Na semana passada, Itaú e Unibanco juntaram-se para criar a maior instituição financeira do país e da América Latina.

A fusão foi divulgada na manhã da segunda-feira e deu alento ao sistema financeiro brasileiro, em meio à mais séria crise mundial em oito décadas.

Unidos, os dois bancos possuem ativos de 575 bilhões de reais, 14,5 milhões de clientes e 100 000 funcionários.

Tornam-se o maior banco do país, superando o Banco do Brasil e o Bradesco.

Na tarde de quarta-feira, os protagonistas do negócio deram uma entrevista conjunta a VEJA na sede do Itaú.

Roberto Setubal, 54 anos, presidente do Itaú, e Pedro Moreira Salles, 49 anos, presidente do Unibanco, disseram que vão seguir o exemplo das empresas brasileiras que já se internacionalizaram e minimizaram a influência da turbulência financeira na decisão de fechar o negócio. “A associação ocorreria da mesma maneira, com ou sem crise”, disse Setubal. “Nossos objetivos não foram pautados por questões momentâneas”, completou Moreira Salles.

O controle do novo gigante financeiro, o Itaú Unibanco, será compartilhado.

A presidência do conselho de administração ficará a cargo de Moreira Salles.

Setubal será o presidente executivo.

O que motivou a associação entre o Itaú e o Unibanco?

Moreira Salles – O que norteou as conversas desde o início foi a percepção de que, em um mundo cada vez mais globalizado, o poder da escala das empresas é fundamental.

Assim como sua capacidade de internacionalização.

Muitas indústrias já conseguiram dar o salto para o exterior.

Mas não existe uma única multinacional financeira brasileira, embora os bancos nacionais sejam tão bem administrados.

Sempre me perguntei por que não tínhamos uma AmBev dos bancos.

O Itaú e o Unibanco têm uma identidade na forma de ver o mundo.

A operação faz todo o sentido.

Setubal – Somos dois bancos que nunca tiveram um tropeço financeiro ou um tropeço ético.

Temos, em comum, valores e tradição familiar sólidos.

Tanto o pai do Pedro (o embaixador Walther Moreira Salles, que morreu em 2001) quanto o meu pai (Olavo Setubal, morto em agosto passado) foram ministros de estado, ambos com comprometimento de longa data com o sucesso deste país.

O Brasil certamente merece um banco de dimensão internacional.

Achamos que o Itaú Unibanco Holding pode vir a ser esse banco.

Esse é o nosso grande sonho e motivação.

A crise apressou o fechamento do negócio?

Setubal – A associação ocorreria da mesma maneira, com ou sem crise.

Mas a crise acelerou o negócio?

Talvez em apenas um mês.

Pensando bem, a crise pode até ter retardado o negócio em um mês.

Moreira Salles – A lógica desta fusão independe da situação atual do mercado.

Não sabíamos que a crise viria.

Tivemos uma dezena de conversas antes da tormenta financeira.

Com essa transação, pretendemos olhar para a frente.

Nossos objetivos não foram pautados por questões momentâneas.

Houve rumores de que os bancos privados tinham perdido muito dinheiro com derivativos.

Não é verdade, como ficou demonstrado.

Setubal – Devido a esses rumores, divulgamos antecipadamente nossos balanços do terceiro trimestre.

Isso dissipou qualquer dúvida sobre a situação dos bancos.

Quando a fusão foi cogitada pela primeira vez?

Moreira Salles – Em 1998, quando o Banco Real foi vendido ao holandês ABN Amro.

Isso nos colocava um novo desafio.

Lembro que meu pai foi um grande entusiasta de uma união com o Itaú naquela ocasião.

Ele até ficou bravo comigo porque o negócio não foi levado adiante.

Achou, com muita razão, que tínhamos de olhar para o futuro.

Setubal – Claramente não estávamos preparados para isso naquela ocasião.

Nenhum dos dois se convenceu muito.

Foi preciso amadurecer.

As condições de mercado mudaram com o rápido processo de consolidação no setor bancário.

O fato que deflagrou nossa mais recente rodada de negociações, em agosto do ano passado, foi a notícia da venda do Real ao Santander.

Aquela operação criou um grande competidor global muito forte no mercado local.

Moreira Salles – Ficou claro para nós, no ano passado, que o Santander poderia tornar-se maior que o Unibanco.

Por que é tão vital ser grande no setor financeiro?

Setubal – Por uma razão prática.

Muito prática.

Atualmente, as grandes transações entre bancos, sejam elas aquisições ou fusões, não são mais feitas em dinheiro.

São feitas com trocas de ações, pelos seus valores de mercado.

Portanto, o valor de mercado de uma companhia tornou-se o fator preponderante. É ele, em última análise, que dá a dimensão de sua capacidade de fazer aquisições.

Um grande banco, com uma grande capitalização de mercado, é capaz de comprar outros bancos.

Esse é um aspecto extremamente importante para entender a lógica dessa transação.

Nós nos juntamos exatamente para ampliar nossa capitalização de mercado.

E, é claro, para nos proteger de outros bancos com valores de mercado equivalentes.

Passamos a ser compradores.

Moreira Salles – Ser número 1 não é lá muito relevante.

O importante é termos escala.

Ela abre o acesso ao mercado internacional, acesso a recursos lá fora.

Setubal – Mas é um ponto a ser levado em consideração.

Ser reconhecidamente o líder e o banco mais forte faz com que você tenha, naturalmente, a preferência dos clientes e de quem faz negócios.

Durante períodos de turbulência, as linhas de crédito para o Brasil são cortadas.

Não seria mais lógico associar-se a um banco estrangeiro?

Moreira Salles – Essa crise mostrou que, quando a situação aperta, as linhas secam para todo mundo, não apenas para os bancos brasileiros.

Ter a participação de capital estrangeiro não altera o acesso a linhas internacionais de crédito.

O importante é que, ao nos associarmos ao Itaú, teremos mais poupança e mais volume de negócios.

O Brasil tem uma dimensão que permite o fortalecimento de um banco nacional em relação a seus concorrentes externos.

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