Na primeira vez que José Paulo visitou a casa onde Fernando Pessoa nasceu foi informado que o carrilhão da Basílica dos Mártires tocava ao meio-dia. “Cheguei lá dez minutos antes.
Queria estar onde ficava seu quarto, para comprovar que de lá se via o Tejo e ouvia aqueles sinos”.
Mas foi impedido de entrar no prédio, hoje de uma sociedade de advogados, a ABBC, pelo agente de segurança Fernando José da Costa Araújo, que tudo fez para impedir-lhe a entrada.
Ao seu lado como testemunhas apenas a mulher, Lectícia, e o amigo brasileiro, há 30 anos em Lisboa, o jornalista Duda Guennes. “Como que por uma conspiração do destino”, relata Cavalcanti, “ouvimos tocar o sino – primeira “pancada tua, vibrante no sol aberto”.
Precisava estar lá”. “Por favor chame a polícia para me prender que, sem sua autorização, estou subindo ao quarto andar”, bravejou.
Tomou o elevador e pode constatar o que o poeta já revela em versos: “Dava mesmo para ver o Tejo, de duas das janelas daquele que um dia foi seu apartamento.
E ouviam-se os sinos, claramente.
Ao sair, no ar frio daquele meio-dia de inverno, os sinos da aldeia de Pessoa tocaram novamente.
Agradeci, em uma reverência exagerada, como se tocassem para mim.
As pessoas na rua acharam graça”.
O livro começou quando José Paulo quis saber quantos foram os heterônimos, pseudônimos ou personagens, “formando o doloroso mosaico de seu verdadeiro rosto”, como gosta de resumir.
Foram muitos.
Em destaque, publicará também biografias de todos.
Ele conta que conheceu Fernando Pessoa em 1966, pela voz do ator João Villaret. “Foi o começo de uma paixão que até hoje me acompanha.
Tenho inclusive a sensação de que gostava dele ainda mais, naquele tempo.
Talvez porque todo começo de paixão seja assim mesmo, depois arrefece.
Ou talvez então, como o rio de sua aldeia, ele apenas pertencesse a menos gente”.
José Paulo Cavalcanti só nega revelar quem é o Esteves, do poema a Tabacaria, que ele descobriu após muita investigação. “Vai ter de esperar o livro”, diz, com sonora gargalhada.