Por Roberto Numeriano * As eleições de 2008 estão servindo para demarcar alguns campos político-ideológicos, à esquerda e direita.

Não incluo aqui um hipotético “centro” porque, no Brasil, na prática todos os que se dizem de “centro” têm uma visão de mundo genuinamente de direita.

O resultado dessa demarcação, abertas as urnas e analisados os desempenhos, será fundamental não apenas para delinear as alianças eleitorais para a disputa da cadeira presidencial, mas também para aquilatar qual o projeto de poder dos partidos e suas lideranças.

A partir do Recife, considerado aqui um microcosmo político, podemos projetar algumas perspectivas quanto à referida demarcação político-ideológica.

Em primeiro lugar, analisamos os partidos de esquerda.

O PSTU, o PSOL e o PCB têm o mesmo discurso e prática político-ideológica?

Não.

Numa classificação rápida, o PSTU alinha em sua ideologia uma concepção trotskista da política e de suas instituições (Parlamentos, Partidos etc); o PSOL, que não se filia à escola teórica de Marx e Lênin, assume-se como socialista e da liberdade; o PCB, por sua vez, é egresso da tradição revolucionária marxista-leninista.

O discurso radical do PSTU parece apostar numa ruptura revolucionária dos eixos de dominação da institucionalidade político-ideológica liberal.

Essa idéia é evocada pelo partido em todas as disputas eleitorais.

Disputa prefeituras e governos estaduais para criar uma nova ordem social e política – talvez a partir do alto, mas aí será necessário submeter o poder legislativo atual, o que exigiria, em nosso entender, uma massa de apoio engajada e disposta a instituir revolucionariamente uma nova ordem.

Já o PSOL, nascido das contradições do PT, traz em seu DNA ideológico algumas das formulações fundamentais do petismo de raiz: um certo ranço anticomunista; o discurso moralista e uma visão salvacionista dos humilhados e ofendidos pelo capital.

Mas parecem-nos deslocados, no tempo e no espaço, esses discursos.

Se o PT ainda se afirma partido do “socialismo democrático” (uma contradição em termos, pois o socialismo ou é democrático, ou não é socialismo), o PSOL se afirma partido do socialismo e da liberdade (outra contradição: ou o socialismo é libertário, ou não é socialismo).

Vê-se que o PSOL parece adorar o “pai” inconscientemente, embora o renegue em público.

O PCB retoma a sua luta política em um novo patamar: embora não descarte, não mais prioriza as chamadas “frentes de esquerda” (na prática, frentes eleitorais) e começa a formatar uma política que é, em termos teóricos e práticos, avançada em comparação à ultrapassada tese que atribuía a certos setores da burguesia nacional um papel progressista na revolução brasileira.

O PCB avançou em relação a essa tese (que a realidade negou) e em relação ao “esquerdismo” como doença infantil do comunismo.

Estas três diferentes naturezas político-ideológicas conformam práticas que podem eventualmente se justapor no embate eleitoral, mas não são complementares como projetos de poder, a longo prazo Em determinada curva na estrada dos embates eleitorais e político-ideológicos, vejo com preocupação a presença de dadas características como o messianismo do PSOL (encarnado em Heloísa Helena, como um Lula redivivo dos primórdios do PT), tentando enquadrar os “maus” e “impuros”.

O PSTU, por sua vez, adotando o discurso ultra-radical, necessitará, caso conquiste governos e cadeiras nas casas legislativas, quebrar a ordem instituída em um curto espaço de tempo (para ser coerente com o seu aqui e agora da revolução).

Não é possível fazer isso com a caneta na mão e uma idéia na cabeça.

O PCB está investindo no seu fortalecimento institucional. É um partido renascendo das cinzas, como a Fênix lendária.

Ao longo de 86 anos (quase todos, sofrendo a clandestinidade imposta), aprendeu com erros e acertos.

O discurso é o do socialismo revolucionário, mas sem os apelos do “assalto aos céus”, típicos da demagogia de esquerda.

Os próximos anos vão apontar qual desses três partidos está entendendo melhor a natureza da luta político-institucional e ideológica no cerne da revolução brasileira. * Roberto Numeriano é candidato a prefeito do Recife pelo PCB.