo PMDB com apoio do PDS).

Eu não era tido como radical, mas fiz a opção de ficar com Jarbas e Arraes.

Era uma questão de sobrevivência de Arraes apoiar a candidatura de Jarbas (à Prefeitura do Recife, pelo PSB).

Jarbas chegou a ficar atrás de Sérgio Murilo por 15 pontos.

A gente fez de tudo: Arraes foi para a rua, Jarbas também era um bom candidato, a gente se juntou e ganhou muito apertado.

Aí se consolidou a candidatura de Arraes em 86.

Eu lembro que a campanha era ‘Jarbas em 85 e Arraes em 86’.

Já se fazia a vinculação: as faixas, os comícios, eram todos vinculando Jarbas e Arraes.

E veio um fato, em que considero que dei o maior salto político na minha carreira: o convite para ser vice-governador (de Arraes).

Meu pai tinha sido cassado mas nunca se conformou com a cassação.

Só tinha uma chance para papai que era ser deputado federal.

Aí Arraes disse para mim, numa dessas conversas: “Vice não se faz aliança, vice é uma escolha pessoal do governador porque não é votado, tem que ser alguém de confiança.

E eu tenho certeza de que você não vai desejar nem que eu morra, nem vai querer me derrubar.

Então eu não aceito os nomes que Jarbas está colocando”.

Jarbas tinha colocado os nomes de Edgar Moury, Egídio (Ferreira Lima) e o de Cristina Tavares.

Mas Arraes disse: “meu nome é Carlos Wilson.

Só serei candidato se tiver o mínimo de direito de escolher o meu vice”.

E me escolheu.

E eu pensei: “bom, posso perder a eleição, eleição é eleição, mas meu pai volta (ao Congresso).

E graças a Deus meu pai se elegeu.

JC - A rivalidade Jarbas/Arraes se dava em função da força da liderança de ambos?

Um não admitia espaço para o outro?

CARLOS WILSON - Eles se respeitavam, mas cada um queria ser o líder maior.

Arraes era governador e Jarbas queria manter o espaço dele.

Era prefeito, saiu da prefeitura em 88 já preparado para ser o sucessor de Arraes e Arraes não queria.

Tanto que ele criou aquela chapinha (em 90) que derrotou Jarbas.

Jarbas era um candidato imbatível e perdeu a eleição para Joaquim Francisco.

Foi quando Arraes então me chamou e me disse que não iria ficar sem mandato.

Ele ficou muito machucado porque não foi candidato a presidente da República em 89.

Queria sair do governo de Pernambuco.

Só que doutor Ulisses não abria para ninguém.

Teve uma famosa reunião, na casa de doutor Ulisses, quando dona Mora, esposa dele, entrou na sala e disse: “Como é que Ulisses pode ser presidente do PMDB, das Diretas, da Constituinte, e não pode ser presidente da República!” Dona Mora disse isso!

Todos se calaram.

E doutor Ulisses saiu candidato a presidente.

Mas não decolou.

O próprio Arraes não tinha interesse nela.

Quem ficou sustentando a candidatura dele, aqui, fui eu.

Eu e Jarbas.

JC - Em que ocasião essa relação do senhor com Jarbas se perdeu?

CARLOS WILSON - Foi em 90, no (meu) governo.

Arraes começou a criar problemas para mim no governo.

Antes ele tinha me dito que eu era o governador. “Faça o que você quiser”.

Mas ele queria largar o governo para ser candidato a deputado e eu fiquei numa dúvida muito grande: se assumisse o governo não seria candidato a deputado.

Se saísse candidato provavelmente me elegeria porque tinha base.

Fui me aconselhar com doutor Ulisses e ele me disse: “Meu filho, já fui tudo: presidente da Câmara, da Constituinte, do PMDB, das Diretas, era “o bota fé no velhinho” (slogan da campanha de 89), e não me elegi presidente da República porque não tinha base.

O importante é ter o retrato na galeria dos ex-governadores porque seus filhos e amigos vão se lembrar sempre”.

Foi aí que aceitei ficar no governo mas com a condição de mudar algumas coisas.

Tive que tirar algumas pessoas para dar a minha cara (ao governo).

Fui buscar a força do PCdoB com Waldemar Borges, Roberto Freire, Raul Jungmann.

Meu governo teve mais comunista do que qualquer outro em Pernambuco.

Só que Arraes não gostava de comunista.

JC - E ainda diziam que ele era um comunista…

CARLOS WILSON - (risos) É, diziam que ele era comunista.

Arraes me perguntou quem eu gostaria de tirar (do governo).

Tânia Bacelar era fundamental para eu assumir o governo.

Pedro Eugênio, Zé Almino, que era o secretário de Agricultura e sobrinho de Arraes, doutor Nuto (José Nuto) no Bandepe também.

Algumas pessoas, que cercavam Arraes, fizeram intrigas, diziam que eu queria fazer um governo independente.

Quando começou a campanha de 90, fiz uma reunião do secretariado para alertar a todos que não se metessem em campanha porque isso traria problemas para o governo.

Nada de segurar.

Fiz outra reunião e ameacei: “Se amanhã eu ler nos jornais que determinado secretário está manifestando uma opção por um candidato, não vou aceitar”.

No dia seguinte, Zé Almino briga com Cristina Tavares (candidata a deputada federal).

Uma briga feroz.

Então eu o demiti e doutor Arraes mandou me chamar.

Disse que eu estava fazendo uma ruptura com seu pessoal e chamou Inaldo Sampaio (colunista do JC) e disse, não que foi o “caminho da perdição”, o que ele dizia com Jarbas, mas comigo ele disse que eu me distanciava dele.

JC - O ingresso ao PSDB, foi para cumprir uma tarefa delegada pelo presidente Lula?

CARLOS WILSON - Depois de 89 o projeto era sempre Lula.

Eu votei em doutor Ulisses, em 89, e no 2º turno já me incorporei a Lula e ele me convenceu a entrar no PSDB.

Só que eu fiz minha campanha (para o Senado em 94) a mais leve que eu poderia fazer.

Procurava não dar brecha para que ninguém falasse de mim.

Jarbas me esqueceu.

Porque era impossível me eleger senador, na cabeça deles.

Só que o PFL foi muito correto comigo.

E fui mais votado do que Roberto Freire, no Recife.

Arraes achava que ia puxar Armando Monteiro (Armando Monteiro Filho) e Roberto Freire.

Mas eu recebia voto de um lado e de outro.

Já em 96, Braga (João Braga) resolveu ser candidato a prefeito.

Eu o apoiei contra Roberto Magalhães e esse povo todo.

O nacional (do PSDB) apoiava Magalhães.

Mas eu apoiei meus companheiros do PSDB.

A campanha Braga contra Magalhães foi extremamente radicalizada.

E o ódio de Jarbas se voltou para mim.

Em 98, cometi o maior erro político da minha vida: fui candidato a governador porque achava que Arraes não seria candidato à reeleição numa situação de completa adversa.

Ele foi e perdeu.

JC - Por que ele disputou?

CARLOS WILSON - Para sustentar o grupo.

Os deputados estimularam a candidatura de Arraes e o velho era um valente.

Aí eu radicalizei a campanha, burramente.

Nem Jarbas nem Arraes.

Poupava Arraes, de quem tinha sido vice e tinha uma certa ligação, e fui para cima de Jarbas, injustamente.

Me arrependo profundamente da campanha de 98.

Disse tudo o que podia dizer.

Eu errei, errei muito.

Fui para o campo pessoal.

Meu perfil nunca foi de briga.

Mas aí eu errei, errei, errei muito.

Aí, foi quando fui para o PPS, em 2000.

O PPS é um partido respeitado mas não tem lastro.

A gente começou a campanha (a prefeito) bem, mas o pessoal de Jarbas destruiu minha candidatura com o negócio de dívida da campanha de 98.

Aquilo me atingiu duramente e João Paulo ficou navegando em mares tranquilos.

Adotamos então a estratégia de derrotar Roberto Magalhães.

Fizemos aquela carreata em Boa Viagem.

JC - O que aconteceu, de fato, naquele episódio?

CARLOS WILSON - A gente pediu ao TRE para sair uma carreata às nove horas da manhã e eles às onze.

Quando entramos na avenida Boa Viagem, sentimos que eles iriam colar na gente.

Pedi então para irmos devagar.

Quando chegou em frente à padaria Boa Viagem atravessamos o carro e fizemos um mini-comício.

Eles lá atrás, porque não podiam avançar.

E o pessoal do PT, sempre muito preparado para irritar os outros, provocaram eles.

Jarbas ficou irritado, querendo dar tapa em todo mundo…

Magalhães não aguentou.

Nossa estratégia era desestabilizá-lo porque sabia que não ia para o segundo turno.

Já tinha vestido a camisa do PT.

JC - Então Magalhães está certo quando diz que a provocação veio da carreata de Carlos Wilson?

CARLOS WILSON - Eu nunca, nunca, nunca disse que não foi.

Eu apenas acho que quando a gente é candidato deve estar preparado para qualquer tipo de provocação…

Fiz tudo dentro das regras do jogo.

Agora ele (Magalhães) perdeu a cabeça, deu a banana, e isso lhe custou cinco mil votos, três mil votos.

Uma derrota que ele nem esquece, e o que é pior, aquilo ficou fazendo mal a ele.

Até hoje é uma coisa que doutor Roberto não se resolveu.

JC – O que levou o senhor a vestir a camisa do PT, tão ardorosamente?

CARLOS WILSON - Roberto Magalhães.

Aquela campanha que fizeram contra mim (em 98).

Pegaram a televisão e me chamaram de caloteiro: foram dez minutos com uma mulher chorando na televisão dizendo que eu não tinha pago um cachorro quente.