Por Antonio Carlos Pannunzio O projeto definido e aplicado à risca pelo Brasil quando, no governo Fernando Henrique Cardoso, promoveu a privatização dos serviços de telefonia fixa, resultou na divisão destes, antes concentrados nas empresas públicas controladas pela Telebrás, entre uma pluralidade de grupos privados.
Esse modelo, que tende a encorajar a concorrência entre as teles, levando-as a disputar o mercado, começou a ser desmontado em dezembro de 2004, em benefício da Oi, como foi rebatizada a antiga Telemar.
Naquela data, a empresa de telefonia foi tomada de súbito interesse pelo mercado de jogos a serem distribuídos pelas exploradoras da telefonia celular.
Para alcançar esse novo objetivo, adquiriu 35% das ações de uma desenvolvedora de tais produtos, a Gamecorp, cujo sócio mais conhecido é o empresário Fábio Luiz da Silva, filho do presidente da República.
Nos meses seguintes, a Oi iniciou sondagens sobre a possibilidade de adquirir a fatia da Brasil Telecom (BrT) pertencente aos italianos da Telecom Italia (TI), à época sócia da BrT.
Desde o início, o fruto previsível da iniciativa seria a entrega da telefonia fixa no Brasil a um monopólio privado, cujo capital, brasileiro a princípio, a qualquer momento, poderia passar ao controle de acionistas estrangeiros - o que contrariava um princípio básico da privatização realizada na era FHC.
O possível abandono de tal princípio fez com que em julho de 2006, dez dias após o movimento inicial da Oi, o ministro das Comunicações Hélio Costa, falando em nome do presidente da República negasse qualquer intenção do governo de mudar as regras relativas à telefonia, para viabilizar a formação da BrT/Oi.
O ministro, aparentava falar sério mas tudo saiu ao contrário do que disse na ocasião.
O governo Lula mudou as regras e, paulatinamente, veio dando legalidade formal ao monopólio privado da telefonia fixa.
Graças a essas transformações sua formalização é iminente.
Para tornar isso viável, o governo se desdobrou.
Mudou a composição da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), substituindo conselheiros contrários à operação, cujo mandato estava se extinguindo, por outros, favoráveis a ela.
E ainda injetou no negócio R$ 4,3 bilhões extraídos dos cofres do Banco do Brasil.
Essa mudança nas regras do jogo, urdida de forma escancarada no Palácio do Planalto, tem como efeito colateral o virtual desaparecimento da concorrência na área da telefonia fixa.
Com isso, milhões de consumidores brasileiros sairão perdendo.
Em contrapartida, uns poucos amigos do rei vão ganhar muito dinheiro.Um deles, certamente, é o acionista da Gamecorp, antes mencionado, que passou de talentoso desenvolvedor de jogos para telefones celular a comandante de uma empresa que tem como acionista minoritária a gigantesca BrT/Oi, em vias de nascimento.
Não fora isso tudo suficiente, sendo a telefonia um setor privatizado, não tem o governo como impedir que esse monopólio reconstruído à custa de recursos públicos, alterações na legislação sobre a telefonia fixa e mudanças nos quadros dirigentes da Anatel tenha, em futuro próximo ou remoto, seu controle adquirido por empresas estrangeiras.
O Brasil perderia patrimônio por ela representado, os ganhos por ela gerados seriam embolsados pelos investidores externos e ao País somente restariam os prejuízos de toda ordem gerados por tal situação.
Um antigo dirigente sindical, que durante um período relativamente longo foi o principal político de oposição do País, costumava chamar coisas assim de maracutaia.
Mas, atualmente, em vez de definir a natureza delas, prefere projetá-las e dirigir a montagem delas.
PS: Antonio Carlos Pannunzio é deputado federal pelo PSDB-SP e membro da Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional.