Para cumprir a Constituição Por Jayme Asfora Aprovado na Câmara dos Deputados em novembro do ano passado - depois de sete anos de espera - o Projeto de Lei Complementar 122/2006 ainda deverá ser bastante discutido antes de ser levado à votação no plenário do Senado Federal.
Isso porque o projeto proíbe a discriminação por orientação sexual ou identidade de gênero trazendo novidades positivas às leis e normas vigentes no País e que tratam, hoje, apenas de questões relativas a raça, cor, etnia, religião, sexo e nacionalidade.
Reconhecer os direitos do segmento LGBTT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transsexuais) e criminalizar a homofobia não deveria se tratar “apenas” de uma questão de direitos humanos, uma vez que vivemos em um Estado Democrático de Direito, onde o artigo 5º da sua Constituição (CF) diz que: “Todos são iguais perante à lei, sem distinção de qualquer natureza”.
Ou seja, não seria necessário definir nenhuma regra de coibição da homofobia, caso fosse cumprida a Constituição em sua essência fundamental.
Ou se assim fosse a norma constitucional facilmente interpretada nas mais variadas hipóteses e com todas as derivações possíveis, quer no âmbito penal, quer no âmbito civil.
No entanto, a punição, essa sim, precisa ser exemplar para mitigar ao máximo o risco da impunidade contra os crimes cometidos por motivos homofóbicos.
O País avançou, significativamente, quando tipificou a agressão às mulheres - a partir da edição da Lei Maria da Penha.
Antes os agressores, quando levados ao Judiciário, eram punidos, muitas vezes, com a concessão de cestas básicas.
Também está mais do que na hora de garantir que a prática de agressões - que chegam a ter conseqüências fatais - por discriminação de orientação sexual também recebam o mesmo tratamento.
Em Pernambuco, somente este ano, 12 homossexuais foram mortos, crimes muito provavelmente influenciados pelo preconceito.
No último dia 28 de junho, a população do Cabo de Santo Agostinho se deparou com outdoors espalhados pela cidade com dizeres homofóbicos e assinados pela auto-intitulada “Frente Nacionalista de Pernambuco” - Carecas do Brasil, um grupo que, em outras regiões já demonstraram claras orientações nazi-fascistas.
Em cumprimento ao seu papel de defensora do Estado Democrático de Direito, a OAB-PE - através do presidente da Comissão de Direito Humanos, Taciano Domingues - está tomando todas as providências junto ao Ministério Público de Pernambuco para que o caso seja apurado com o devido rigor.
No entanto, enquanto o projeto de Lei Complementar 122/2006 não segue em tramitação no Senado Federal, algumas medidas administrativas - e aparentemente simples - poderiam ser tomadas para que esses crimes passem a ser tratados como de caráter homofóbico. É o caso, por exemplo, da inclusão da orientação sexual das vítimas na notificação dos homicídios e agressões por parte da Secretaria da Defesa Social.
Dessa forma, a estatística - que nunca deve ser mais importante do que a agressão em si - poderia funcionar de forma mais concreta para garantir a aprovação de lei de criminalização do preconceito.
E também para evitar a subnotificação nestes casos, fenômeno facilitador da impunidade.
Também é necessária a aprovação, pelo Legislativo Estadual, do Projeto de Lei Ordinária 172/2007 - de autoria do deputado Isaltino Nascimento - que dispõe sobre “a proibição de qualquer forma de discriminação ao cidadão com base em sua orientação sexual”.
A lei prevê sanções aos estabelecimentos que atuem de forma discriminatória que vão de multa à suspensão do funcionamento.
Outras garantias devem ser discutidas e, futuramente, aprovadas e colocadas em prática pelos poderes Legislativo e Executivo brasileiros.
Serão passos importantes e fundamentais para que a sociedade brasileira passe a conviver democraticamente com o segmento LGBTT.
No entanto, é preciso lembrar que, somente há 20 anos (com o advento da CF de 1988), o racismo é considerado crime no Brasil.
Antes, não passava de uma contravenção.
No ano em que o mundo comemora os 60 anos da DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS - aprovada na Assembléia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) em 10 de dezembro de 1948 -, a aprovação destas leis e a adoção de providências administrativas neste caminho, poderiam significar o início de uma importante comemoração.
PS: Jayme Asfora é presidente da OAB-PE e escreve para o blog às quintas.