Por Isaltino Nascimento Conceição das Crioulas, comunidade remanescente quilombola fincada em Salgueiro, no Sertão Central, é uma das vozes mais poderosas da resistência negra em Pernambuco.

E o que faz com que esses quase 4 mil homens, mulheres e crianças despontem como ícones desta identidade étnica?

A resposta é simples: bravura, união e organização comunitária.

Motores que impulsionam a luta – árdua – pela reconquista dos 70% de suas terras que hoje estão nas mãos de fazendeiros.

Em reconhecimento ao seu espírito libertário, Conceição das Crioulas será agraciada na próxima quinta-feira (20), Dia Nacional da Consciência Negra, com a Medalha Zumbi dos Palmares pela Assembléia Legislativa de Pernambuco.

A honraria, criada a partir de resolução de minha autoria no ano de 2004, é entregue anualmente a instituição ou personalidade que se destaque na promoção e defesa dos direitos dos afro-descendentes.

Os exemplos de Conceição das Crioulas são muitos, no passado e agora.

A história da fundação da comunidade, ocorrida no século XVIII, é emblemática.

O dinheiro com o qual se pagou a escritura das terras foi fruto da venda do algodão cultivado e fiado por seis negras, entre elas Francisca Ferreira da Silva.

Falando hoje parece fácil.

Mas aquelas mulheres enfrentaram sol a pino, dia após dia, no plantio, na colheita e depois no beneficiamento da planta.

E numa época na qual transporte era uma raridade, foram vender suas mercadorias no município de Flores, fazendo todo o trajeto a pé ou em lombo de burro.

Num esforço para adquirir aquelas terras que ainda hoje serve de exemplo para as atuais guerreiras e guerreiros que lutam por melhores dias para a comunidade.

A gente de Conceição das Crioulas não parou no tempo, apesar de estar separada por 52 quilômetros da sede do município de Salgueiro, onde só se chega por meio de uma estraga pedregosa.

Está organizada por meio da Associação Quilombola de Conceição das Crioulas, que entre seus integrantes tem a guerreira Aparecida Mendes.

Na sede da AQCC, Cida, seu Andrelino (da nona geração de Francisca Ferreira da Silva), Adalmir, Marcelino, Maria Zélia, Celsa, Antônio, Maria Roseane, entre tantos outros, lutam pela reconquista das terras tomadas por fazendeiros e vão além.

Desenvolvem projetos de agricultura familiar, artesanato, beneficiamento de frutas, mantêm um site na internet (www.conceicaodascrioulas.org), publicam um jornalzinho, fazem documentários em vídeo, estão preparados para colocar no ar uma rádio comunitária, mantendo acesa a chama da identidade étnica que muitos já lhes tentaram roubar.

A comunidade de Conceição das Crioulas também atua na Comissão Estadual de Articulação das Comunidades Quilombolas, nos fóruns nacionais e pensa o problema quilombola não apenas pelo seu umbigo, mas com uma visão macro, que diz respeito a todas as comunidades remanescentes de quilombo existentes no Brasil.

Também subscrevem a Carta de Pernambuco, documento consolidado em conjunto com as entidades do movimento negro do Estado que cobra a aprovação imediata do projeto de Lei 3.198, mais conhecido como Estatuto da Igualdade Racial.

Como se vê uma gente merecedora não apenas da Medalha Zumbi dos Palmares, mas das muitas honrarias que se deve prestar a um povo de espírito tão guerreiro.

Isaltino Nascimento (www.isaltinopt.com.br), deputado estadual pelo PT e líder do governo na Assembléia Legislativa, escreve para o Blog todas às terças-feiras.