O problema da saúde pública em Pernambuco chega ao limite.
Não se trata mais de limite tolerável ou intolerável.
Simplesmente chegamos ao fundo do poço e há de se tirar dessa situação uma saída, porque aos que precisam de hospitais sustentados com o dinheiro do contribuinte não há como pedir mais paciência.
Ela já se esgotou há muito tempo, desde quando serviço público de saúde passou a ser sinônimo de demora, incúria, falta de equipamentos e de medicamentos.
Desde quando começaram a se expandir os planos de saúde e a assistência privada, contrastando e aprofundando a diferença com o atendimento a quem não pode recorrer a esses planos.
Agora, com mais esta ameaça de uma sexta-feira fatal para a saúde dos mais pobres em Pernambuco, a parte maior e mais frágil da sociedade espera que governo e classe médica deixem de lado recriminações e atentem para a evidência de que é a vida de seres humanos que está sendo posta na mesa de negociação.
Os pernambucanos devem ouvir com muita atenção o protesto dos médicos por melhor remuneração, como vêm fazendo há muitos anos e, claro, têm que ser ouvidos pela importância de seu trabalho.
Mas também se deve prestar atenção à gravidade do ultimato que eles estão dando, ao anunciar que deixarão as emergências dos hospitais públicos nesta sexta-feira.
Essa ameaça não atinge a entidade governo do Estado, burocracia, administração pública.
Ela bate imediata e duramente nos que precisam do serviço público de saúde.
Daí se tira que há uma evidente precipitação da classe médica através de suas lideranças de classe.
A segurança dos pobres que recorrem aos hospitais do Estado não pode depender de percentuais de reajustes de gratificação de plantonistas ou diaristas.
Essa é uma condição limite que, de tão grave, deve fugir até da competência de governantes e profissionais e passar para a alçada da Justiça, com a intervenção do Ministério Público.
Um lado da questão que precisa ficar mais visível é a resposta que o governo do Estado dá ao problema.
Num ato de coragem, deve-se reconhecer, o governo anuncia um choque de gestão na saúde pública, com a determinação de tentar mudar uma estrutura que contabiliza muitos erros há muitos anos.
Não apenas neste ou no governo anterior, mas em muitos outros.
A crise da saúde é um somatório de problemas, agravado pelo adensamento da Região Metropolitana do Recife, pelo crescimento urbano e pelas soluções dos governantes não acompanharem as dificuldades.
O que propõe agora o Estado como resposta: a criação de uma fundação para gerir os grandes hospitais de Pernambuco, um modelo que já provou eficácia no Espírito Santo, em São Paulo e Minas Gerais.
E que vai contra o nosso modelo, cartorialista, eivado de feudos, com funcionários que fingem trabalhar, descontrole de gastos, compras descentralizadas e muitas outras mazelas que a nova proposta pretende combater.
O primeiro grande impacto é o clamor de que assim o governo de Pernambuco quer privatizar a saúde pública.
O vice-governador e secretário da Saúde foi à Comissão de Constituição e Justiça da Assembléia Legislativa para dizer que não é assim.
O governo quer criar uma fundação 100% pública, onde servidor só entrará através de concurso público, e sujeita à fiscalização do Tribunal de Contas do Estado.
Os servidores atuais continuam porque têm direito adquirido e somente os que entrarem com a fundação é que estarão sujeitos ao regime da CLT, significa dizer: mesmo só entrando com concurso público podem ser demitidos se não trabalharem como devem.
Do jeito que está é que não pode continuar, com um déficit de 180 mil consultas por mês na Região Metropolitana do Recife, apenas um dos males gravíssimos do diagnóstico da saúde pública no Estado.
Nós torcemos por Pernambuco e desejamos que a crise na saúde possa ser minorada com a idéia da fundação, sem perder de vista que os corredores dos hospitais estão cheios neste momento e para os doentes devem se voltar todas as atenções, independente de mesas de negociação, planos de mudança ou protestos.